Não é de hoje que o recenseamento da população brasileira enfrenta desafios que vão da falta de dinheiro às fake news. O primeiro censo oficial levou anos para ser feito porque o governo do Império demorou a obter autorização para a despesa. Já com dinheiro liberado, o levantamento aconteceu com 20 anos de atraso porque, em 1852, quando deveria ter sido realizado, a população se revoltou: acreditava-se que o decreto que ordenava o censo era medida governamental para escravizar os “homens de cor” então libertos.
Em pleno século XXI, os obstáculos ganham corpo na mesma proporção em que a tarefa se agiganta. Com dois anos de atraso por causa da pandemia de Covid e de cortes orçamentários e com necessidade de interferência do Supremo Tribunal Federal, o exército de 183 mil recenseadores recrutados pelo IBGE começa nesta semana a coleta de dados em 89 milhões de endereços, incluindo aldeias indígenas e comunidades quilombolas.
Com essas informações – idade, sexo, cor, religião, escolaridade, renda, deslocamento para a escola e para o trabalho e presença ou não de saneamento básico nas residências, por exemplo –, todas as políticas públicas para os próximos anos ou décadas serão traçadas. Muito mais que uma contagem da população, o censo é base para investimentos públicos e privados, campanhas de vacinação e transferência de recursos da União para Estados e municípios.
As cidades menores, mais dependentes do Fundo de Participação dos Municípios, são as mais prejudicadas por distorções decorrentes da não realização do censo e poderiam deflagrar uma enxurrada de ações judiciais. A falta do levantamento também é desastrosa para a Previdência Social, que calcula o benefício com base na expectativa de vida da população. Sem essas informações, não há como qualquer nação planejar seu futuro.