Reportando-me à coluna "Médiuns, os carismáticos lotam casas espíritas", em O TEMPO de 2.3.2009, escrevo esta, reiterando a fantástica obra do Pastorino "Sabedoria do Evangelho" (oito volumes) e a minha simples "A Face Oculta das Religiões", pois o assunto é complexo. Mas há outras obras que o abordam também.

Primeiramente, observemos estas particularidades da língua grega: "ho" (ou "tò) corresponde ao artigo definido "o"; "pneuma" significa espírito ou alma; e "hagion" é o adjetivo santo. E um detalhe: não há o artigo indefinido em grego, mas como ele existe em português, ele deve constar das traduções, o que não acontece. E esse erro proposital de tradução leva os leitores a identificarem qualquer espírito ("pneuma") na Bíblia com o Espírito Santo da Santíssima Trindade.

Os exemplos falam por si mesmos: 1) "Tò Pneuma tò Hagion" = o Espírito Santo (Mateus 12,32; Marcos 13,11; Lucas 3,22). 2) "Pneuma hagion" (sem o artigo definido, logo temos em português o indefinido "um") = um espírito santo (Mateus 3,11; Marcos 1,8; Lucas 16,24; João 20,22). 3) "Tò Hagion Pneuma" = o santo Espírito (Mateus 28,19; Lucas 12,10; 1 Coríntios 6,19). 4) "To pneuma", sem o adjetivo santo = o espírito (Mateus 4,1; Marcos 1,10 e 12 ; Lucas 4,l4; Atos 6,10; e João 15,26). 5) "Pneuma", sem o adjetivo santo e sem o artigo definido o = um espírito (Mateus 3,16; Lucas 1,17; Atos 6,3; João 6,63).

O Espírito Santo, do jeito que é, só foi instituído pela Igreja, oficialmente, no Concílio de Constantinopla (381). Paulo não O conheceu. E sua doutrina virou dogma justamente porque já era polêmica desde sua instituição. Ele, com os artigos definidos "ho" ou "tó" nos originais gregos bíblicos, pode significar Deus transcendente: o Santo Espírito, o santo dos santos, mas pode também ser uma referência à centelha divina ou Cristo interno, imanente, que habita em cada um de nós, a qual é classificada por Pietro Ubaldi, em "Grande Síntese", como sendo o espírito hominal evoluído, já individualizado. E quando se trata do próprio Deus transcendente, santo Tomás de Aquino discorda de santo Agostinho, dizendo que o Espírito Santo deveria vir em primeiro lugar e não no terceiro, na ordem da Santíssima Trindade. Mas o Espírito Santo bíblico que mais aparece é geralmente o que se refere a um espírito humano desencarnado, não tendo, pois, o artigo definido no original grego nem o adjetivo "santo", sendo, pois, a tradução correta para o português "um espírito", como vimos acima.

Mas Ele pode aparecer também com o artigo definido no original grego, referindo-se a determinado Espírito Santo de alguém. Exemplos: o Espírito Santo de Daniel, o de Nossa Senhora, o de Maria Madalena, o de você que me lê. De fato, já o dissemos, cada um de nós tem um. Não importa o seu grau de evolução, ele é santo potencial por sua própria natureza. Nosso corpo é santuário dum Espírito Santo (1 Coríntios 6,19). Por isso se diz que Ele é também o conjunto de todos os espíritos humanos.

Quando Jesus fala que os pecados contra o Espírito Santo não têm perdão (Mateus 12,32 e Lucas 12,10) nem na vida atual nem na futura, Ele quer dizer que eles têm que ser pagos, pois que são graves. E aqui o Espírito Santo se refere tanto ao próprio Deus transcendente, como também ao imanente em nós, em nossa consciência. Por exemplo: o aborto e o acusar de diabólica uma doutrina santa, só porque ela não é da nossa religião!

PS
Agradeço os comentários de Luiz Antônio Moura, Rio (RJ).