É preocupante a postura de alguns operadores do direito de ignorar a liberdade dos condôminos para estipular na convenção os quóruns que são utilizados para aprovar as deliberações nas assembleias, gerando transtornos para a administração dos condomínios, especialmente nos empreendimentos compostos de centenas de unidades e diversos blocos.

Há Oficial Registrador de Imóveis demonstrando falta de reflexão ao exigir que os condôminos, que sabem o que é viável para seu condomínio, estabeleçam quóruns impraticáveis, constantes no Código Civil (CC) apenas como uma referência. Os quóruns do CC nos artigos 1.349, 1.341, entre outros, devem ser respeitados obrigatoriamente nas convenções que nada dizem sobre os quóruns.

Ocorre que existem empreendimentos imobiliários com 600, mil ou mais unidades, sendo que é de domínio público que as assembleias têm a participação em torno de 15%, ou seja, num condomínio com 450 unidades, na maioria das vezes, não comparecem 68 pessoas. O legislador, por ter visão ampla, e por ser irracional exigir quóruns impraticáveis, autorizou os condomínios a estipular quóruns diferentes dos previstos no CC.

Caso contrário, impediria a aprovação de obras úteis e voluptuárias ou a destituição do síndico, para a qual alguns entendem, equivocadamente, ser necessário quórum qualificado, ou seja, da totalidade dos condôminos.

Bom senso e sabedoria na definição dos quóruns


Basta refletir sobre o caso concreto para compreender a razão de o legislador estabelecer no art. 1.322, o qual trata da instituição do condomínio, que a convenção poderá, nos termos do art. 1.344, definir livremente a sua forma de administração e os quóruns, conforme a conveniência dos coproprietários.

Seria absurdo exigir, para a compra de um espelho, ar-condicionado ou um jardim, a aprovação de 300 votos (2/3 de 450), por ser obra voluptuária, ou seja, de embelezamento. E seria espantoso impor ao condomínio a permanência de um síndico ruim sob a alegação de que só pode ser destituído pela votação de 226 pessoas, apesar de ter sido eleito por maioria simples dos presentes, que, no exemplo, seriam 35 votos.

É inaceitável interpretar a lei para prejudicar os condomínios. Ninguém pode obstar a autonomia do condomínio em definir quóruns na convenção, basta ler o art. 1.334: “I – a quota proporcional e o modo de pagamento das contribuições dos condôminos para atender às despesas ordinárias e extraordinárias do condomínio; (...); III – a competência das assembleias, forma de sua convocação e quórum exigido para as deliberações”.

Os condomínios não estão engessados e podem definir quóruns conforme suas características, bem como o rateio de despesas e demais questões para evitar situações injustas, viabilizar obras etc. Pensar diferente geraria nulidade das taxas extras e o caos em inúmeros condomínios, resultando em processos judiciais contra a maioria dos condôminos, que deseja melhorar e valorizar o edifício. Os ausentes não podem ter mais valor e força do que os presentes.

Kênio Pereira
Advogado e diretor regional da Associação Brasileira de Advogados do Mercado Imobiliário