LEONARDO BOFF

A era geológica do Antropoceno e a ameaça que representa à biosfera

Redação O Tempo


Publicado em 29 de setembro de 2017 | 03:00
 
 
 
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O primeiro a elaborar uma ecologia da Terra como um todo foi o geoquímico russo Vladimir Ivanovich Vernadsky. Ele conferiu caráter científico à expressão “biosfera”, criada em 1875 pelo geólogo austríaco Eduard Suess. Nos anos 70, com James Lovelock, desenvolveu-se a Teoria de Gaia, a Terra que se comporta como um superorganismo vivo que produz e reproduz vida. Gaia, nome grego para a Terra viva, não é tema da New Age, mas o resultado de minuciosa observação científica.

A compreensão da Terra como Gaia oferece a base para políticas globais, como o controle do aquecimento da Terra. Se a temperatura aumentar mais 2°C, milhares de espécies não conseguirão se adaptar e vão desaparecer.

Vários cientistas se deram conta, já no ano 2000, das mudanças profundas ocorridas na base físico-química da Terra e cunharam a expressão “Antropoceno”. A partir de 2011, o termo já ocupava páginas nos jornais.

Com o Antropoceno se quer sinalizar o fato de que a grande ameaça à biosfera é a agressão sistemática dos seres humanos sobre todos os ecossistemas. O Antropoceno é uma espécie de bomba-relógio sendo montada, que, se explodir, pode pôr em risco todo o sistema vida, a vida humana e nossa civilização. Coloca-se a pergunta: o que fazemos, coletivamente, para desarmá-la?

Aqui é importante identificar o que fizemos para que se constituísse essa nova era geológica. Alguns a atribuem à introdução da agricultura, há 10 mil anos, quando começamos a interferir no solo e no ar. Outros acham que ela começou no século XVIII, quando iniciou-se o processo industrialista que implicou uma sistemática intervenção nos ritmos da natureza, com a ejeção de poluentes no solo, nas águas e no ar. Outros colocam a data em 1945, com a explosão de duas bombas atômicas sobre o Japão e os posteriores experimentos atômicos que espalharam radioatividade pela atmosfera. Nos últimos anos, as novas tecnologias tomaram conta da Terra, exaurindo seus bens e serviços naturais e causando o lançamento de toneladas de gases de efeito estufa na atmosfera e bilhões de litros de fertilizantes químicos no solo.

O imperativo categórico é que urge mudar nossa relação com a Terra. Não dá mais para considerá-la um balcão de recursos de que podemos dispor a nosso bel-prazer. A Terra é pequena, e seus bens e serviços, limitados. Cumpre produzir tudo o que precisamos, não para um consumo desmedido, mas com uma sobriedade compartida, respeitando os limites da Terra e pensando nas demandas dos que virão depois de nós.

Para preservar a vida, a tecnociência é importante, mas igualmente o é a razão cordial e sensível. Nela encontra-se a sede da ética, da compaixão, da espiritualidade e do cuidado com a vida. Essa ética do cuidado, imbuída de uma espiritualidade, nos comprometerá com a vida, contra o Antropoceno. Portanto, faz-se mister construir uma nova ótica que nos abra para uma nova ética, colocando sobre nossos olhos uma nova lente para fazer nascer uma nova mente.

Há 65 milhões de anos, um meteoro de 9,6 km de extensão caiu na península de Yucatán, no México. Seu impacto foi o equivalente a 2 milhões de vezes a força da uma bomba nuclear. Três quartos das espécies vivas desapareceram e, junto com elas, todos os dinossauros, depois de terem vivido por 133 milhões de anos sobre a face da Terra. Nosso ancestral mamífero sobreviveu.

Oxalá, desta vez, o meteoro rasante não sejamos nós, sem responsabilidade coletiva e sem o cuidado essencial que protege e salva a vida.

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