LOHANNA LIMA

Por mais movimentos entre mulheres

Alguém tentaria beijar uma gerente de banco, uma caixa de supermercado ou uma enfermeira em pleno trabalho?


Publicado em 21 de fevereiro de 2019 | 03:00
 
 
 
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A última semana foi difícil para nós, mulheres. Acompanhar o caso da paisagista Elaine Perez Caparroz, que foi brutalmente espancada por um homem em seu primeiro encontro, mexeu com muitas de nós. É difícil não pensar que isso poderia ter ocorrido com qualquer uma e em qualquer circunstância, não só a de um encontro de casal. Falando nisso, muitas pessoas tentaram ponderar e colocar um pouco de culpa em Elaine, que se encontrou com alguém que não conhecia pessoalmente. Agora, eu pergunto a vocês: qual a garantia de que isso não ocorreria, no décimo, no 20º ou no 30º encontro? Não podemos tapar o sol com a peneira, meus amigos: mulheres correm risco o tempo inteiro. E isso acontece por uma questão social muito grave.

Mas, afinal, o que o caso de Elaine tem a ver com a coluna de esportes? Pois bem, eu explico. Há bastante tempo eu venho tentando, por meio do jornalismo, junto com diversas colegas e torcedoras incríveis, mostrar que o futebol é lugar de mulher, sim. Mas ainda existe receio por parte de muitas na hora de ir ao estádio sozinhas. Sim, meus amigos, o medo ainda existe. O assédio ainda existe, situações constrangedoras – na profissão e na arquibancada – ainda são rotineiras. Algumas vezes, as próprias mulheres questionam as reclamações das demais. Acreditem, meninas: não é porque nunca aconteceu com você, que não tenha acontecido com outras.

As coisas já melhoraram bastante para nós, como profissionais e como torcedoras, mas ainda falta muito, muito mesmo, para que possamos caminhar com tranquilidade na hora de exercer nosso trabalho e na hora de demonstrar nossa paixão na arquibancada. Prova disso foi o episódio mais que desagradável e desrespeitoso que aconteceu com a repórter Karine Alves, do Fox Sports, na última semana, quando um torcedor tentou beijá-la. Muitos pensam que não foi nada de mais, então eu pergunto: alguém tentaria beijar uma gerente de banco, uma caixa de supermercado ou uma enfermeira em pleno trabalho? Por que com jornalista pode? Lutar contra isso é um trabalho de formiguinha, mas o mais importante é que ele vem sendo realizado.

Recebi com muita alegria o contato de uma torcedora do Cruzeiro na semana passada a fim de divulgar o movimento “Torça Como Uma Mulher”. A estudante Loredane Carolaine,18, faz parte do grupo Unidas pelo Cec, que, por meio da paixão pelo clube, promove a união de torcedoras para irem juntas ao estádio e até em viagens. As meninas incentivam mulheres de todas as idades a ir ao campo. Por meio de um grupo no WhatsApp, elas se comunicam e combinam de se encontrar. Outros 16 clubes Brasil afora contam com torcidas femininas que fazem parte desse movimento, caso de Corinthians, Santos, Athletico, entre outros. No Atlético, há alguns anos as meninas da Grupa se reúnem com o mesmo objetivo.

Movimentos como esse são mais do que importantes, são um serviço prestado à mulher. Muitas não se sentem seguras estando nos arredores de um estádio longe de uma presença masculina – seja de pai, irmão, namorado. Eu passei por isso quando era mais nova. Demorou muito para que eu fosse ao campo sozinha. O recado desta coluna é simples: não devemos ter medo, não devemos ser culpadas quando algo dá errado – seja um encontro, como no caso de Elaine, uma ida a um jogo de futebol, ou qualquer ambiente em que a presença masculina seja muito maior. Não podemos ser penalizadas por fazermos ou por irmos aonde gostamos. E estarmos juntas, em um mesmo movimento, faz toda a diferença.

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