O capitalismo produziu inédito e notável incremento das forças produtivas. Inicialmente, a partir da coordenação dos diversos Estados nacionais, nos séculos XIX e XX. A produtividade foi crescente e refletia a capacidade de inovação ilimitada. Nos primeiros dois séculos de consolidação da economia de mercado, os interesses nacionais criaram barreiras à expansão econômica. As potências hegemônicas sempre propugnaram a liberdade máxima para encontrar consumidores para sua produção em explosivo crescimento. Liberdade de circulação de mercadorias e capitais e, às vezes, da força de trabalho.
Os países de desenvolvimento retardatário e tardio se defendiam por meio de estratégias protecionistas e indução estatal de seu desenvolvimento nacional. O Brasil é um exemplo clássico de capitalismo tardio construído por um processo de industrialização por substituição de importações, com forte participação estatal e fechamento da economia. A disputa entre interesses nacionais motivou as duas grandes guerras mundiais e, posteriormente, a Guerra Fria.
A base ideológica do desenvolvimento capitalista foi o pensamento liberal de Adam Smith, Ricardo, Von Misses, Hayek, Milton Friedman. Diferindo da prudência excessiva dos conservadores e com diferenças periféricas e contextos históricos diversos, os teóricos do liberalismo acreditavam que, para dar plena vazão ao potencial da economia capitalista, era preciso liberdade radical. Estado mínimo, vantagens comparativas, ganhos recíprocos, remoção de todas as barreiras à livre circulação de capitais e mercadorias. Os preços e, entre eles, o câmbio cuidariam de estabelecer o equilíbrio microeconômico, nacional e geral pelo livre jogo de oferta e procura. O seu espelho político seria a democracia liberal.
A história do capitalismo produziu desenvolvimento e prosperidade, mas também desigualdades enormes e crises cíclicas. Em contraponto surgiram o socialismo, a social-democracia e o pensamento keynesiano. Mas, com a dissolução da URSS e do bloco de países socialistas e a crise fiscal das social-democracias, no final do século XX, parecia inevitável o reino das ideias liberais em escala global.
A criação da União Europeia e do euro, a adesão da China à economia de mercado, a transnacionalização das grandes corporações empresariais, o desenvolvimento de mecanismos de governança global compartilhada, a queda do protecionismo apontavam nessa direção.
A ascensão de Trump nos EUA – ainda a maior economia do planeta – representa o fim dessa utopia liberal. Nem liberdade econômica, nem democracia liberal institucionalizada. Nada de livre circulação de capitais, mercadorias e, muito menos, mão de obra. As regras do jogo devem ser ditadas não pelo livre mercado, mas pela vontade do mandatário da potência ainda hegemônica, a partir de sua caneta e ordens executivas, anunciadas direto do Salão Oval da Casa Branca. Não há freios e contrapesos graças à maioria passiva nas duas Casas do Congresso americano e na Suprema Corte.
Os resultados da operação trumpista, em médio e longo prazos, são incertos. Mas o Brasil precisa desenvolver um pensamento estratégico – hoje inexistente – sobre sua inserção neste novo mundo. Improvisação e amadorismo não nos darão a régua e o compasso necessários para enfrentarmos os enormes desafios que temos pela frente.