O debate sobre fake news e o controle da internet tem crescido nos últimos anos, e vários países se organizam para tentar conter seus efeitos. Essa mobilização generalizada contribui para a produção de um debate internacional sobre o tema por dois motivos: primeiro pelo potencial das fake news de influenciarem o resultado das eleições e na dinâmica da política doméstica dos países. O segundo motivo é que a internet permite o alcance mundial das fake news, se tornando instrumentos para que interesses estrangeiros intervenham nos processos eleitorais, como foi o caso da suposta influência russa nas eleições norte-americanas tanto em 2016 quanto em 2020.

Vale lembrar que a criação de notícias falsas e campanhas difamatórias não são uma invenção recente. Porém, o potencial de disseminação global, extremamente ágil, e a aparência de “informação confiável” tornam as fake news um fenômeno relativamente novo que desafia os legisladores que tentam estabelecer mecanismos eficientes de controle e monitoramento.

O grande problema é conseguir regular a internet sem produzir um paradoxo da censura. A regulação coloca um risco não só de descaracterizar o que a internet tem de melhor: ser uma rede livre de conexões globais. O outro risco é legislar sem prejudicar também a dinâmica da democracia, que depende da liberdade de expressão e é prejudicada por sistemas de vigilância extremamente rígidos.

É possível detectar esse “dilema” em documentos internacionais, como o “Roadmap: Fakenews and online disinformation”, criado pela União Europeia em novembro de 2017. Apesar de o marco regulatório entender que o acesso universal à informação é fundamental para democracia, também estabelece regras para monitorar e retirar do ar sites que contenham notícias falsas.

Na mesma direção, a legislação alemã e a americana determinam que os provedores retirem do ar em 24 horas “os conteúdos considerados ilegais”. No primeiro momento, projetos desse tipo, geralmente, surgem prometendo moralizar e coibir ações criminosas, discriminatórias ou, até mesmo, consideradas extremistas. Entretanto, quais são os riscos desse tipo de medida?

Na Bielorrússia, uma simples postagem nas redes sociais pode ser motivo de prisão. No mês de outubro, o líder do governo, Alexander Lukashenko, publicou novas regras que estabelecem critérios para reconhecer conteúdos “extremistas” e delimitam penalidades específicas para os civis identificados como “culpados”. Lukashenko, por sua vez, está há 27 anos no poder, e em 2020 diversas foram as denúncias de irregularidades nas eleições.

Apesar de afirmar “total transparência” na condução do processo eleitoral da sua quinta eleição e negar ser um ditador, Lukashenko forçou ao exílio sua principal adversária, Svetlana Tikhanovskaya. Esse episódio desencadeou diversas manifestações populares a favor da democracia no país, mas que, infelizmente, foram reprimidas violentamente pelo governo.

Cerca de 136 pessoas estão detidas sob a acusação de “insultar um representante das autoridades" ou “incitação ao ódio social”. A onda de perseguição e censura tende a crescer e se tornar um dos principais instrumentos da ditadura de Alexander Lukashenko para conter o que ele chama de “golpe”. na Bielorrússia, as pessoas serão monitoradas e responsabilizadas pelo que assistirem e assinarem na internet e mensagens criptografadas do Telegram podem contar como provas para incriminar civis. É importante ressaltar que os conteúdos que o regime de Lukashenko chama de “extremista” são opiniões, notícias e relatórios sobre o autoritarismo do seu regime.

Dessa forma, por melhor que sejam as intenções dos projetos que tentam regular o ambiente online, a mídia ou a limitar a liberdade de expressão, os riscos do uso autoritário dos instrumentos de vigilância são imensos. Democracias existem exatamente para atenuar os problemas causados pelo uso autoritário dos instrumentos de vigilância, mas para que isso seja possível, precisamos partir do princípio que a liberdade é um bem inestimável, porém, extremamente frágil.