Acompanho com entusiasmo, há muito tempo, o debate sobre a digitalização das relações financeiras. Foi o que me motivou há dez anos a apresentar a primeira proposta legislativa sobre o fim do dinheiro em espécie no país, o Projeto de Lei 48/2015, que propõe “extinguir a produção, circulação e uso do dinheiro em espécie e determina que as transações financeiras se realizem apenas através do sistema digital”.

Foi depois disso que o Brasil criou o Pix, a mais exitosa tecnologia financeira usada em um país. Ele eliminou as tarifas e promoveu maior inclusão. Acompanhei o processo de sua criação, por meio de um Requerimento de Informação (RIC), que foi respondido em 2018 pelo Banco Central, informando que havia criado um grupo de trabalho que estudava os parâmetros da nossa moeda digital.

O Pix caiu tanto no gosto popular que incomodou até o governo dos Estados Unidos. Nas investidas recentes contra o Brasil, eles reclamaram sobre supostos prejuízos que o Pix causa a suas empresas, como Visa e Mastercard. Foi um dos motivos alegados pelo presidente Donald Trump para impor severas sanções tarifárias. Mas eles estão assustados também com a nossa participação numa articulação internacional para desenvolver sistemas de pagamento independentes, que possam substituir as redes tradicionais dominadas por Washington, como a Swift, que interliga bancos correspondentes de todo o mundo.

Antes consideradas infraestruturas invisíveis, as redes financeiras atuais tornaram-se instrumentos de poder e disputa geopolítica, sobretudo pelo controle de transações internacionais e pelas sanções econômicas que podem ser impostas por meio delas. A dependência do dólar como moeda de reserva mundial reforça essa posição de hegemonia, limitando a soberania dos países.

Para enfrentar esse cenário, o Brics avança com projetos que visam criar uma nova arquitetura de pagamentos internacionais. Além do Pix do Brasil, países como China, Rússia e Índia também desenvolveram infraestruturas semelhantes – UnionPay, Mir e RuPay –, garantindo maior autonomia nos seus sistemas internos.

Agora vem o projeto Brics Pay. Um modelo inspirado no Pix, como se fosse seu similar global, que prevê uma plataforma digital de pagamentos internacional, baseada em blockchain, por ser capaz de realizar transações em moedas locais, sem passar pelo dólar ou redes centralizadas. Além disso, o plano do Brics inclui o desenvolvimento de CBDCs (Central Bank Digital Currency), que são moedas digitais soberanas geridas pelos bancos centrais. Elas permitirão transações transfronteiriças rápidas, seguras e a custos reduzidos.

O Brasil tem papel de destaque nessa estratégia com o Drex, uma CBDC de atacado que busca transformar a liquidação de operações financeiras e facilitar o comércio internacional por moeda digital própria. O Drex permitirá que bancos e empresas façam transações em suas moedas locais, em tempo real, eliminando intermediários. Com integração a CBDCs de outros países, cria-se uma rede de pagamentos internacional mais autônoma, atraente e segura e menos vulnerável às sanções. Isso fortaleceria a soberania brasileira e o protagonismo do nosso país no cenário global, além de reduzir custos e ampliar negócios internacionais.

Os benefícios desse sistema incluem menor custo de transação, maior rapidez, maior segurança e maior autonomia para exportadores, importadores e governos. Países que atualmente enfrentam sanções podem negociar mais livremente, diversificando suas rotas comerciais e fortalecendo a soberania econômica. Além de diminuir a vulnerabilidade ao controle externo, a iniciativa potencializa a integração financeira entre as nações do Brics e outros parceiros, promovendo uma nova lógica nos intercâmbios comerciais internacionais.