Arrogante, genial, autoritário, moderno, obsessivo, intelectual, vaidoso, temperamental, debochado, inteligente, “a pessoa que mais conhece Belo Horizonte”. Esses foram os adjetivos ouvidos pela reportagem de O TEMPO sobre Gabriel Azevedo (MDB) durante a produção da reportagem sobre os dois anos em que o vereador esteve na presidência do Legislativo municipal. E é com essas visões, entre rompantes, renovações, rixas entre grupos políticos e vitória em dois processos de cassação, que ele deixa a Câmara, após oito anos de mandato, em clima de “ame-o ou odeie-o”.

A reportagem ouviu vereadores, servidores e diversas outras figuras políticas para avaliar a atuação do presidente do Legislativo. A maioria topou falar, desde que a identidade fosse preservada. Para alguns, ficará a saudade do jeito moderno e pragmático de dirigir a Casa; para outros, o alívio de não precisar lidar com uma personalidade considerada difícil. 

“A saída do Gabriel é uma libertação. Os últimos meses foram de contagem regressiva. Alguém que se diz democrata, mas que foi um ditador, impondo suas vontades e usando o seu trono para emitir opiniões pessoais”, acusou um vereador.

Já outro colega teceu elogios. “O Gabriel teve uma gestão muito moderna, avançou em diversos aspectos, investiu no espaço físico, teve um avanço com os projetos de lei e com o colégio de líderes, foi refinado, avançou na relação com os servidores. A gestão foi mais organizada e transparente”, avaliou.

“Defensor intransigente da democracia” é como o próprio Gabriel se define. Sua atuação na política começou na juventude, quando participou da “Turma do Chapéu” em 2011, um grupo de militantes políticos digitais do PSDB, e chegou a ser subsecretário de Juventude do ex-governador Antonio Anastasia (PSD). Em 2016, disputou sua primeira eleição para vereador pelo PHS e dividiu seu tempo eleitoral para ser coordenador de campanha do ex-prefeito Alexandre Kalil, na época filiado ao mesmo partido. 

Gabriel e Kalil: do amor ao ódio

Ligados pela personalidade forte e autenticidade, a amizade entre os políticos virou hostilidade rapidamente. Com dois meses como vereador, Gabriel protagonizou um bate-boca acalorado com o líder de governo de Kalil, ex-vereador Gilson Reis (PCdoB), a quem acusou de homofobia e presenteou com uma coleira, segundo ele, dando a entender que Reis era um mascote do prefeito. 

O relacionamento já conturbado foi por água abaixo em 2018, quando Gabriel gravou conversas com o secretariado de Kalil e as divulgou, acusando o prefeito, que é ex-presidente do Atlético, de uso político do time. Gabriel se destacou com uma das oposições mais ferrenhas ao executivo, e conseguiu emplacar as CPIs da BHTrans e a do Abuso do Poder. A vitória veio com um preço e o parlamentar passou a ser conhecido nos bastidores da política como alguém que grava praticamente todas as suas interações. 

Acensão à presidência 

Em janeiro de 2023, já no seu segundo mandato na Câmara, Gabriel foi eleito presidente, após acordo com a “Família Aro”, grupo ligado ao secretário de Estado da Casa Civil, Marcelo Aro (PP). O combinado era que ele deixaria a presidência em 2024, para que o vice-presidente eleito, Juliano Lopes (Podemos), assumisse. Mas, no meio de 2023, a aliança se rompeu. 

Tudo começou quando a Família Aro fez um acordo de governança com o prefeito Fuad Noman (PSD), emplacando quatro secretários na prefeitura e auxiliando a base nas votações dentro da Casa, o que acabou indo contra alguns interesses de Gabriel. A antiga aliança virou um campo de guerra e Gabriel cortou relações com o grupo de parlamentares e com Fuad, ficando quase oito meses sem se encontrar com o chefe do executivo.

Os vereadores chegaram a registrar um boletim de ocorrência na Polícia Civil contra um assessor de Gabriel e abriu dois processos de cassação contra o presidente da Casa, alegando quebra de decoro parlamentar. 

Reviravoltas, campanha e um aceno de paz

Ao final do segundo processo de cassação, Gabriel reconheceu publicamente que precisava mudar alguns comportamentos e avaliou que o estopim curto contribuiu para a crise na Câmara. Contou que começou a investir em terapia. Na campanha para prefeito, ao conciliar a disputa com a atuação no Legislativo, elevou o tom das críticas ao prefeito Fuad, mas, depois do pleito, ficou mais manso e fechou o ano de uma forma tranquila. 

Alguns aliados avaliaram a mudança como amadurecimento. Opositores, entretanto, pontuaram que o novo comportamento poderia ser uma certa preparação para 2028, já que o vereador se coloca como pré-candidato a prefeito de Belo Horizonte.

Espírito renovador é reconhecido

O espírito de renovação de Gabriel Azevedo foi apontado pela maioria dos ouvidos pela reportagem. Entre os feitos do vereador, muitos destacaram a abertura de uma galeria de artes, a reforma de uma praça em frente à Casa e o ritmo acelerado para reduzir quase que completamente o número de projetos tramitando. Na avaliação dos servidores, a sensação é de que Gabriel deixou sua marca ao organizar o funcionamento de algumas pastas, abrir o plenário para a imprensa e promover um novo concurso público.

A modernidade de Gabriel não foi exclusiva aos seus atos como presidente, mas também atribuída à sua forma de se comunicar. Mais impessoal, ele defendeu a suspensão da obrigatoriedade do uso de terno dentro do plenário e era comum ver o presidente tendo conversas coloquiais com colegas. Bissexual assumido, o parlamentar não teve receio de comentar sobre suas preferências sexuais. Já no fim do seu mandato, publicou uma coluna em O TEMPO avaliando os impactos da sua sexualidade no seu trabalho político. 

Ao ser questionado sobre quais marcas Gabriel deixará na Câmara, um de seus colegas admitiu: “ele é do tipo: ou ama ou odeia. Vai deixar saudade o seu jeito organizado e sua paixão pela cidade, mas alguns vão sentir alívio de não precisar mais lidar com uma pessoa que montava o jogo conforme sua vontade. Isso foi visto como autoritarismo por muitos, e como um dom para a política por outros”, comentou.