O governo Romeu Zema (Novo) terá que contornar as dificuldades enfrentadas em 2024 para levar o mínimo de deputados estaduais ao plenário da Assembleia Legislativa de Minas Gerais (ALMG) caso queira entregar as privatizações de Cemig e Copasa até o 2º semestre de 2025. Apesar de insistir que a base tem 56 dos 76 parlamentares da ALMG, o governo chegou a derrubar o quórum, em diferentes oportunidades no ano passado, quando não tinha a maioria entre os presentes para evitar derrotas.

As dificuldades com a base incomodaram o governo Zema até na maior vitória no ano passado, o aumento em cerca de 80% do piso e do teto de contribuição do Instituto dos Servidores do Estado de Minas Gerais (Ipsemg). Embora a proposta tenha sido aprovada por uma diferença de 12 votos, com 36 favoráveis e 24 contrários, o sumiço de dez deputados da base, sendo três vice-líderes, que haviam declarado presença em plenário, irritou lideranças do Palácio Tiradentes.

A ausência incomodou o governo Zema em razão da queda da diferença de votos entre o 1º e o 2º turno, que caiu de 23 para 12. Caso os 24 parlamentares presentes e contrários ao reajuste tivessem deixado o plenário para obstruir a análise, a sessão teria sido derrubada e a proposta, que já estava há oito meses na ALMG, adiada. Os 35 deputados que sobrariam naquela reunião seriam insuficientes para mantê-la de pé, já que são necessários 39.

O clímax do desgaste entre o governo e a base foi a retaliação à vice-líder Chiara Biondini (PP), que votou a favor de uma emenda que autorizava o Palácio Tiradentes a dar um aumento salarial de 10,67% aos servidores públicos. O governo, que já havia cedido em um ponto percentual na proposta inicial, brigava por 4,62%. Em resposta à infidelidade, Zema exonerou o irmão de Chiara da assessoria da presidência da Codemig e outros três indicados por ela para a Secretaria de Justiça e Segurança Pública.

Além de Chiara, o governo Zema pressionou outros deputados da base para votar contra as demais emendas que autorizavam um aumento superior à recomposição inflacionária de 4,62% proposta pelo Palácio Tiradentes. Elas foram derrubadas com uma diferença de oito votos, sendo 36 contrários e 28 favoráveis. As articulações do governo para evitar um reajuste superior ao que poderia arcar impactaram diretamente na capacidade de mobilizar parlamentares para as votações restantes.

Em entrevista a O TEMPO em dezembro, o secretário de Governo, Gustavo Valadares, reconheceu que a base nunca deu os 56 votos, mas apontou que, em função da mudança da relação entre o Executivo e o Legislativo provocada pelas emendas impositivas, a negociação é projeto a projeto. “Antigamente, tinha deputado era da base e deputado que era da oposição, e ponto final. Eu mandava projeto para a ALMG e sabia que, se a base tinha 50 deputados, 50 votos eu teria. Hoje, não é mais assim”, pontuou ele.

O presidente da ALMG, Tadeu Leite (MDB), o Tadeuzinho, chegou a intervir para garantir o mínimo de deputados em plenário para votar propostas caras ao governo Zema, como, por exemplo, a adesão ao Regime de Recuperação Fiscal, que foi discutida apenas em 1º turno. Com receio de que a Casa fosse responsabilizada por um eventual descumprimento do prazo dado pelo Supremo Tribunal Federal, o presidente articulou para que os parlamentares fossem à sessão.

Zema atrela privatizações a Propag

Como estratégia, o governo Zema tem argumentado que a transformação da Cemig em uma corporação, como prevê a proposta encaminhada à ALMG, facilitaria a federalização para a União como contrapartida para abater a dívida de Minas Gerais. Como o controle do Estado sobre a Cemig seria descentralizado, o governo Luiz Inácio Lula da Silva (PT) não teria que pagar os acionistas minoritários caso queira os 17,04% de ações que Minas tem.

A federalização é prevista no Programa de Pleno Pagamento da Dívida dos Estados (Propag), sancionado por Lula na última terça-feira (14 de janeiro). Caso transfira ativos que alcancem 10% da dívida com a União, de R$ 165 bilhões, o governo Zema reduzirá a taxa de juros que corrige o saldo em um ponto percentual de 4% para 3%. Apesar de ter dito que não aderiria mais ao Propag por conta de vetos do presidente, o governador afirmou que errou e projeta a adesão em 2026.     

Em entrevista na última quarta (16 de janeiro), Zema ressaltou que terá que transformar a Cemig em corporação e vender a Copasa para abater a dívida com a União. “Não temos de onde tirarmos recursos para abatermos R$ 30 bilhões para termos a solução definitiva, que é a queda na taxa de juros. Minas Gerais só vai ter a queda na taxa de juros se pagar e, para pagar, tem que vender esses ativos, não há outra solução”, argumentou.

PEC ajudaria governo Zema com quórum

Uma Proposta de Emenda à Constituição (PEC) encaminhada pelo governo Zema à ALMG ainda em 2023 pode facilitar a aprovação das privatizações de Cemig e Copasa. A PEC 24/2023, que propõe a quebra do referendo popular para dar aval à desestatização, ainda reduz o quórum exigido para aprová-las. Hoje, o número de votos favoráveis necessários para privatizar uma estatal é de 48. Caso a PEC seja aprovada, ele cairá para 50% dos presentes, mais um.

Entretanto, para aprová-la, o governo Zema terá que reunir 48 deputados. Desde que chegou à ALMG, em outubro de 2023, a PEC 24/2023 está em banho-maria na Comissão de Constituição e Justiça, a primeira em que tem que passar. Logo após ser reeleito para a presidência, Tadeuzinho pontuou que a PEC é uma coisa e as privatizações, outra. “Com muita maturidade e no momento correto, a ALMG fará todas essas discussões”, ponderou o presidente. 

Em novembro passado, quando levou pessoalmente as privatizações de Cemig e Copasa para a ALMG, o vice-governador Mateus Simões (Novo) reiterou que, para o Palácio Tiradentes, “faz mais sentido” que a PEC seja aprovada. “Mas, se a ALMG concluir ao longo dos próximos meses que é melhor aprovar a privatização e submeter a referendo, nós estamos prontos para isso. Nós já consultamos o Tribunal Regional Eleitoral. É um custo relevante, mas é um custo que a gente está pronto para enfrentar.”