Documentos apresentados ao Tribunal Superior de Londres revelam que a mineradora BHP Billiton teria recebido alerta sobre problemas na barragem de Fundão, em Mariana, pelo menos seis anos antes do rompimento ocorrido em 2015. Os primeiros sinais de defeitos teriam sido identificados em abril de 2009, cinco meses depois do início das operações. O julgamento da empresa anglo-australiana, uma das responsáveis pela Samarco, continua nesta segunda-feira (27 de janeiro).
Na fase atual de audiências, que se estende até a próxima quarta-feira (29), depoimentos de especialistas em geotecnia sobre as causas do rompimento estão sendo apresentados pela Pogust Goodhead – que representa cerca de 620 mil afetados – e pela defesa da BHP. Segundo Andrew Fulton KC, advogado dos atingidos, problemas como infiltrações e falhas no sistema de drenagem da barragem foram percebidos anos antes do desastre.
Entre os documentos apresentados por Fulton está um relatório de 2008, que teria dado "um sinal de alarme precoce". Um relatório de 2009 apontava “incidentes potencialmente graves” na estrutura, enquanto outro, de 2010, alertava para a fragilidade do projeto de armazenamento de rejeitos. Outro ponto apontado pelos requerentes seria um agravamento das condições da estrutura devido à expansão da barragem para atender ao nível de produção da Samarco e problemas relacionados à deposição de rejeitos provenientes da mina Alegria, operada pela Vale.
Segundo a defesa dos atingidos, outros incidentes graves foram registrados entre 2009 e 2014, incluindo rachaduras, vazamentos, falhas de drenagem e alterações estruturais que indicavam risco iminente envolvendo a barragem. Conforme apresentado ao tribunal, um incidente “extremamente grave” ocorreu em 2014, destacando o “movimento de inclinação” da barragem como um “grande sinal de alerta”. Após mencionar que medidas de emergência da Samarco teriam sido insuficientes, Fulton afirmou que "todas as informações estavam lá e simplesmente não foram aplicadas".
A defesa da BHP, conduzida pelo advogado Daniel Toledano, argumentou que nenhuma avaliação ou relatório técnico à época indicou que a barragem deveria ser desativada. A empresa reconheceu que houve problemas relacionados à elevação da barragem sobre camadas instáveis de lama, mas afirmou que os fatores por trás do colapso são complexos e exigem uma análise mais detalhada.
Em nota à reportagem de OTEMPO, a BHP ainda refutou a acusação. "Queremos deixar claro que os conselheiros da Samarco, indicados pela BHP Brasil, não foram informados de que a segurança da barragem estava comprometida. Na verdade, eles foram repetidamente assegurados por engenheiros e especialistas, incluindo especialistas independentes internacionalmente reconhecidos, de que a barragem estava sendo bem gerenciada, segura e estável", afirmou.
Julgamento em Londres
Em outubro de 2024, a Justiça inglesa começou a analisar a responsabilidade da BHP na tragédia que matou dezenove pessoas. A lama de rejeitos percorreu 675 km, atingiu o rio Doce e chegou ao oceano Atlântico, afetando o litoral do Espírito Santo e sul da Bahia.
O julgamento começou com o interrogatório de 7 funcionários e ex-funcionários da BHP, com perguntas envolvendo as operações da Samarco e a conduta da BHP antes e depois do rompimento da barragem. Em seguida, o Tribunal ouviu especialistas jurídicos brasileiros em direito civil e societário, abordando também a legitimidade dos municípios para apresentar uma ação nesse processo.
Além de prefeituras, membros de comunidades tradicionais, indígenas e quilombolas, empresas e instituições religiosas assinam a ação. A previsão é de que o julgamento vá até 5 de março de 2025, contando com a apresentação de depoimentos, evidências e testemunhos de especialistas em direito civil, societário e ambiental brasileiros e em questões geotécnicas.
Apesar do caso ser julgado na corte inglesa, a base legal é o direito brasileiro. A sentença é esperada ainda neste ano. Se a empresa for condenada, as indenizações devem chegar a R$ 260 bilhões.