O prazo para que os 49 municípios elegíveis ao Acordo de Reparação da Bacia do Rio Doce optem pela repactuação homologada pelo Supremo Tribunal Federal (STF) termina nesta quinta-feira (6 de março). Quase 10 anos após o rompimento da barragem do Fundão, que matou 19 pessoas e afetou permanentemente a Bacia do Rio Doce a partir da cidade de Mariana, na região Central de Minas Gerais, cerca de 35% das cidades elegíveis optaram pelo acordo coordenado pela União, os governos de Minas e do Espírito Santo, o Ministério Público e a mineradora Samarco. Entre as 49 cidades elegíveis ao acordo, 17 aderiram à repactuação.
Em Minas Gerais, Bugre, Caratinga, Ponte Nova, Iapu, Santana do Paraíso, Marliéria, Córrego Novo, Sobrália, Pingo D’água, Santa Cruz do Escalvado e Rio Doce optaram pela repactuação orquestrada no Brasil. Já no Espírito Santo, Anchieta, Fundão, Serra, Linhares, Conceição da Barra e São Mateus aderiram ao acordo. Segundo a mineradora, municípios que formalizaram a adesão nos primeiros 30 dias receberam um repasse de R$ 26,8 milhões em dezembro do ano passado.
No último dia 27 de fevereiro, a Samarco divulgou que irá antecipar o pagamento da primeira parcela do acordo de Mariana para todos os municípios que aderirem à proposta até o dia 6 de março. O prazo para recebimento da primeira parcela para quem assinou após 26 de novembro do ano passado era junho deste ano. Agora, os municípios vão receber até 30 dias após sua adesão, com exceção de Ponte Nova, que receberá no dia 6 de março.
Ampliação de verba
Em coletiva de imprensa na última sexta-feira (28 de fevereiro), o prefeito de Mariana, Juliano Duarte (PSB) divulgou que os chefes de Executivo das cidades abrangidas pelo documento querem ampliar o valor repassado aos municípios para mais de R$ 17 bilhões. A razão é que os recursos seriam insuficientes para as prefeituras, inclusive para realização de medidas previstas no acordo.
"Nós estamos buscando justiça, buscando defender o interesse da nossa população, do nosso município, pois todos os prefeitos sabem os problemas sociais que os municípios estão enfrentando, principalmente Mariana, que teve a sua economia totalmente fragilizada e destruída, juntamente com a barragem de Fundão."
Conforme Duarte, os R$ 6 bilhões previstos para os municípios no acordo representam apenas 4% do montante, a ser dividido entre 49 cidades. Com isso, os prefeitos querem ampliar para 11%, que era o pedido antes da elaboração da repactuação. Além disso, os chefes dos Executivos também demandam a redução do tempo de pagamento, cujo prazo é de 20 anos.
Também contrária aos termos do acordo de Mariana, a AMM relatou ter realizado inúmeras reuniões e tentativas de sensibilizar o Governo Federal sobre a necessidade de uma distribuição “justa” de recursos. Em outubro do ano passado, a organização acionou o Supremo Tribunal Federal (STF) afirmando que a compensação deveria ser mais próxima à de Brumadinho.
Nesta semana, a AMM voltou a procurar o STF. Desta vez, para pedir ampliação do prazo de adesão para os municípios por mais seis meses. Inicialmente, o tempo estipulado é de 120 dias a partir da homologação judicial do documento, feita em 6 de novembro de 2024.
“O Novo Acordo de Mariana pode transferir às prefeituras a responsabilidade pela recuperação dos danos causados pelo maior desastre ambiental da história do Brasil. Trata-se de um documento extenso, com mais de 1.200 páginas, e é fundamental que os prefeitos não assinem sem uma análise detalhada. Nossa preocupação é que, ao aderirem sem pleno entendimento, as prefeituras acabem assumindo encargos que deveriam ser das empresas responsáveis pelo desastre”, disse a AMM em nota assinada pelo presidente da associação, Marcos Vinícius Bizarro.
Julgamento em Londres
As cidades mais afetadas pelo desastre não aderiram ao termo e continuam participando de uma ação contra a mineradora anglo-australiana BHP Billiton, uma das responsáveis pela Samarco, movida em Londres. O julgamento do caso em Londres foi retomado nesta quarta-feira (5 de março) para as alegações finais das partes. A expectativa é de que a fase se estenda até 13 de março e um parecer quanto à responsabilidade da BHP seja anunciado ainda no início do segundo semestre deste ano. Segundo Tom Goodhead, o CEO do Pogust Goodhead, escritório que defende as vítimas na ação inglesa, a proximidade de datas não é coincidência, assim como a proximidade da retomada do julgamento e o anúncio da repactuação.
“Isso faz parte de uma campanha organizada de guerra jurídica pelas mineradoras, pela BHP. Eles estão tentando privar os municípios da oportunidade de litigar no exterior e recuperar quantias que realmente correspondam às suas perdas reais”, declarou o advogado inglês. “Vimos exemplos dos valores terríveis que foram oferecidos aos municípios pela repactuação, seguido por 23 prefeitos assinando uma carta contra o acordo. Na minha opinião, as empresas de mineração e do lobby da mineração querem pressionar os municípios a aceitarem uma quantia que seria muito menor do que suas perdas reais”, completou Goodhead.
Entre os termos envolvendo o acordo brasileiro, era necessário que os municípios desistissem de outras ações envolvendo o rompimento da barragem do Fundão. Com a medida, 5 municípios deixaram a ação inglesa e um processo contra a Vale, movido na justiça holandesa, para participarem da repactuação. A ação cível é movida por cerca de 640 mil vítimas do rompimento da barragem, 41 cidades e, aproximadamente, 1.500 empresas, autarquias e instituições religiosas contra a BHP Billiton.
Enquanto no julgamento em Londres, o valor que deve ser solicitado pelas vítimas, quantificado através das perdas que os municípios tiveram com o rompimento da barragem, é de £ 7,2 bilhões (cerca de R$ 52 bilhões), a repactuação brasileira tem outros moldes. O acordo que envolve a Samarco, prevê que os valores sejam distribuídos de forma proporcional ao impacto sofrido em cada cidade, mas propõe o pagamento de R$ 6,1 bilhões parcelados em 20 anos. Segundo o prefeito de Mariana, enquanto a cidade receberia cerca de R$ 1,6 bilhão pela repactuação, o valor previsto em indenizações na Inglaterra chega a R$ 28 bilhões.