Destacado para dar preço às estatais incluídas no Programa de Pleno Pagamento da Dívida (Propag), o Banco Nacional do Desenvolvimento Econômico e Nacional (BNDES) não vai conseguir avaliá-las até 31 de dezembro de 2025, prazo imposto pelo Ministério da Fazenda. Em entrevista a O TEMPO, o superintendente da Área de Soluções de Infraestrutura do BNDES, Ian Guerriero, confirmou que avaliações anteriores levaram entre nove e 18 meses.

De acordo com Guerriero, a data-limite de 31 de dezembro é “muito difícil” de ser atingida. “O processo em si, ter a avaliação, demora de nove a 18 meses a depender da empresa. Se nós conseguirmos iniciar (a avaliação) hoje, é só fazer a conta. (...) Caso seja uma empresa mais simples, a gente consegue ser mais rápido, mas a nossa experiência é neste prazo”, ressaltou o superintendente da Área de Soluções de Infraestrutura nesta quarta-feira (18 de junho).

As avaliações anteriores conduzidas pelo BNDES se deram no Plano Nacional de Desestatização (PND). Segundo Guerriero, as metodologias utilizadas no PND serão as mesmas empregadas no Propag. “O due dilligence é um processo bastante delicado. Há uma metodologia consolidada para isso e a nossa experiência com o PND é que esta etapa demora cerca de nove meses, e, em alguns casos, até um ano e meio, a depender da complexidade da empresa”, apontou ele.

O due dilligence são as diligências prévias, que prevê uma avaliação dos bens da empresa e de todas suas obrigações, como, por exemplo, contratos que podem gerar obrigações cruzadas entre a União e o Estado e dívidas. “No caso do Propag, é entender quais são as consequências para os contratos que as empresas já têm. Não é uma avaliação simples”, justificou o superintendente do BNDES.

Como já mostrou a reportagem, o Propag abre uma janela entre 1º de janeiro e 30 de junho de 2026 para que “a negociação dos termos e a divulgação do acordo de transferência de ações” sejam concluídas caso “a complexidade do acordo exigir”. O Estado, então, poderia firmar uma espécie de contrato provisório com a União para aderir ao programa de socorro financeiro antes da data-limite de 31 de dezembro. 

Questionado se a janela poderia solucionar o impasse, Guerriero respondeu que o Ministério da Fazenda é quem deveria esclarecer a dúvida. “A regulamentação estabelece uma sequência de etapas e a conclusão é junho de 2026. Então, entendemos que este é o prazo final para fazer a transferência. Repito: o BNDES entende que essas etapas podem ficar mais claras e a gente fez uma recomendação de ajustes”, reiterou o superintendente.

Diante da inviabilidade de avaliar as estatais até 31 de dezembro, Guerriero afirmou que o BNDES sugeriu ao Ministério da Fazenda ajustes na regulamentação do Propag para acelerar etapas prévias em busca de concluir a avaliação “o mais rápido possível”. “O nosso objetivo é acelerar o processo para que essas etapas, muito técnicas, sejam superadas rapidamente e que a gente possa acelerar e atender, no mínimo tempo possível, a demanda que o Propag faz ao BNDES”, apontou ele. 

Entre as sugestões, o superintendente da Área de Soluções de Infraestrutura citou, por exemplo, que os Estados já indiquem à União quais estatais querem utilizar para abater a dívida, acompanhadas de um laudo próprio de quanto valem estas empresas, e que a União, então, sinalize se tem interesse ou não nelas. Caso haja o interesse, o BNDES, em seguida, iniciaria o processo de avaliação, que será pago pela União, não pelo Estado.

Na última sexta (12 de junho), após a reunião do Comitê Gestor do Propag (CGPropag), o governador em exercício Mateus Simões (Novo) anunciou que encaminhou um ofício ao Ministério da Fazenda para consultá-lo se há interesse na federalização da Cemig, da Copasa, da Companhia de Desenvolvimento Econômico de Minas Gerais (Codemig) e na Empresa Mineira de Comunicação (EMC). Simões preside o CGPropag, instalado no último dia 5.

Além destas sugestões, Guerriero informou que o BNDES já encaminhou à União uma minuta para a contratação da instituição para avaliar os ativos e, ainda, um termo de referência para orientar a contratação de consultores especializados para conduzir parte da avaliação. “Mandamos para o Ministério da Fazenda para a avaliação deles e para o governo do Estado de Minas Gerais, que, como é detentor das estatais, tem que concordar com os termos”, acrescentou.

O superintendente ainda ponderou que se tratam de recomendações, ou seja, nem o governo Zema, nem o Ministério da Fazenda são obrigados a segui-las. “É importante ressaltar e isso precisa ficar bastante claro: o BNDES tem o papel de assessor técnico da União. Assim, estamos alertando essa limitação técnica para que a negociação não fique presa, e, ao reconhecer essa questão, englobe o processo a esta característica”, observou ele. 

O impasse para a avaliação das estatais veio a público quando o secretário da Fazenda, Luiz Claudio Gomes, afirmou que o BNDES teria sinalizado que o processo levaria 11 meses. Em entrevista ao Café com Política, publicada em 26 de maio, o secretário apontou que a contratação de uma empresa para avaliar as participações societárias levaria três meses, e a avaliação, em si, outros oito, o que inviabilizaria a conclusão até 31 de dezembro.

No último dia 4, após reunião em Brasília com o diretor de Planejamento e Relações Institucionais do BNDES, Nelson Barbosa, Simões reiterou o problema, já que, segundo ele, ouviu de Barbosa que a avaliação poderia se estender entre nove e 17 meses. “Nós temos um problema para resolver entre os prazos que a lei e o Ministério da Fazenda determinaram para a gente e os prazos do BNDES”, questionou ele. 

A estimativa do BNDES respingou na ALMG. Desde então, Simões pressiona o presidente da ALMG, Tadeu Leite (MDB), o Tadeuzinho, a pautar o restante das propostas do pacote do Propag, como, por exemplo, as privatizações de Cemig e Copasa, já que o Estado quer incluí-las no rol de ativos para alcançar os 20%. O governador em exercício argumenta que, sem a avaliação, o Estado deve oferecer o máximo de ativos possíveis.

Em resposta a Simões, Tadeuzinho manteve as privatizações de Cemig e Copasa engavetadas e colocou apenas a proposta de Emenda à Constituição (PEC) para pôr fim ao referendo popular exigido para tramitar. No último sábado (14 de junho), o presidente da ALMG afirmou que a Casa não funciona sob pressão. As privatizações de Cemig e Copasa, enviadas à ALMG em novembro de 2024, sequer foram lidas em plenário.

Apesar das cobranças de Simões a Tadeuzinho, o Propag não exige que a ALMG autorize a federalização de um ativo antes de ele ser oferecido à União, mas, apenas, para concluir o processo. A Casa tem até 31 de dezembro de 2025 para fazê-lo. De acordo com o Decreto 12.433/2025, responsável por regulamentar o programa, a ausência da autorização “não impede, havendo acordo, a assinatura de aditivo contratual com a redução da dívida consolidada”.