O ex-prefeito de Naque, cidade localizada no Vale do Rio Doce, foi denunciado pelo Ministério Público de Minas Gerais (MPMG) por suposta contratação ilegal de um escritório de advocacia do Recife (PE) e por usurpação de função pública. As acusações também abrangem um dos sócios-proprietários do escritório, que havia sido contratado para atuar pela prefeitura em ações e atos relativos à revisão de valores do Fundo de Participação dos Municípios (FPM) em 2024.
De acordo com a Procuradoria de Justiça Especializada em Ações de Competência Originária Criminal, o ex-prefeito Fernando Silva teria conferido poderes judiciais e administrativos ao escritório sem formalidade. A denúncia do MPMG diz que, de julho a agosto do ano passado, o sócio do escritório teria atuado como advogado em determinadas ações judiciais do município, mas sem que houvesse sido feito procedimento administrativo relativo à contratação.
O caso veio à tona após a Justiça extinguir uma ação movida pelo profissional devido à nulidade da representação processual. O advogado teria representado o município de forma irregular, considerando que a contratação não teria ocorrido por meio de processo licitatório, além de não terem sido apresentadas justificativas dentro de uma inexigibilidade de licitação.
A denúncia do MPMG aponta que, em setembro de 2024, o então prefeito teria buscado regularizar a situação, realizando a contratação direta do escritório por notória especialização ou singularidade dos serviços, apresentando termo de inexigibilidade de licitação.
Entretanto, o Ministério Público considera que não foram demonstrados os requisitos necessários à contratação direta, como singularidade e notória especialização. Além disso, não teria ficado comprovada, de acordo com a denúncia, a impossibilidade de execução dos serviços contratados pelo quadro próprio de servidores do município.
O procurador de Justiça que atua no caso, Cristovam Joaquim Fernandes Ramos Filho, também questiona o valor de R$ 563 mil que a Prefeitura de Naque iria pagar pelos serviços do escritório de advocacia. Conforme o MPMG, o valor superaria em mais de 80% do máximo estabelecido pelo Código de Processo Penal e por outras normas para a contratação de escritório para atuar em casos ligados ao FPM.
Nas redes sociais, o ex-prefeito Fernando Silva publicou um vídeo para esclarecer o ocorrido. Ele explicou que, ao participar de um fórum de gestores municipais em Belo Horizonte, descobriu que Naque poderia receber até R$ 3 milhões referentes ao FPM. O ex-chefe do Executivo da cidade ainda disse que teria seguido os devidos processos, e que a forma de contratação é semelhante à que ocorre em relação ao julgamento na Inglaterra do rompimento da barragem em Mariana - no caso, o escritório só receberá se vencer a causa.
“Aguardo a notificação para que eu possa prestar os esclarecimentos ao Ministério Público, e tenho convicção e a consciência tranquila de que fiz o melhor, que era recuperar recursos que, de fato, eram do município de Naque e que deveriam estar aqui para serem investidos na saúde, na educação e na melhoria da qualidade de vida das pessoas”, disse o prefeito.
O escritório “Monteiro e Monteiro Advogados Associados” foi procurado pela reportagem. Em nota, o grupo informou que o advogado Bruno Romero Pedrosa Monteiro irá apresentar a defesa nos autos do processo, "demonstrando que a contratação seguiu todos os trâmites exigidos pela Lei de Contratações Públicas e pela jurisprudência do Supremo Tribunal Federal, após a sua citação, o que ainda não ocorreu até o momento".
O ex-prefeito Fernando Silva também encaminhou nota à reportagem. Ele explica que a contratação do escritório ocorreu pela "notória especialização e expertise técnica" do grupo, considerado "referência na área de recuperação de crédito com mais de 30 anos de atuação". O ex-chefe do Executivo destaca, ainda, que os valores são baseados em percentual legal praticado em contratos da natureza, complementando que não houve pagamento que gerasse danos aos cofres públicos.
"Será devidamente demonstrado, no decorrer do processo, que não houve qualquer prática criminosa relacionada à contratação, estando todos os atos administrativos amparados pela legislação vigente", diz Silva. "Entendo ser incorreta qualquer tentativa de associar a minha gestão a práticas ilícitas, visto que a contratação encontra amparo legal e foi pautada na busca pela defesa do interesse público, pela eficiência administrativa e pelo fortalecimento das políticas públicas municipais", finaliza.