Desmembrado

Anistia a Dilma racha a base, que vê ‘dízimo' ao PT

Capitaneada por Renan, parte do PMDB votou para que ex-presidente não se torne inelegível


Publicado em 01 de setembro de 2016 | 03:00
 
 
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Brasília. A fim de minimizar os efeitos da cassação do mandato de Dilma Rousseff, aliados da ex-presidente se articularam para separar a votação do impeachment da decisão sobre seus direitos políticos. A pedido do presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL), o presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), Ricardo Lewandowski, que comandou o julgamento de Dilma, acatou o pedido. Capitaneada por Renan, uma ala com 15 senadores do PMDB votou para manter o direito de Dilma a ocupar cargos públicos.

A anistia à petista criou um profundo racha na base do governo de Michel Temer no Congresso e desagradou parlamentares do PSDB, do DEM e de demais partidos que militaram fortemente pelo impeachment. Eles acusaram parte do PMDB de ter “traído todo o trabalho desenvolvido até aqui”.

A decisão também foi criticada por ser considerada um precedente para que a Câmara Federal proceda da mesma forma ao julgar seu ex-presidente, o deputado Eduardo Cunha (PMDB-RJ).

Líder do PSDB no Senado, Cássio Cunha Lima (PB) deixou o plenário dizendo não aceitar “punhalada pelas costas” e afirmando que estaria “fora do novo governo”. Já Agripino Maia (DEM-RN) disse que os senadores pagaram “dízimo” ao PT. “Acho que o Senado julgou (Dilma), mas a decisão ficou contaminada pelo dízimo que algumas pessoas quiseram pagar a um governo com quem tinham relação e ao qual deviam atenção. O resultado final mostra que você pune, mas não completa a pena, é uma punição pela metade”, disse o presidente do DEM. Para ele, a consequência da dissidência de parte dos peemedebistas é que haverá a necessidade de um “sobre-esforço do presidente Michel Temer para, primeiro, unificar o PMDB e, depois, unificar a base”.

Incomodada com a anistia concedida à ex-presidente Dilma Rousseff, a cúpula do PSDB chegou a anunciar que iria ao STF questionar a decisão do ministro Ricardo Lewandowski de permitir votações separadas, uma para a cassação do mandato, e outra para definir se Dilma ficaria impedida de exercer funções públicas. A sigla, porém, recuou da intenção. A avaliação foi que uma ação na Corte contra parte do desfecho do impeachment poderia dar uma brecha para que o Judiciário reavaliasse todo o processo, lançando nova frente de instabilidade sobre o governo Temer.

Advogado de defesa de Dilma, José Eduardo Cardozo avaliou que a presidente não se enquadra na Lei da Ficha Limpa porque não foi condenada por crime de improbidade, como prevê a regra.

Articulador. Por muitos meses ao longo da crise, Renan Calheiros foi visto como o último bastião de Dilma Rousseff no Senado. Recentemente, se uniu a Temer, mas na madrugada dessa quarta (31), antes da votação, se reuniu com petistas. Segundo a “Folha de S.Paulo”, ele pediu que a oposição a Temer fizesse um gesto, apoiando a votação de medidas provisórias emitidas pelo novo presidente que estão perto de caducar, em troca do apoio à anistia de Dilma.

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Precedentes

Cunha se assume ‘protagonista’

Brasília. O presidente da Câmara dos Deputados, Rodrigo Maia (DEM-RJ), afirmou nessa quarta (31) que a decisão do presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), ministro Ricardo Lewandowski, de fatiar o julgamento do impeachment de Dilma Rousseff abre um precedente para que o plenário da Câmara vote um projeto de Resolução e não o parecer pela cassação do ex-presidente da Casa, Eduardo Cunha (PMDB-RJ).

Ele lembrou que, na prática, isso significaria a possibilidade de aliados de Cunha tentarem aprovar uma pena mais branda do que a cassação propõe (a perda do mandato) ou tentar preservar os direitos políticos do deputado afastado, por meio de emendas ou destaques apresentados durante a votação.

A mesma avaliação é feita por juristas e constitucionalistas. Cunha, acusado de corrupção e lavagem de dinheiro na operação Lava Jato, será julgado no dia 12 de setembro por seus pares. O professor do Instituto de Direito Público de São Paulo Luiz Fernando Prudente do Amaral afirma que “a aplicação da mesma lógica para Cunha não é um efeito automático, mas é algo que certamente será alegado”.

Acusado pelo PT de ter viabilizado o processo de impeachment por vingança – já que a bancada do PT votou contra ele no Conselho de Ética da Câmara –, Cunha divulgou nota nessa quarta (31) em que se diz “protagonista do processo” e sustenta que o afastamento de Dilma Rousseff é a prova de que seus atos à frente da Câmara foram corretos.

“Como protagonista do processo, tendo praticado o primeiro ato da aceitação da denúncia oferecida por crime de responsabilidade contra a ex-presidente, vejo que todos os meus atos foram confirmados por sucessivas votações, tanto na Câmara, quanto no Senado, atestando a lisura dos meus atos”, diz a nota.

Cunha afirma lamentar que “uma democracia jovem como a nossa tenha que passar pelo trauma de mais um afastamento de um presidente da República”. A nota diz também que a defesa de Dilma fez acusações falsas contra ele para esconder que não havia razões suficientes para inocentá-la: “O Brasil passou e passa por momentos delicados em que práticas do governo afastado obtiveram a punição prevista.”

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