O Ministério Público Federal (MPF) entrou com uma ação civil pública para obrigar a Universidade Federal de Ouro Preto (Ufop) a adotar critério socioeconômico na distribuição de vagas em repúblicas utilizadas como moradia por estudantes da instituição.
Isso porque, segundo a ação assinada pelo procurador Gustavo Henrique Oliveira, atualmente os critérios são adotados pelos próprios alunos. “Diz-se que a seleção é feita por ‘afinidade’, porém os pretendentes somente são admitidos quando suportam, com submissão, um longo período de provações físicas e psicológicas, denominado ‘batalha’”, cita no documento.
Oliveira diz também que há casos de estudantes que se mostram insatisfeitos com a conduta dos já moradores dos locais e acabam sendo rejeitados ou vetados. “Esse é o ignóbil sistema conhecido como ‘autogestão’, ferrenhamente defendido pela Ufop como se fosse um bem imaterial”, diz o procurador. Após a “expulsão”, o aluno, geralmente, busca uma república particular. Em casos extremos, estudantes de baixa renda acabam deixando o curso e retornam às cidades de origem.
São, de acordo com o MPF, 792 vagas em 59 imóveis públicos. “Enquanto sobram vagas nas repúblicas federais, destinadas apenas aos que concordam e reproduzem a cultura de opressão hierárquica estabelecida, os alunos provenientes de famílias de baixa renda que fogem, com razão, de trotes e batalhas disputam apenas 264 vagas em outros espaços de Ouro Preto”, acrescenta o procurador. Essas vagas restantes ficam nos bairros Bauxita e Vila Universitária.
Durante o inquérito, o MPF ouviu 103 estudantes da universidade. Desses, 92 confirmaram as “batalhas” como forma de entrar nas repúblicas. Outros 64 alunos também apontaram “ambiente inadequado ao estudo”, 73 disseram ocorrer “hierarquia entre veteranos e calouros” e 64 afirmaram ter presenciado casos de “homofobia, misoginia, racismo e uso de drogas”.
Um dos alunos afirmou no inquérito que “os imóveis da universidade foram cooptados por interesses particulares de grupos de estudantes que se arrogam o título de ‘donos’ do espaço público, transformados em espécies de feudos, onde vassalos, conhecidos como ‘bixos’ são tratados como ‘mordomos’ e ‘escravos’, frequentemente humilhados, assediados e violentados física e psicologicamente”.
As representações junto ao MPF ocorrem há anos. Na inicial da ação, o procurador cita uma denúncia feita sob sigilo por um aluno em 2013. “Entre os moradores das repúblicas federais, que não precisam pagar aluguel, há inúmeros estudantes possuidores de carros importados, que têm renda familiar superior à média brasileira e que não precisariam, por carência, de assistência estudantil tão relevante como a exclusão da taxa de aluguel”.
Denúncias também já foram feitas por pais de alunos. Uma mãe, sob sigilo, afirmou que veteranos cobraram de sua filha reprovação nas matérias do semestre como exigência para permanecer no local. Ela também deveria “trabalhar” como garçonete em festas organizadas pelos veteranos.
A ação está com a juíza substituta Patrícia Alencar Teixeira de Carvalho, que determinou, no dia 22 deste mês, que a universidade se manifestasse em 72 horas após citação. Por meio de nota, a Ufop informou que ainda não foi notificada.