BRASÍLIA - Antes resistentes, integrantes da base governista no Congresso Nacional decidiram aderir à Comissão Parlamentar Mista de Inquérito (CPMI) no Congresso Nacional para investigar a fraude no Instituto Nacional do Seguro Social (INSS).  

O entendimento foi de que será difícil fugir da apuração, especialmente se o Supremo Tribunal Federal (STF) entrar em ação e determinar a instalação da CPMI, como aconteceu na época da pandemia de Covid-19. Além disso, de que deixar a pauta nas mãos da oposição pode fragilizar ainda mais a imagem do governo, já impactada por outros desgastes

A mudança de estratégia conta com uma tentativa de equilibrar a narrativa da possível CPMI. Isso, tentando responsabilizar o governo do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) pela fraude – postura que também será adotada pela oposição contra o governo.  

A intenção é mirar políticos que ocuparam cargos no governo Bolsonaro. Um deles é o atual líder do PL no Senado, Rogério Marinho (RN), foi secretário de Previdência e Trabalho entre janeiro de 2019 e fevereiro de 2020. 

De acordo com a Polícia Federal (PF), o rombo de R$ 6,3 bilhões a partir de descontos associativos indevidos em benefícios de aposentados começou em 2019, na gestão Bolsonaro, e terminou em 2024, no segundo ano de governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT). 

As negociações são para que a relatoria fique nas mãos de um nome alinhado ao governo. O nome da deputada federal Tabata Amaral (PSB-SP) já circula como cotado nos bastidores. Ao UOL, a parlamentar disse que ainda não recebeu o convite e seu partido não foi procurado para tratar sobre o assunto. 

O líder do PT no Senado, Rogério Carvalho (SE), afirmou na quinta-feira (15) que o partido irá assinar o pedido de criação da CPMI. O senador Fabiano Contarato (PT-ES), que liderou a bancada no último ano, foi o primeiro a aderir ao pedido encabeçado pela oposição. 

"Se mudar o fato determinado dessa CPI, para não ser um palanque político de um lado, [...] o PT vai assinar, sim, essa CPI, e nós vamos investigar, olhando, na linha do tempo, todos os fatos e todas as pessoas, como fizemos na CPI da Covid, como fizemos na CPI do 8 de janeiro, sem nenhum tipo de problema de fazer investigação mais profunda”, declarou Carvalho. 

O anúncio foi durante uma audiência do ministro da Previdência Social, Wolney Queiroz, com senadores na Comissão de Transparência, Fiscalização e Controle. Wolney também se manifestou “pessoalmente a favor da CPMI”, repetindo que o governo “não tem medo”. 

"Eu também, pessoalmente, sou a favor da CPMI, porque acho que a sociedade merece essa resposta por parte do Parlamento", destacou o ministro, ressaltando ter "medo" de que a apuração parlamentar atrase o ressarcimento e atrapalhe as investigações. "É uma coisa que já aconteceu outras vezes. Eu, inclusive, já participei, como deputado federal, de CPMIs, de CPIs que se transformaram em palco político. Então, é um alerta que eu fiz, para que a gente não venha a atrapalhar as investigações e o ressarcimento, que são as prioridades do nosso governo".

Já o líder do governo Lula no Senado, Jaques Wagner (PT-BA), explicou que "não assina CPI" porque, na avaliação dele, o Parlamento "não tem a estrutura que a Polícia Federal e os órgãos de controle têm para fazer a pesquisa".

"Nós estamos trabalhando em cima do que a [Polícia] Federal já estourou, essa que é a verdade, e vamos fazer palco em cima disso. Eu não assinei, mas talvez eu assine, porque esse vento vai mudar de lado e vai ficar claro quem montou esse trambique aí", frisou.

Apesar disso, Jaques voltou a declarar, na audiência com Wolney, não querer assinar a CPI porque prefere discutir outros temas no Senado. "Que a Polícia Federal cuide disso aí", finalizou, em referência à fraude no INSS.

Como funciona uma CPMI

Uma CPMI funciona de forma mista, com a atuação de deputados e senadores. Ela não tem o poder de incriminar ninguém, mas de conduzir uma apuração paralela à de órgãos oficiais, como a PF, e sugerir o indiciamento de quem considerar responsável por uma conduta criminosa. 

A abertura dos trabalhos precisa ser determinada pelo presidente do Congresso Nacional, Davi Alcolumbre (União Brasil-AP), a partir de um requerimento protocolado. A oposição não descarta, porém, recorrer ao STF caso Alcolumbre não determine a criação da CPMI. 

O argumento será o histórico da CPI da Covid, que teve sua criação determinada pelo STF em 2021. Na época, os ministros alegaram que a Constituição obriga a instalação de comissões de inquérito quando três critérios são cumpridos: assinatura de um terço dos integrantes da Casa Legislativa, indicação do fato determinado a ser apurado e definição de prazo certo para duração.  

A CPMI do INSS

O pedido de criação da CPMI do INSS foi protocolado na segunda-feira (12). As autoras foram a deputada Coronel Fernanda (PL-MT) e a senadora Damares Alves (Republicanos-DF), que reuniram, no protocolo, as assinaturas de 36 senadores e 223 deputados — mais que o mínimo necessário.

Inicialmente, a oposição pretendia recorrer à instalação de uma Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) na Câmara, com a participação somente de deputados federais. Nomes da direita chegaram a coletar o número necessário de assinaturas, mas a fila de comissões que ainda aguardam instalação impediria o rápido avanço da CPI do INSS.

O regimento da Câmara não possibilita manobras para "furar a fila". Dessa forma, a CPMI no Congresso, que reúne deputados e senadores, foi o plano B encontrado pela oposição. 

Antes das assinaturas do PT, a adesão ao pedido contou com nomes da oposição e de partidos do Centrão que têm representantes na Esplanada dos Ministérios e compõem a base governista. É o caso de parlamentares do PP, Republicanos, União Brasil, PSD, MDB, PSB e Podemos.