Documentos anexados pela Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) da Câmara Municipal de Belo Horizonte que apura os débitos do município com a Andrade Gutierrez reforçam as suspeitas de irregularidades em contratos da empreiteira com a prefeitura entre 1979 e o fim dos anos 80.
Entre os documentos aos quais O TEMPO teve acesso está o relatório final da CPI das Empreiteiras, conduzida pela Câmara em 1994. Também há relatórios de subcomissões que analisaram cada obra executada no período e que apontam distorções entre valores contratados e efetivamente executados, além de alterações nos projetos licitados.
Titular da CPI de 1994 e relator da subcomissão que analisou as obras de canalização do ribeirão Arrudas, o então vereador e hoje deputado federal Rogério Correia (PT) acredita que possa ter havido pagamentos irregulares à Andrade, porque investigações da época já apontavam relações ilegais entre construtora e Executivo.
“Houve uma situação, no caso da canalização do Arrudas, que explica isso bem. Ao assumir a Prefeitura de BH, nos anos 90, o prefeito Patrus Ananias rescindiu os aditivos assinados com a Andrade Gutierrez e realizou uma nova licitação para outro trecho de canalização do Arrudas. A Andrade Gutierrez venceu essa licitação com uma oferta quase 140% menor que o aditivo referente à mesma obra que havia sido rescindido”, relembrou.
Essa situação está descrita no relatório da subcomissão: “Caso se utilizasse o termo aditivo no contrato anterior, a mesma construtora executaria a obra 138% vezes mais que o valor que se propôs receber no recente processo licitatório”.
A lei vigente na época permitia sucessivos aditivos que levavam ao superfaturamento das obras e até mudanças nos projetos em relação aos objetos inicialmente licitados. “Essa situação veio à tona após o escândalo dos Anões do Orçamento’, que levou a uma CPI no Congresso e revelou relações entre parlamentares e grandes empreiteiras, com pagamento de propinas. Então, decidimos levantar todos os contratos e investigar as grandes obras de Minas”.
Além da obra do Arrudas, foram investigadas à época e voltam a ser analisadas pela CPI atual a construção do túnel da lagoinha e a remoção de aguapés na lagoa da Pampulha – todas executadas pela Andrade Gutierrez e pelas quais teria sido pago cerca de R$ 1,7 bilhão.
Porém, o valor total da dívida, conforme acordo firmado entre o então prefeito Célio de Castro e a construtora em 1999 e autorizado pela Câmara por meio da aprovação da Lei 7.639/99, seria de R$ 143,245 milhões. E é exatamente essa divergência entre os valores que está sendo investigada agora.
“Nossos objetos de análise são as confissões de dívida de 1988 e, depois, o acordo assinado em 1999, além de pagamentos realizados de 1999 e 2013. Estamos investigando três suspeitas: que os valores pagos não fossem devidos, que os índices de correção utilizados estejam em desacordo com o valor efetivo e que tenham sido pagos valores que sequer estavam previstos no acordo, já que há parcelas pagas após o fim desse acordo”, disse o atual relator da CPI, Mateus Simões (Novo).
Ainda segundo ele, a última das 14 parcelas anuais deveria ter sido paga em 2012, mas, em 2013, o município quitou uma prestação de R$ 166 milhões. “Uma parcela que, sozinha, já era maior que o valor originário do débito. Nosso questionamento é se realmente a dívida total corrigida chegaria a R$ 1,5 bilhão, como foi pago pela prefeitura”.