O ex-procurador geral de Belo Horizonte, Marco Antônio de Rezende Teixeira, negou qualquer irregularidade nos pagamentos realizados pela prefeitura da capital mineira à construtora Andrade Gutierrez referentes a obras realizadas entre 1979 e 1987.
Ele foi ouvido na sessão desta segunda-feira (2) da Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) da Câmara Municipal de BH, que apura os débitos da prefeitura com a construtora que deram origem a um acordo para pagamento de uma dívida reconhecida de R$ 143 milhões - efetivamente pagos entre 1999 e 2013 mas que, na prática totalizaram quase R$ 1,7 bilhão.
Segundo Teixeira, que já era procurador à época em que o acordo foi firmado, todos os contratos da Andrade Gutierrez, bem como os documentos referentes às dívidas, foram revisados e o caso, inclusive, foi levado à Justiça. "A Justiça mandou pagar, inclusive, com juros de mercado e na forma de precatórios, que, à época, correspondiam a três vezes o orçamento da Prefeitura".
Para evitar a cobrança por precatório, Teixeira relatou que o Executivo ingressou com recursos de forma a adiar a execução das cobranças e firmou em 1999 um acordo, com anuência da Câmara dos Vereadores, para o pagamento dos valores devidos. Ainda segundo ele, esse acordo foi responsável por reduzir a dívida para menos de 25% do total.
"Não ficamos alheios, não. Inclusive, foi uma exigência na ocasião do acordo e a Andrade Gutierrez aceitou excluir toda e qualquer medição que tivesse questionamento e isso foi feito. No caso dos aguapés da Pampulha, por exemplo, a construtora deu quitação sem receber pelo serviço porque a Sudecap identificou irregularidades na realização do serviço. E isso fez com que a dívida inicial que era de cerca de R$ 800 milhões à época caísse para R$ 143 milhões - que foi o valor do acordo final. Então, conseguimos mais de R$ 600 milhões só com o levantamento das medições feitas pela Sudecap".
Mas, segundo o relator da CPI, vereador Mateus Simões (Novo), no dia seguinte ao acordo firmado, a Prefeitura confessou uma dívida maior - que teria resultado em um pagamento total de R$ 1,7 bilhões ao longo de 14 anos. “Agora ficou claro que, no mínimo, 45% de todos os pagamentos feitos foram feitos ilegalmente. A Câmara Municipal autorizou, no ano de 1999, o pagamento de uma dívida de R$ 143 milhões e a Prefeitura, naquele mesmo ano, confessou uma dívida de R$ 260 milhões e foi esse montante que virou R$1,7 bilhões”.
Obras não teriam sido pagas
Ainda em seu depoimento, o ex-procurador assegurou que, no caso das obras de canalização do Arrudas, a construtora teria executado os serviços sem receber nada durante o governo do então prefeito Sérgio Ferrara. Apenas os aditamentos no contrato, realizados já nas administrações de Pimenta da Veiga e Eduardo Azeredo, foram quitados. Esse contrato foi suspenso, e uma nova licitação realizada na gestão de Patrus Ananias - contrato esse 140% mais barato do que se as obras tivessem continuado sendo executadas por aditivos. "Foram as principais obras da cidade depois dos anos 60 e que não foram pagas. Não foi pago nenhum prego".
Mas, o relator questiona os motivos pelos quais a construtora não interrompeu as obras. “A conclusão dele, de que não há nenhuma irregularidade, me deixa a dúvida: por que a Andrade Gutierrez teria trabalhado por 15 anos de graça para a prefeitura de Belo Horizonte? Porque essa foi a linha de raciocínio desenvolvida aqui hoje” disse Simões.
Teixeira também destacou que a CPI precisa considerar que, à época em que os contratos foram firmados, e as obras foram executadas, a legislação vigente era outra e permitia práticas hoje proibidas pela lei. "Todos esses contratos foram feitos sob a vigência do decreto-lei 2.300/86 e do Código de Contabilidade Pública, ou seja, foram obras realizadas dentro de uma legislação extremamente flexível e permissiva".
Ele garantiu ainda que todos os contratos foram minuciosamente analisados pela CPI das Empreiteiras, realizada pela Câmara na década de 90, e foram levados também ao Tribunal de Contas. "Tudo isso será facilmente comprovado pelos documentos que hoje chegam aqui da prefeitura", concluiu.
Teixeira foi procurador geral durante a administração de Célio de Castro, Fernando Pimentel e Marcio Lacerda à frente da prefeitura da capital - entre 1997 e 2005 (ou seja, quando foi firmado o acordo entre o Executivo e a Andrade Gutierrez em 1999) e, posteriormente, entre 2006 e 2012. Além disso, ele foi diretor jurídico da Superintendência de Desenvolvimento da Capital (Sudecap) na gestão Patrus Ananias (entre 1993 e 1996).
Documentos
A Prefeitura de Belo Horizonte entregou à Câmara Municipal no final desta manhã 186 caixas com documentos referentes aos contratos firmados com a construtora Andrade Gutierrez no período de 1979 e 1987.
Os documentos foram enviados em resposta a um requerimento Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) que apura os débitos do município com a Andrade Gutierrez nas obras de canalização do ribeirão Arrudas, construção do túnel da Lagoinha e remoção de aguapés na lagoa da Pampulha.
A entrega dos documentos foi criticada pelo relator da CPI, vereador Mateus Simões (Novo). “O que me assustou hoje foi a prefeitura enviar mais de cem caixas de documentos ao invés de separar a documentação que vai ser analisada pela Câmara Municipal”, relatou.
Requerimentos
Na sessão desta segunda-feira, os vereadores que compõem a CPI negaram um pedido do ex-presidente da Andrade Gutierrez, Otávio Marques de Azevedo, para que não fosse depor e mantiveram a convocação dele para o dia 23 de março.
Atendendo a um pedido da construtora, os vereadores dispensaram a convocação de Roberto Torres de Faria, e aprovaram um requerimento para a convocação do diretor de engenharia da empresa, Fernando Leyser Gonçalves.
Também foi remarcada a oitiva do ex-governador e ex-prefeito de BH, Fernando Pimentel. Ele apresentou uma solicitação de adiamento do depoimento por razões profissionais.
Além dele, também serão ouvidos o ex-prefeito Marcio Lacerda, o ex-procurador-geral Rúsvel Beltrame Rocha.