Gabriel Azevedo

Bissexualidade: símbolos que ajudam a refletir identidades

Achados jamais perdido

Por Gabriel Azevedo
Publicado em 02 de setembro de 2022 | 03:00
 
 
 
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Há certos objetos que surgem em nossas vidas para simbolizar algo em especial. Todos temos alguns. Dias atrás, um desses escapou-me do bolso da camisa sem que eu notasse. Ainda em 2018, com meus 32 anos, já me compreendia como um homem bissexual, porém ainda não falava abertamente sobre isso. Não me privava da verdade, mas não a explicitava. Foi quando, fazendo compras refletindo sobre a vida, entrei numa óptica. Havia belos exemplares…

Não precisei testar nenhum além do que mais gostei. Diante do espelho, havia me decidido. Ao ver o reflexo, numa conclusão óbvia, defini que deixar claro a minha orientação sexual seria uma questão de dias. Afinal de contas, é bom a gente ser diante de todos o que se vê espelhado toda manhã. É libertador.

Esses óculos de sol, a despeito de outros que tenho, passaram a ser os que eu usava quase sempre. E eles se foram. Liguei para a loja, a única que existe no mundo, e nada. Era uma série limitada que não se produz mais. Aquelas lentes pelas quais eu resolvi que me vissem como sou se perderam. E não vou disfarçar. Que tristeza.

Bobagem, eu sei… Um amigo, que pegou outros óculos meus emprestados, também conseguiu a proeza de perdê-los no mesmo dia. E tudo bem. Objetos por si se repõe. Símbolos é que não. De qualquer forma, vão-se os óculos e ficam os olhos.

Muitas pessoas não consegue lidar com fato de serem bissexuais

Esses olhos fechados passaram a me transportar para aquele momento da vida. Um privilegiado. Deixei claro que era bissexual e… tudo bem. Já era vereador e, portanto, uma ou outra matéria foi publicada. Conversas com amigos. Ligações para conhecidos. Evidentemente, muito falatório dado que, em Belo Horizonte, quem desejar nem precisa cuidar da própria vida diante do fato de que há muitos outros dispostos a cuidar dela… A mãe mais carinhosa. O pai mais incrédulo. E tudo bem.

Já era responsável pelo meu sustento. Já tinha o meu próprio lar. Era um homem independente e fiquei ainda mais. Que privilégio, insisto. E insisto dado que essa não é a realidade de todas as pessoas cuja orientação sexual não é heterossexual.

Na nossa cidade existem muitas pessoas que não conseguem lidar com o fato de serem bissexuais ou homossexuais, por exemplo. Já me confessaram temer profundamente o que os outros vão pensar. E sempre digo que essa história de viver a vida para agradar os outros é uma péssima opção.

Há grande quantidade de homens e mulheres que vivem numa relação heterossexual, mas não conseguem contar para quem amam que são bissexuais. Há várias situações, mas quero abordar uma em especial.

BH tem centro de referência LGBT para acolher população

Existem, na capital do Estado cujo lema é a liberdade, pessoas, sobretudo jovens, sobretudo pobres, que são expulsas de seus lares pelas suas famílias quando suas orientações sexuais são descobertas ou explicitadas. Elas, diferente desse privilegiado vereador, não tiveram a felicidade de guardar óculos de sol como a doce memória de se revelar. Não. Muitas guardam marcas no corpo das últimas agressões antes de serem postas para fora de casa por serem quem são. E depois?

Existe em Belo Horizonte um Centro de Referência LGBT, na rua Curitiba, 481. Os dados deixam qualquer um com o coração entristecido. Quem quiser conhecê-los deve buscar o relatório da Secretaria Municipal de Assistência Social, Segurança Alimentar e Cidadania.

Quando alguém expulso de seu lar chega lá, pergunto-lhes, para onde direcionar? Para um espaço destinado a pessoas em situação de rua? Não. É por isso que devem existir políticas públicas para diferentes cidadãos. Você trata casos diferentes com orçamentos diferentes. Ainda esse ano, haverá a inauguração de um espaço para quem sofre essa violência. E, em conversa com a secretária Maíra Colares, fiz questão de comprometer parte das emendas impositivas ao orçamento as quais tenho direito com essa fundamental ação.

Nenhum cidadão pode ficar sem um teto por ser quem é. De preferência, para que, junto de outras pessoas que passaram pelo mesmo, encontre motivação para seguir em frente mesmo com perdas que possam doer.

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