A política externa brasileira tem se caracterizado por atuação em defesa da paz internacional, promoção da cooperação internacional e defesa de princípios como igualdade soberana dos Estados, não intervenção, abstenção do uso ou da ameaça da força e solução pacífica das controvérsias.
Nosso comportamento prima pelo não alinhamento automático com qualquer das grandes potências. O presidente Ernesto Geisel rompeu o acordo militar com os EUA em resposta às críticas do então presidente Jimmy Carter à política de direitos humanos no Brasil, às ações limitadoras do desenvolvimento nuclear e às tentativas de controlar a política militar.
A atual Política Nacional de Defesa (PND), coerente com a tradição de nossa política externa, exercida pela diplomacia e pelo poder militar, afirma no item 5.7: “O Brasil defende ordem internacional baseada na democracia, no multilateralismo, na cooperação, na proscrição das armas químicas, biológicas e nucleares, e na busca da paz entre as nações. Defende a reforma das instâncias decisórias internacionais, de modo a torná-las mais legítimas, representativas e eficazes, fortalecendo o multilateralismo, o respeito ao direito internacional e os instrumentos para a solução pacífica de controvérsias”.
Em seu item 5.8, diz: “A Constituição tem como um de seus princípios nas relações internacionais o repúdio ao terrorismo. O Brasil considera que o terrorismo internacional constitui risco à paz e à segurança mundiais. Condena, enfaticamente, suas ações e implementa as resoluções pertinentes da ONU, reconhecendo a necessidade de que as nações trabalhem em conjunto no sentido de prevenir e combater as ameaças terroristas”. Afirma ainda no item 5.12: “O Brasil atua na comunidade internacional respeitando os princípios consagrados no art. 4º da Constituição, em particular os princípios de autodeterminação, não intervenção, igualdade entre os Estados e solução pacífica de conflitos”.
O idealismo político, traduzido em softpower, não cabe em um mundo violento, de fortes antagonismos políticos e religiosos, respaldado por potências nucleares que se consideram não submissas a qualquer outra. O que já foi aqui citado da PND é uma postura de autodefesa, fruto da falta de poderio militar nuclear para respaldar uma política externa mais agressiva ante grandes antagonismos, e em busca da concretização dos interesses nacionais – que são, segundo Hans Morgenthau, estrela-guia, única linha de pensamento e norma de ação no relacionamento com as demais nações.
A chamada “Dama da Morte”, Madeleine Albright, ex-secretária de Estado dos EUA, questionada sobre que país era mais importante, Brasil ou Índia, respondeu sem pestanejar: “o poder nuclear da Índia!” (que detonou seu primeiro artefato atômico em 1974) – fala corroborada por ministro indiano: “Éramos país de segunda categoria, mas nos tornamos um país respeitado. Temos outro status internacional: somos uma potência com poder militar nuclear.”
Diferentemente do Brasil, os EUA se orgulham da sua condição de superpotência militar. Dizem, com todas as letras, que a missão de suas Forças Armadas é “defender os interesses do país em qualquer parte do mundo”, interesses que são ligados à sobrevivência, à integridade do território, ao bem-estar econômico e à ordem mundial (Pax Americana). Lutam pelo bem-estar e pela manutenção da qualidade de vida da nação, pela gasolina barata etc., e não pela democracia ou manutenção da liberdade em outro país. Levaram a guerra ao Iraque, causando destruição e mortes. Quebraram, em nome de uma mentira (a existência de armas de destruição em massa), o já frágil equilíbrio da região com o enforcamento de Saddam Hussein e a ocupação do país.
Paralelamente no Irã, a partir da década de 80 – com a queda da monarquia até então apoiada pelos EUA –, deu-se o advento da República Islâmica. Aumentou o conflito entre iranianos e norte-americanos. O apoio ao Iraque na guerra contra o Irã (de 1980 a 1988), a perda da produção de petróleo, a invasão da embaixada dos EUA em Teerã (em 1979) e a prisão de norte-americanos por longo tempo (até 1981), o rompimento diplomático, bem como as pesadas sanções econômicas impostas ao Irã – acusado de ser um país perigoso e patrocinador do terrorismo –, geraram enorme animosidade. A agravar, o Irã se tornou desenvolvedor de mísseis e de artefatos nucleares, rompendo acordo anterior e com forças militares atuantes nos conflitos do Oriente Médio, fatos que levaram à situação atual de beligerância, com ataques e mortes de ambos os lados.
Sem sombra de dúvida, esta não é guerra que mereça o nosso apoio para qualquer dos lados envolvidos. Seria afronta ao prescrito na PND e na Constituição, além de porta aberta para que, amanhã, pudessem fazer o mesmo com o Brasil (sem poder nuclear por falta de visão geoestratégica de governantes ineptos) por não sermos capazes, por exemplo, de cuidar da Amazônia, “patrimônio da humanidade”, colocando em risco o ecossistema global e a qualidade de vida da população mundial como, recentemente, tentaram ensaiar.