O mundo contemporâneo foi profundamente impactado pelos avanços, no fim do século XX, da computação eletrônica e do surgimento da internet. A verdadeira revolução introduzida por essas inovações tecnológicas produziu mudanças radicais nas relações financeiras, no comércio, nas comunicações, no entretenimento, nas relações interpessoais e, como não poderia deixar de ser, no funcionamento da democracia e da vida política.
Nesta semana, o tema veio à tona com imensa força no Brasil e no mundo. Grandes empresas, como Coca-Cola, Microsoft, Unilever, Adidas, Ford, Starbucks, HP e outras 160, interromperam sua publicidade nas redes sociais cobrando das plataformas YouTube, Facebook, Twitter e Instagram regras claras para a exclusão de postagens racistas, de promoção da violência e das tristemente famosas fake news.
O presidente da maior potência global, Donald Trump, teve publicação no Twitter marcada como “mídia manipulada” em função da adulteração de um vídeo envolvendo duas crianças, uma branca e outra negra. E recebeu uma condenação geral ao reproduzir um vídeo no qual um casal branco apontava armas contra manifestantes antirracistas, claramente estimulando a violência política e a intolerância. Já o Facebook retirou do ar um anúncio da campanha de Trump que utilizava um símbolo nazista – o triângulo vermelho invertido.
Transparência
No Brasil, tivemos a votação de afogadilho no Senado Federal da polêmica Lei Brasileira de Liberdade, Responsabilidade e Transparência na Internet, de autoria do competente senador Alessandro Vieira (Cidadania-SE) e relatado pelo senador Angelo Coronel (PSD-BA).
As inovações tecnológicas são o motor das grandes mudanças nas economias capitalistas, como estudaram exaustivamente Marx e Schumpeter. Os computadores e a internet revolucionaram a vida humana, e, como toda inovação, não carregam, em si, padrões éticos e morais, podendo servir ao bem ou ao mal.
Na política, o impacto foi profundo. As instituições e os partidos políticos democráticos tradicionais perderam seu papel central de canalização das expectativas, esperanças e inquietações sociais, já que na internet todo mundo fala com todo mundo.
Rede
Esse novo mundo foi abordado pioneiramente pelo sociólogo espanhol Manuel Castells em sua obra seminal “A Sociedade em Rede”, de 1996. Vale a leitura. Recentemente, fiquei profundamente impactado ao assistir na Netflix ao documentário “Privacidade Hackeada”, que desnuda o papel da empresa Cambridge Analytica na invasão não autorizada das informações do Facebook de 87 milhões de usuários, e, por meio do uso de big data e algoritmos, na manipulação da opinião pública na eleição de Donald Trump. A estratégia já tinha sido testada no plebiscito do Brexit.
Qual não foi a surpresa ao descobrir, por meio do livro “Os Engenheiros do Caos”, que o laboratório pioneiro foi a Itália, no nascimento do movimento anarco-populista 5 Estrelas. O que parecia uma rebelião espontânea da base da sociedade italiana e o surgimento de um partido descentralizado, democrático e inovador, foi na verdade uma maquinação científica usando as modernas ferramentas das redes sociais, com uma empresa especializada e manipuladora por trás e o comediante Beppe Grillo como sua face pública, aproveitando o desgaste da chamada “velha política”.
Voltarei ao tema na próxima semana