Em pouco mais de 40 dias de governo, o vice-governador, Mateus Simões (Novo), percorreu dez municípios em cinco grandes regiões de Minas Gerais – Norte, Triângulo, Vale do Rio Doce, Vale do Aço e Alto Paranaíba – em agendas oficiais sem o chefe do Executivo, Romeu Zema (Novo). O movimento é semelhante ao que o próprio Zema fez durante o mandato e garantiu a sua reeleição no ano passado no primeiro turno. A repetição da estratégia utilizada pelo governador tem o objetivo de tornar Simões conhecido e possibilitar sua candidatura ao governo em 2026.
Nas agendas do vice até aqui estão a entrega e a inauguração de obras, lançamento de projetos, entrevistas em jornais e rádios locais e ainda encontro com lideranças políticas e entidades.
Em Uberaba, na última semana, Simões teve recepção de candidato na posse da diretoria da Associação dos Municípios da Microrregião do Vale do Rio Grande. No evento, foi colocado um banner com a imagem do vice e o “nome de urna” que ele quer seja utilizado desde que foi compor a chapa com Zema: “Professor Mateus”. A imagem lembra os eventos de campanha eleitoral. A foto foi postada no Instagram do vice-governador.
Durante o período eleitoral, Simões viajou sozinho a 85 municípios. Há expectativa de que ele retorne a todas essas cidades ainda no primeiro semestre deste ano. Na última sexta-feira, o vice-governador afirmou nas redes sociais que voltar às cidades é “uma questão de respeito” e reforçou que fará o percurso no período.
Nos primeiros seis meses do primeiro mandato de Zema, em 2019, o governador visitou 19 municípios diferentes. No ano passado, no primeiro semestre, o governador foi em outras 39 cidades. Nestes primeiros dias, Zema cumpriu poucas agendas fora da capital. Ele foi a Brumadinho, Nova Lima, Santa Luzia, na região metropolitana, em Sete Lagoas, na região Central e em Divinópolis, no Centro-Oeste do Estado.
As viagens de Simões também chamam a atenção por causa do primeiro mandato de Zema. Na época, o então vice, Paulo Brant, não tinha uma agenda de compromissos e, a partir do momento em que a relação com Zema ficou mais desgastada, Brant foi praticamente escanteado da administração. Em 2019, o então vice-governador ficou delegado às parcerias e atrações de investimento e cumpriu poucas agendas fora de Belo Horizonte. A pandemia, especialmente em 2020 e no primeiro semestre de 2021, freou, praticamente, todas as viagens.
Simões também tomou a dianteira em Brasília, quando participou, sem Zema, da posse do único ministro mineiro de Lula (PT), Alexandre Silveira (PSD). Ele não esteve com o governador na reunião com o governo federal com outros gestores estaduais. Nas últimas semanas, a reportagem tentou contato diversas vezes com Mateus Simões, que não atendeu às ligações, nem às mensagens encaminhadas. O espaço continua aberto.
Perfil ‘não político’
Fontes do governo relataram que não há uma orientação específica para que Simões seja o interlocutor com Planalto, ou tendência de afastar a imagem de Zema do presidente Lula, contudo, o vice angariou o espaço de diálogo para si. O consenso entre pessoas próximas do vice, porém, é de que Simões tem vontade de ter mais capital político para construir uma provável candidatura ao governo do Estado em 2026.
A atuação de Simões como um vice mais participativo tem sido vista como um aumento natural das responsabilidades no Estado. Como vice-governador, há escala e escopo de trabalho e diálogos maiores do que havia como secretário Geral de Governo, cargo que ocupou no primeiro mandato. O perfil inquieto de Simões é outro ponto recorrente das pessoas ouvidas pela reportagem. Ele chegou a ser descrito como “uma máquina”, com pouca aspiração para ser “um vice-governador decorativo”.
“Ele quer aparecer para 2026, quer ser candidato. No fundo, é até bom que Zema se distancie do presidente (Lula), mas o Simões está buscando ir e fazer o que o faça aparecer. Não tem o carisma do Zema, mas quer ocupar esse espaço como candidato nas próximas eleições”, argumentou uma das fontes à reportagem. “Vejo o governador mais focado em Minas Gerais, e o Mateus fazer esse acompanhamento mais institucional, ir para Brasília, para os municípios, é parte de uma divisão de tarefas. Querendo ou não, ele só tinha sido vereador antes de ser secretário Geral e ele tem, pessoalmente, esse desejo de ter capital político. Tem capacidade para isso e vai assumir”, comenta outra pessoa ouvida e que não quis se identificar.
Outra fonte avaliou Simões como “uma pessoa extremamente ambiciosa”, e ressaltou a falta de renovação dos quadros do Novo em Minas e no Brasil nas últimas eleições como uma das razões para que a legenda tente se reorganizar nas figuras fortes que tem. “Há a ideia fixa no partido de que Zema vai concorrer a algum outro cargo em 2026, seja ao Senado ou como candidato à Presidência. Com isso, o nome de Mateus cresce e ele pode ser um candidato com alguma chance de levar o governo do Estado”, defende. A vontade política de Simões fica “evidente”, acrescenta. “Tem pele de gato, olho e gato e mia. Deve ser um gato, não é?”, pontua sobre o significado das viagens e reuniões do vice-governador.
Antes de a chapa formada por Simões e Zema ser eleita, havia argumentação dentro da esfera partidária sobre o perfil “não político” do vice-governador. Para algumas das fontes consultadas, a atuação sobressaída de agora pode ser uma resposta à avaliação. “Uma construção política é resultante de um bom trabalho, mas se não tiver preparado o terreno, a chance de conseguir uma candidatura diminui demais. Tem-se que construir um caminho. Se o Zema vai ser presidente (da República) um dia ou não, vai saber. Porém, Simões tem que se preparar para ter esse capital político (para disputar o Estado)”, opina.
Especialista fala em ‘sucessor natural’
Professor do Ibmec Belo Horizonte e cientista político, Christopher Mendonça avalia que não “é cedo demais” para que Simões comece a projetar uma possível candidatura para 2026 – ao contrário, ele pontua que as próximas eleições começam logo quando a última acaba. “Simões tem características que o Novo tem ressaltado, é professor, foi servidor público, e tem um perfil técnico. Como foi vereador, ele é conhecido em Belo Horizonte e região metropolitana, mas precisa angariar a aceitação que Zema tem no interior de Minas. Não é cedo para começar a construir essa imagem”, argumenta.
Como foi reeleito em 2022, Zema não poderá concorrer ao governo de Minas nas próximas eleições. Simões é visto com um sucessor natural, tanto pela proximidade ideológica com o atual governador, quanto pela afinidade que os dois têm. Mendonça ressalta a gestão tensa que Zema teve entre 2018 e 2022, quando Paulo Brant foi seu vice-governador. Além de ser historicamente ligado ao legado tucano em Minas, Brant chegou a concorrer como candidato em uma chapa de oposição ao governador.
"Simões entrou na política junto com Zema, no mesmo partido, e tem ideais parecidos com o governador, inclusive, uma trajetória parecida. Zema não quer repetir esse quadro de deslocamento na gestão que foi observado com Brant”, acrescenta Mendonça.
O professor acredita ainda que há um movimento de distanciamento da figura de Zema com o governo federal, especialmente na relação com a figura de Lula. “Houve um desgaste entre Lula e Zema durante a campanha, e o vice-governador tem menos rusgas do que o governador. É uma estratégia pensada, certamente, para evitar quaisquer tipos de constrangimentos do ponto de vista político”, pontua.