A boa iniciativa de injetar mais recursos em programas sociais e garantir um alívio para a população em situação de vulnerabilidade virou uma dor de cabeça para o governo. Em razão da péssima articulação política do Executivo, da guerra entre as alas econômicas e políticas e da insistência do presidente da República em garantir para o Auxílio Brasil um valor que não cabe no Orçamento, ao menos no ano eleitoral, o assunto gerou uma confusão que contamina a economia e tira a credibilidade do governo e do país.

É claro que o Auxílio Brasil é importante, principalmente em um cenário em que aumentou no país o número de pessoas em situação de miséria, com uma inflação galopante e com a economia estagnada. Ter um programa social que amplia o Bolsa Família em número de beneficiados e em valor pago às famílias é iniciativa necessária, ainda que não fosse necessário mudar o nome nem as características do programa. Porém, fazer isso sem respeitar os limites e regras de Orçamento aprovadas significa ajudar de um lado e atrapalhar de outro essas populações vulneráveis.

Ao contrariar a equipe econômica e insistir em um valor que ultrapassa o teto de gastos em vigor, o presidente Jair Bolsonaro conseguiu causar distúrbios no mercado, com alta do dólar e queda das ações de empresas na bolsa de valores. Pode parecer algo distante, mas dólar alto e mercado financeiro mais fraco significam inflação mais alta, necessidade de juros mais altos e, consequentemente, enfraquecimento do ritmo de crescimento econômico. Em resumo: dinheiro valendo menos e redução das oportunidades de trabalho. O que era para ajudar, por ser feito na base do jeitinho, atrapalha.

Chamou ainda mais atenção o fato de que, na ideia esdrúxula apresentada pelo governo, o Auxílio Brasil teria uma parcela permanente, dentro do teto, e outra temporária, fora do teto de gastos. Essa parcela só valeria até dezembro de 2022. Ou seja: até que o presidente conseguisse o que mais deseja: sua reeleição. Aí, seja ele o eleito ou outro, o cidadão que sentar na cadeira de presidente da República em 2023 teria que decidir se continuava descumprindo a regra do teto de gastos para manter o valor mais alto ou se devolvia o Auxílio Brasil aos patamares mais baixos para não gastar mais do que arrecada. 

Nada contra que um programa social de grande abrangência dê benefícios eleitorais ao governante. Assim se deu com os governos petistas, por exemplo. Mas esses benefícios devem ser secundários. O programa não pode ser manejado apenas para garantir a vitória nas urnas. Nem mesmo o valor deveria seguir essa lógica. Tal programa social trabalha com a ideia de que há um mínimo necessário de renda para se viver com dignidade. O valor do benefício, portanto, deve ter um cálculo técnico que aponta até qual faixa precisa receber e quanto deve ser injetado para garantir essa dignidade. Depois, deve-se discutir se esse dinheiro cabe no Orçamento. Nunca poderia ser simplesmente um número chutado da cabeça do presidente para que sua preocupação social pareça maior em ano de eleição.