Oficialmente presidente da Câmara dos Deputados, Arthur Lira (PP-AL), tem atuado na prática como o verdadeiro presidente da República nos temas mais complexos e que exigem solução emergencial no país. Enquanto o chefe do Executivo, Jair Bolsonaro (PL) tem intensificado viagens e eventos de campanha, como motociatas e encontros com apoiadores, e atos menores no Palácio do Planalto, tem cabido ao chefe da Câmara fazer as articulações e propor soluções para um dos problemas mais crônicos vivenciados hoje no país: a alta dos preços e, em especial, os reajustes nos combustíveis.
Nos últimos dias, diversas reuniões têm acontecido na residência oficial de Arthur Lira e no gabinete da presidência da Câmara. Nesses espaços, Lira define as pautas, trabalha com seus aliados em propostas para serem votadas no Legislativo, articula suas aprovações junto ao presidente do Senado, Rodrigo Pacheco, e chama ministros para alinhar pontos de programas a serem lançados. Tudo o que, tempos atrás, aconteceria no Palácio do Planalto. Isso sem falar, é claro, do fato de Lira ter controle sobre a liberação de emendas, por meio do aprisionamento do Orçamento por parte do Legislativo.
As presenças frequentes de ministros e de Pacheco na residência de Lira indicam que não se trata apenas de mera articulação para a votação de projetos na Câmara, mas de construção de planos de governo e articulação política plena. Como o presidente do Senado e do Congresso tem sido um anteparo a certos arroubos, sobretudo para defender Estados e municípios e a boa relação com o Judiciário, Lira precisa fazer um alinhamento com ele que, em condições normais, seria missão do chefe do Poder Executivo.
Assim se deu no episódio da mudança do ICMS dos combustíveis e da energia. A construção da ideia e a articulação para a aprovação foi toda conduzida por Lira. O Palácio do Planalto só assistiu, resistindo a certas mudanças e apoiando outras. Bolsonaro, inclusive, demonstrou posições dúbias sobre o texto apresentado e que aguarda sanção presidencial. Defendeu a limitação do ICMS, mas sem compensação aos Estados.
Agora, a condução dos trabalhos por Lira fica tão evidente que até mesmo o indicado por Bolsonaro para a Presidência da Petrobras foi nesta terça-feira (21) recorrer a Lira. Ele visitou o deputado para pedir que ele intercedesse para agilizar sua aprovação e escolha para comandar a estatal.
Da mesma forma, a CPI do Preço dos Combustíveis, anunciada por Bolsonaro, é tratada por Lira, responsável inclusive por anunciar publicamente que o partido do presidente, o PL, havia começado a recolher as assinaturas para tal.
Outras medidas construídas por ele e seu grupo, como mudança na taxação de lucros do setor, a criação de auxílios mesmo vedados em ano eleitoral e até mesmo uma eventual mudança na Lei das Estatais, tudo é tratado na residência oficial de Lira, que pode não ser o imperador do Japão, como disse o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), mas parece acumular cada vez mais as funções de chefe do Legislativo e do Executivo. Em outubro, porém, ele precisará apenas de uma votação de deputado em Alagoas para continuar nessa função. Bem mais fácil que a tarefa de Bolsonaro, que ficou com os discursos, as questões ideológicas e a representação pública do governo.