Uma das equipes mais tradicionais do futebol paulista, o Juventus da Mooca está a um passo de se tornar oficialmente uma SAF, ao mesmo tempo em que enfrenta um cenário político conturbado.

Na noite desta terça-feira (17), o Conselho de Administração aprovou, por maioria, a proposta única de SAF, apresentada pela REAG Investimentos e Contea Capital. Foram 70 votos a favor e apenas 18 contra, de um total de 88 conselheiros que votaram.

O clube ainda vai marcar a votação da última instância, de associados, que dão a palavra final nas urnas.

O pleito aconteceu sob alguns protestos do lado de fora dos portões. A reportagem encontrou com um grupo de 15 torcedores, que se manifestaram contra a votação, com gritos e xingamentos, mas pediram para não serem filmados.

As reclamações se devem a um imbróglio técnico que levantou suspeitas sobre a lisura do processo de escolha da SAF. No último sábado (14), duas ofertas também estavam na mesa do clube, uma do grupo AlmaViva e outra da empresa Total Player, que pertence ao ex-jogador Jamelli. As duas chegaram a apresentar uma ideia de fusão na segunda-feira (16).

O Conselho descartou as propostas concorrentes da Contea REAG alegando que a data limite para inscrições não foi respeitada, além de ressaltarem a falta de apresentação dos projetos.

O edital previa o registro de novos planos até 30 de abril, prazo não cumprido por AlmaViva e apenas individualmente pela Total Player. Após a fusão, as empresas não realizaram suas apresentações em auditório para conselheiros e associados.

"Primeiramente, foi uma falta de consideração, respeito ao Clube Atlético Juventus, uma vez que tinham conselheiros e associados esperando a reunião, subiram lá, fizeram uma nota de manifestação. Na oportunidade, eu, inclusive, perguntei se eles estavam juntando as propostas, fazendo uma aglutinação. Disseram que não, que iriam se manifestar. Eles declinaram de apresentar. Então, a única proposta que foi apresentada foi a da Contea REAG. Foi a que permaneceu, que nós trouxemos para a votação e, de uma forma expressiva, votamos e foi aprovada, vinculada à instituição da Sociedade Anônima do Futebol", disse Carlos Eduardo Gomes Pedroso, presidente do Conselho, em coletiva de imprensa.

A parceria REAG Contea prevê investimento de R$ 480 milhões, cerca R$ 20 milhões a menos do que a proposta descartada. Para Jamelli, que se formou nas categorias de base do Juventus e carrega uma relação pessoal com o clube, esse é o principal ponto de insatisfação.

"Em momento algum a gente falou que ia tirar a proposta, em momento algum a gente fez alguma coisa fora do rito de apresentação, dos prazos, do protocolo, etc. A gente já não concordava desde o começo com esse rito, de fazer uma reunião no dia 14 e no dia 17 já aprovar a SAF com proposta. Faltou transparência. Estamos falando de R$ 20 milhões a mais para o clube. Não pode deixar uma coisa assim passar batido, você está tendo uma oportunidade de melhorar a proposta para o clube", afirmou Jamelli.

OPOSIÇÃO PODE LEVAR SAF À JUSTIÇA

Membros de oposição à atual gestão sinalizaram que vão levar o assunto da SAF à Justiça. Desde a reeleição do presidente juventino, Dilson Tadeu dos Santos Deradeli, as discordâncias com o modelo de administração ganharam força.

Eloisa Machado, advogada e conselheira do Juventus há quatro anos, ingressou com processo apontando abusos da diretoria. Ela foi suspensa na noite da última sexta-feira (13) por uma sindicância interna. O aviso da punição de 20 dias chegou por email, horas antes da reunião para apresentar as propostas da SAF.

Além do processo de SAF, considerado irregular pela conselheira, ela aponta outros dois atos temerários da gestão: omissão em dar efeitos legais à reprovação de contas pelo Conselho e negativa de acesso a documentos aos conselheiros sobre tratativas que podem gerar impacto ao patrimônio do clube.

"Sou contra a SAF, mas sei que sou minoria e estaria vencida em algum momento, sem problemas. O que está acontecendo agora é muito mais grave, um abuso seguido do outro, nenhuma garantia, um processo sem transparência e com atropelo dos conselheiros, que representam associados. É gravíssimo. O debate agora não é sobre SAF ou não, é sobre integridade, sobre gestão democrática, sobre moralidade. O Juventus é um patrimônio da Mooca e da cidade de São Paulo. Merece que trabalhemos por sua preservação", afirmou Eloisa Machado.

A reportagem apurou que outros oito conselheiros de oposição a Dilson também foram suspensos por 20 dias por sindicâncias. As punições têm razões diversas, desde quebra de decoro até tentativa de agressão.

A reportagem também conversou com um grupo de sócios, que teme represálias por ser oposição e citou uma "caça às bruxas" interna. Em depoimentos, contados sob anonimato, cerca de sete associados afirmaram que há perseguição a quem se posiciona de forma contrária à diretoria.

"O nosso estatuto prevalece a soberania do plenário. A partir do momento que passa pelo crivo do plenário, ele sobrepõe e supera qualquer coisa que eles tenham desconfiado de algo. Então, é o seguinte, é meramente político", declarou Gomes Pedroso. (Lívia Camillo)