Volta por cima

Após cirurgia, Bruna Honório garante: 'hoje sou uma pessoa mais forte'

Jogadora do Itambé-Minas deixa tumor no coração para trás, comemora recuperação e garante que está pronta para voltar com tudo dentro de quadra

Por Daniel Ottoni
Publicado em 21 de julho de 2019 | 07:30
 
 
 
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Muito mais do que a ausência de Tandara na seleção, o bom rendimento da oposta Bruna Honório, do Itambé-Minas, na última temporada, abriu para ela uma oportunidade de ouro dentro da seleção brasileira. A vaga como titular estava próxima, mas o diagnóstico de um tumor no coração, logo nos primeiros exames no CT de Saquarema (RJ), tirou seu chão e a fez adiar uma chance que ela não sabe agora quando vai acontecer novamente. 

Com a certeza de que tudo na vida tem um propósito, ela se manteve firme e tranquila para encarar os percalços de frente: primeiro a cirugia, depois a recuperação. A jogadora já treina normalmente com o elenco (acompanhada de muito perto pelo departamento médico do clube) e, aliviada, garante que sua condição é boa. "Nem parece que passei por tudo isso", brinca. Na entrevista abaixo, ela fala sobre todo o processo enfrentado e como tem lidado com uma rotina sob cuidado especial da parte médica do Minas. 

O que passou pela sua cabeça no primeiro momento? Quando me deram a notícia do corte, pensei: 'cheguei até aqui com o Minas, conquistei campeonatos até chegar seleção, recebo chance de ouro e vou ter que deixar isso de lado'. Desacelerar por algum tempo foi necessário. A seleção seria uma oportunidade muito boa, mas não tinha o que fazer. Era um caso de saúde, com necessidade cirúrgica e percebi que precisava realmente diminuir o ritmo. 

Existiu receio de não voltar a jogar? Nunca tive esse receio porque, desde a primeira conversa com a comissão e com os médicos, eles me explicaram muito bem o que era, do que se tratava, como seria o procedimento, me deixando muito tranquila. Falaram comigo que, quando o tumor fosse retirado, eu poderia voltar a ter uma vida normal. Isso me ajudou a não ter nenhum tipo de medo sobre retornar a jogar. 

O que fez a diferença pra você ficar mais tranquila? Já sou uma pessoa tranquila por natureza, dentro e fora de quadra. Esse é o meu jeito. Mas as conversas com os médicos me fizeram ficar ainda mais segura, sabia que estava nas mãos de uma referência neste tipo de procedimento dentro do Brasil. Desde o primeiro contato, tudo foi passado com muitos detalhes. A presença da minha família, amigos e fãs por perto também me ajudou muito. Todos me deram um carinho que eu nem imaginava que tinha. CBV e clubes, não só o Minas, mandaram mensagens e me ligaram. Toda essa energia positiva me fortaleceu muito. 

Quais são os processos da recuperação? Eu fiz três semanas de trabalho cardiovascular, exercícios mais ponderados, com peso baixo, para minha frequência cardíaca não subir. Tudo foi monitorado. Fiz caminhadas, que foram aumentando de ritmo aos poucos. Até completar um mês, ainda era preciso saber se tudo estava sob controle. Fiz os exames depois de um mês e os resultados foram ótimos, mostrando que eu estava em uma excelente condição. Agora voltei a fazer trabalhos específicos do vôlei, com academia, focando em ganhar peso, tudo monitorado, já que a cirurgia ainda é recente. Já estou fazendo trabalhos que tenho o costume de fazer durante uma temporada. Os planos de recuperação estão rápidos e fico feliz de  já estar treinando normalmente com minhas companheiras. 

Passou pela sua cabeça que o incidente foi um propósito de Deus e que uma recompensa ainda maior virá no futuro (ex: convocação pra Olimpíada)? Eu sou uma pessoa que tem muita fé. Isso me ajudou a estar preparada para este momento. Desde o começo, eu senti que Deus estava comigo e que Ele me daria muita força para sustentar esse período. Tudo que acontece comigo tem as mãos de Deus. Tenho certeza que Ele tem algo maior pra mim, dentro ou fora do vôlei, um propósito de vida que me deixa muito tranquila. Se, pra Ele, for uma Olimpíada, estamos aí. Eu trabalho pra isso, busco esse objetivo. Acho que tive uma mão divina. Ele sabe de todas as coisas, está cuidando do meu caminho, assim como cuidou da minha cirurgia e da recuperação. O que for pra ser melhor, vai aparecer no meu caminho. 

Você ficou pensando em algo como 'porque isso está acontecendo comigo? Em todos os momentos, eu procurei ficar calma e não fazer este tipo de pergunta. Preferi trabalhar na minha cabeça que era algo para acontecer e que tudo daria certo. Confiei que tudo passaria rapidamente, eu tinha certeza que teria a força de Deus comigo e não fiz questionamentos. Tentei não me vitimizar, era algo que não ia ajudar em nada. 

Os médicos chegaram a falar os motivos deste problema ter acontecido? Não falaram nada sobre isso. É algo que não tem um motivo específico. Ninguém na minha família teve um problema parecido. O que eles me falaram era que tratava-se de um tumor raro e que, geralmente, acontece em mulheres entre 25 e 35 anos. Em homens, é mais raro ainda. Não tinha um motivo definido mas também era algo fácil de ser tratado. Bastava fazer a cirurgia para retirar e começar a ter uma vida normal novamente.
 
Qual tinha sido a lesão mais importante que você havia sofrido? Quanto tempo ficou parada? Nunca tive lesão mais séria, que tenha me afastado das quadras por mais tempo. O máximo que tive foi uma ruptura parcial da face, que me deixou alguns dias afastada. Não foi tão grave porque estava de folga, então acabou não me deixando fora de treinos e jogos oficiais. 

Chegou a procurar alguém que tinha passado por situação parecida para saber como havia sido todo o processo? Não procurei ninguém nem fiz pesquisa na internet. Tudo foi tão rápido, eu não queria perder tempo enchendo minha cabeça com coisas que poderiam nem acontecer, tanto em relação ao procedimento como sobre o pós-cirúrgico. Poderia aparecer alguma coisa como uma cirurgia que deu errado ou algo do tipo. Não seria fácil de achar uma pessoa que tivesse passado por isso, já que não é uma cirurgia comum. O que recebi foi uma mensagem de uma fã, falando que tinha feito uma intervenção igual. Ela me contou que já estava recuperada e que tudo tinha dado certo. Fiz questão de responder e agradecer pelo carinho e apoio. 

Tem se sentido bem nos exames, testes e treinos feitos até aqui? Tenho me sentido muito bem! Não tive nenhuma alteração ou reação durante ou depois da cirurgia. Fiz exames após um mês, deu tudo perfeito, assim como nos treinos. Sinto-me 100%, só falta o contato com a bola. Minha parte física está 100%. 

Acha que nada, na vida de uma jogadora profissional, se compara a uma experiência como esta, quando se é obrigado a interromper a rotina por um problema mais sério? Nunca passei por nada parecido, como lesão ou algo que me afastasse. Por isso, fica até difícil comparar. Mesmo com o sucesso da cirurgia, não deixa de ser algo importante, já que trata-se de um tumor no coração. Era algo que poderia nem ser descoberto e virar algo pior. Muita coisa poderia passar na minha cabeça, ficar imaginando o pior, como o fim da carreira. Para um atleta, qualquer tipo de situação que o afaste das quadras é complicado. No meu caso, foi algo mais delicado, até por eu estar na minha melhora fase, me obrigando a interromper os sonhos que tinha naquele momento. 

O que essa experiência trouxe de aprendizado na sua vida pessoal e profissional? A gente nunca espera que algo parecido apareça. Tem coisas que acontecem para mostrar que somos e precisamos ser fortes, para nos ensinar que vamos enfrentar situações que não desejamos. Quando isso acontece, nos faz parar para pensar no contexto inteiro. Hoje sou diferente, uma pessoa mais forte. Passar por isso nos dá uma coragem para superar e voltar melhor. Minha cabeça está diferente. Isso me mostrou que eu amo o vôlei, mas que existem outras coisas que é preciso dar valor como ter amigos e formar uma família, que mudam a nossa cabeça.

Quem é a atleta em que você sempre se inspirou e teve como exemplo? Comecei a jogar vôlei com uma idade mais avançada, então não conhecia muita gente quando entre neste mundo. Minhas referências acabaram sendo pessoas que eu convivia, que chamaram minha atenção pelo caráter. A Fofão, a Natália e a Gabi foram pessoas excelentes que passaram no meu caminho, jogadoras que buscaram seu espaço e são grandes talentos do vôlei brasileiro.

O que dizer sobre a presença da Sheilla no time, uma jogadora referência na sua posição e muito experiente? Tenho certeza que vou aprender muito com a Sheilla, vou tentar aproveitar ao máximo o tempo que estiver ao lado dela. Ela é uma referência na posição, uma jogadora experiente. Mesmo parada há algum tempo, tem muito a evoluir junto com o grupo. Vou tentar sugar tudo que puder, assim como eu já fazia com outras jogadoras como Gabi, Carol e Natália. Será importante pra eu pegar mais bagagem e acho que será um grande ano pro Minas. 

 

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