Um imprevisto, que poderia ter sido resolvido com bom senso e humanidade, se transformou em um episódio lamentável para o Jf Vôlei, que disputa a Superliga B de vôlei masculino. No dia anterior à partida contra o Instituto Cuca, em Fortaleza, no último dia 5, equipe mineira se deparou com vários atletas com quadro de vômito, diárreia, mal estar e dores abdominais.
A viagem começou às 3h da manhã e terminou às 13h de sexta-feira, um dia antes da partida, com atletas apresentando problemas médicos em diferentes momentos, desde a manhã de sábado até após a partida. A situação mostrou-se mais complicada durante o treino da manhã de sábado, que não aconteceu da maneira prevista.
A situação perdurou até momentos antes do confronto, com os acontecimentos seguintes indo na direção contrária das diretrizes do fair play. Vendo que estaria bastante desfalcado de seis dos seus 12 atletas, o JF pediu ao time da casa o adiamento da partida, mesmo sabendo que seria prejudicado financeiramente, uma vez que precisaria ficar na cidade por, pelo menos, mais uma noite, precisando arcar com mais uma diária de hospedagem de toda sua delegação, além de alimentação e outros custos.
A surpresa foi grande quando o time cearense se recusou a aceitar a mudança de data, forçando a realização da partida. O que se viu na sequência foi um JF em quadra sem as devidas condições, com atletas chegando a deixar o tratamento, dentro da ambulância do ginásio, para entrar em quadra para tentar ajudar o clube de alguma forma.
"O que se viu foi de envergonhar o esporte voleibol, com o time aquecendo às pressas a apenas 10 minutos da partida, equipe sem centrais a maior parte do tempo, jogadores saindo da ambulância para a quadra, entre outros acontecimentos lamentáveis. O resultado final foi o que menos importou. Quem perdeu foi o voleibol. Foi o exemplo que deixou de ser dado para milhares de jovens que vêem no vôlei um caminho de inclusão e justiça social. Essa é a razão do nosso projeto. Mas parece que não é bem assim em outros tantos que se dizem sociais por aí. A mensagem de ganhar a qualquer custo foi a que ficou", divulgou o JF em nota.
Após a publicação da nota, a presidente do Instituto Cucam Kilvia Cristina Teixeira, fez uma live no Instagram, que foi apagada posteriormente. Na sua fala, a dirigente lembrou de situação recente com seu time, quando foi jogar em Suzano, passando por situação parecida quando três atletas de sua equipe estavam doantes.
Devido à condição financeira, o clube do Ceará optou por não solicitar o adiamento da partida, usando deste argumento para justificar o incidente diante do JF. A presidente ainda chegou a indicar preconceito contra nordestinos, informando que tal situação não aconteceria se fosse diante de um time das regiões Sul ou Sudeste. A reportagem fez contato com o supervisor do time nordestino, sem ter retorno.
Virose da mosca
Relatório da médica responsável pelos atendimentos comprova o quadro clínico comprometido dos atletas juiz-foranos, chegando a cogitar 'virose da mosca' como possível motivo. A orientação para recuperação dos afetados foi de repouso e hidratação. O time chegou a ficar em líbero, com atletas mal conseguindo ficar em pé.
"Em mais de 20 anos de vôlei e 14 de JF, este foi o dia mais triste de minha vida esportiva. O resultado foi o que menos interessava, o que mais doeu foi o descaso e cinismo da Confederação Brasileira de Vôlei, que duvidou da nossa situação. Foi um grande descaso também dos membros do Instituto Cuca, que tínhamos, até então, uma grande admiração pelo trabalho social forte que vem crescendo e possui boa estrutura. Mas as atitudes de todos os membros, desde jogadores até supervisor, foi decepcionante. Ninguém procurou saber o que estava acontecendo, nem buscou alguma ação para nos ajudar", conta o diretor Maurício Bara. O dirigente fez contato com a CBV sem receber o respaldo que esperava.
O JF emitiu nota de repúdio, lamentando toda a situação e descrevendo o ocorrido, enviando o documento para a CBV, e ainda sem ter retorno. A reportagem fez contato com a entidade que rege o vôlei brasileiro, também sem ter qualquer resposta.
"Foi um dia triste, que ficou marcado na nossa história como um dia de luta e muita honra. O atendimento da médica Ana Carolina Duarte foi brilhante, me fez lembrar do meu pai. Achei que era veterano o suficiente pra ter visto tudo no vôlei competitivo, mas foi algo novo em minha carreira. Tenho certeza que se fosse a situação contrária, adiaríamos o jogo imediatamente. A pior coisa que poderia acontecer pro nosso time era adiar o jogo e ter custos com uma maior permanência em Fortaleza, mas era algo inevitável. Já recebemos mais de 130 jogos de alto nível entre Campeonato Mineiro, Superliga A e B e nunca recebemos uma única reclamação de um adversário. O mínimo que teríamos seria empatia, consideração e fair play", relata Bara, que chegou às lágrimas em áudio enviado para a imprensa.
No final, a derrota do JF era algo esperado, com o jogo quase indo para o tie-break, mantendo o time da Zona da Mata com séria ameaça de ser rebaixado para a Superliga C. O Instituto Cuca ocupa a quinta colocação, ainda brigando pelo G-4, grupo do que que se classifica para as semifinais. Os dois melhores do torneio sobem para a elite na próxima temporada.
Faltando dois jogos para o fim da fase de classificação da Superliga B, o JF ocupa a lanterna, estando muito perto do rebaixamento. Na última temporada, o time foi campeão da segunda divisão, não podendo participar da elite por dificuldades financeiras.