Atletas da Confederação Brasileira de Desportos de Surdos (CBDS), entre eles um mineiro, foram surpreendidos com a possibilidade de não poderem mais disputar as Olimpíadas de Tóquio, previstas para o próximo mês de novembro. É que o grupo pode ter sido vítima de um golpe da agência em que compraram passagens aéreas. Na semana passada, os competidores descobriram que a empresa, com sede em Cabro Frio, no Rio de Janeiro, foi fechada em uma ação conjunta do Procon-RJ, Polícia Civil e Ministério Público. Segundo as autoridades fluminenses, a agência é investigada por vários golpes praticados contra outros clientes. A empresa nega o crime.
Até a publicação desta reportagem, a confederação havia identificado 22 atletas lesados pela agência de turismo. “O prejuízo estimado até o momento é de cerca de R$ 160 mil. A confederação continua apurando e investigando se tem mais atletas prejudicados”, explicou Giselle Nascimento, assessora da presidência e de projetos da CBDS. Ainda segundo confederação, cerca de cinco atletas fizeram o pagamento por Pix à agência e o restante por cartão de crédito.
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Jogador de vôlei da seleção masculina de surdos, Gabriel Diniz, de 33 anos, que é de Belo Horizonte, disse que a confederação da qual os atletas fazem parte não arca com todos os custos da viagem e que os competidores se juntaram para comprar de uma mesma agência as passagens de ida e volta ao Japão. "Cada um pagou da maneira como preferiu. Uns foram por Pix, outros por cartão de crédito ou débito e, no meu caso, o meu cunhado pagou pra mim no cartão dele", disse Gabriel em entrevista ao Super Notícia.
Lucas Bonalume Vieira, de 37 anos, capitão da seleção brasileira de vôlei é morador de Novo Hamburgo no Rio Grande do Sul. Ele contou ter pagado com cartão de crédito a passagem e que descobriu por acaso que corre o risco de não conseguir mais viajar. "Fui conferir o código do voo, e a empresa aérea responsável disse que ele simplesmente não existia mais, ou seja, a agência chegou a fazer uma reserva e parece que quando recebeu o dinheiro, cancelou a passagem", afirmou em tom de indignação.
Atletas da Confederação Brasileira de Desportos de Surdos (CBDS) sofreram um duro golpe nos últimos dias de julho. Eles foram pego de surpresa após uma agência de Turismo de Cabo Frio no Rio de Janeiro ser fechada pela Polícia Civil. Os atletas iriam em novembro para Tóquio no… pic.twitter.com/6dzsX0nTgN
— O Tempo (@otempo) July 28, 2025Os dois atletas fizeram boletim de ocorrência nas delegacias das cidades onde moram. Lucas tentou junto à empresa de cartão de crédito o cancelamento da compra. Já Gabriel pediu reembolso ao banco por onde o cunhado dele fez o pagamento.
A incerteza de não participar das Olimpíadas tem deixado o atleta mineiro sem dormir: “É um sonho poder representar o Brasil em uma Olimpíada. A gente faz por amor, dá do nosso dinheiro para poder viajar e jogar. É muito triste uma situação dessas", disse emocionado Gabriel. "Espero que isso se resolva, queremos muito viajar e participar dessas Olimpíadas. É uma sensação de impotência que não sei como descrever.", concluiu Lucas.
Sem dinheiro
Com sede em Belo Horizonte, a CBDS informou ao Super Notícia que tomou conhecimento do caso na quinta-feira (24/7). Segundo Giselle Nascimento, a confederação não tem verba suficiente para arcar com todos os custos de viagens dos atletas confederados. A entidade custeia geralmente a hospedagem e o café da manhã. As outras refeições, a passagem e outras taxas pagas ao Comitê Internacional de Esportes para Surdos (ICSD) têm que ser arcadas pelo competidores.
Ainda conforme Giselle, a CBDS é uma instituição sem fins lucrativos e que vive de doações e emendas parlamentares. “Nesse momento difícil, estamos em contato com nosso suporte jurídico, e fizemos um formulário para entender sobre esse contratempo que eles tiveram. Vamos dar todo apoio que eles precisarem, mas infelizmente não temos verba suficiente para ajudá-los a comprar as passagens para as Olimpíadas no Japão”, concluiu.
Entenda o caso
A agência de turismo, sediada em Cabo Frio, foi interditada na terça-feira (22/7) após o Procon-RJ receber várias reclamações de clientes. A maioria pagou pelos pacotes de viagem, mas não recebeu o que havia sido contratado. De acordo com o órgão, a empresa está proibida de atuar e de manter perfis ativos nas redes sociais.
Ainda conforme o Procon-RJ, o caso está sendo investigado desde maio deste ano, quando aconteceu a abertura do processo administrativo. Os relatos de vítimas apontam que, mesmo com o pagamento realizado, os serviços não foram prestados e nenhum cliente foi ressarcido até o momento da publicação dessa reportagem.
Segundo o Procon-RJ, a agência operava exclusivamente pelo Instagram. A equipe do órgão tentou localizar a sede física através do endereço de cadastrado, mas não achou a empresa. São pelo menos 50 clientes de várias cidades que se sentiram lesados pela agência, afirmou.
Além da interdição emitida, a Secretaria de Turismo de Cabo Frio protocolou junto ao Ministério do Turismo um requerimento de suspensão da empresa no Cadastur. A Secretaria de Fazenda também foi acionada, mas não localizou o alvará de funcionamento ativo da agência.
Em entrevista ao Super Notícia, a coordenadora-geral do Procon-RJ, Mônica Bonioli, afirmou que o órgão está acompanhando a situação e está à disposição das vítimas para receber mais denúncias. "Estamos atentos a esse caso há algum tempo, que também tramita junto à Polícia Civil por suspeita de prática de crimes, inclusive estelionato. Estaremos contribuindo com as autoridades para o ressarcimento às vítimas.", explicou.
Denúncias
As denúncias ao Procon Cabo Frio podem ser encaminhadas de segunda a sexta-feira, das 8h às 17h, na Rua Nicola Aslan, 235, no Braga (antiga sede da Prefeitura) e no Shopping UnaPark, bloco B, sala 4, em Unamar-Tamoios. O atendimento pode ser agendado pelo WhatsApp (22) 99907-2128.
Defesa
Procurada pelo Super Notícia, a agência negou por e-mail ter dado golpe em clientes e diz estar sendo vítima de perseguição. Segundo o texto, advogados da empresa já estão tratando do caso.
"Muitas pessoas que compraram conosco já contestaram os valores no cartão e já foram até reembolsadas. Gostaria de reforçar o nosso compromisso com a transparência. E que por perseguição de 4 pessoas, muitas foram prejudicadas e que o Procon não tem poder de impedir uma pessoa física de trabalhar o que demonstra que muitas coisas nesse caso estão sendo tratados com muita irresponsabilidade", informou.
Conforme o e-mail, a proprietária da agência teria, inclusive, sido ameaçada de morte. "Estou passando por dias difíceis por tudo isso", afirmou.
A empresa ainda pediu desculpas a todos os clientes. "Reiteramos que possuímos um canal oficial para reclamações que é o Whatsapp: (22) 992736430 ou email: contato@eurekatur.com.br", disse o texto.
Os Jogos
As próximas Surdolimpíadas de Verão, também conhecida como Olimpíadas para Surdos, serão realizadas em Tóquio no Japão, de 15 a 26 de novembro de 2025. Esta será a primeira vez que o país oriental sediará a competição, marcando o centenário do evento, que teve sua primeira edição em 1924.
As Surdolimpíadas são um evento multiesportivo internacional para atletas surdos, organizado pelo Comitê Internacional de Esportes para Surdos (ICSD). Os atletas devem ter uma perda auditiva mínima de 55 dB no ouvido melhor, sem aparelhos auditivos ou implantes cocleares, e devem ser registrados na Federação Nacional de Esportes para Surdos de seus países.