Era 16 de julho de 1950, por volta das 17h. Em Bauru, São Paulo, Dodinho, ex-jogador do Vasco, de São Lourenço (MG), não escondia os prantos ao ouvir do rádio a notícia de que o Uruguai emudeceu o Maracanã ao aplicar 2 a 1 sobre o Brasil, ficando com o título daquele Mundial. Ao ver seu pai desolado, o jovem Edson Arantes do Nascimento, então com 9 anos, chegou perto dele e disse. “Não chore, papai. Eu vou ganhar uma Copa do Mundo para você”. Foram precisos apenas oito anos para a promessa ser cumprida.
Desde cedo, o jovem Edson teve uma relação de fascínio com a bola. Apaixonado pelas jogadas do pai, que jogava nos campos de terra de São Lourenço, foi para o gol graças ao goleiro “Bilé”, do Vasco local. Após mudarem para Bauru, continuou gritando seu nome incessantemente. Como ninguém entendia quem era aquele “Bilé”, passaram a chamá-lo de “Pelé”. Dali em diante, é história.
Aos 15 anos, foi para o Santos através do olheiro Waldemar de Brito. Aos 16, já era profissional e artilheiro do Paulista, o que o levou à seleção brasileira ainda em 1957. Suas boas atuações na Copa Roca, contra a Argentina, encantaram o técnico canarinho Vicente Feola, que decidiu levá-lo para o Mundial da Suécia, no ano seguinte. Antes, porém, precisou comprar briga com o psicólogo João Carvalhaes, que não queria aquele garoto do Santos na convocatória por ele ser “imaturo demais”. “Você pode estar certo, mas não sabe nada de futebol e eu vi o Pelé jogando”, esbravejou Feola.
Ele tinha razão. Na Suécia, Pelé estreou contra a URSS, após Didi e Nilton Santos implorarem para que ele e Garrincha assumissem as vagas de Joel e Mazzola, respectivamente. No seu cartão de visitas, foi um dos protagonistas dos “três minutos mais fantásticos do futebol”, como descreveu o jornalista Gabriel Hanot, idealizador da Copa dos Campeões Europeus, ao ver o massacre brasileiro sobre os soviéticos no início daquela partida.
Nas quartas, foi autor de um dos gols mais emblemáticos da história do torneio, ao dar um desconsertante drible em um zagueiro do País de Gales e anotar o único tento do duelo. Nas semifinais, um “hat-trick” contra a França, assombrando o planeta com sua capacidade rematadora.
Na decisão contra os donos da casa, ao contrário do que se pensava, aquele jovem de 17 anos não se intimidou. Aos 10 min do segundo tempo, quando o placar apontava 2 a 1, anotou um de seus gols antológicos ao chapelar o defensor e chutar de primeira. De cabeça, ele ainda fecharia o marcador da partida em 5 a 2, antes de cair nos prantos após o apito final. Zagueiro da Suécia, Sigge Parling certa vez afirmou. “Depois do quinto gol, até eu tive vontade de aplaudi-lo”, confessou.
Em 1962, já consagrado como o “Rei do Futebol” por suas atuações emblemáticas com a camisa canarinho e do Santos, viu de fora de campo a seleção brasileira ser bicampeã mundial, uma vez que se machucou conta a Tchecoslováquia, ainda na segunda rodada. Garrincha, com quem formou a dupla mais notável da história, assumiu seu protagonismo. Quatro anos depois, em solo inglês, nova desilusão, uma vez que foi caçado em campo, principalmente no duelo contra Portugal. Pelé não sabia, mas seu apogeu ainda estava por vir.
No México, em 1970, Pelé, que já havia ultrapassado no ano anterior a marca de mil gols anotados, entrou para o imaginário coletivo não apenas pelas vezes que a bola entrou na rede, mas, também, quando ela teimou em não balançar o barbante. Na estreia, contra a Tchecoslováquia, deu um chute do meio-campo, mas a pelota passou raspando a trave do goleiro Victor.
Contra a fortíssima Inglaterra, no jogo seguinte, Gordon Banks fez uma defesa surreal ao impedir uma testada firme de Pelé. Felizmente, na etapa final, o Rei aproveitou grande jogada de Tostão para deixar Jairzinho livre para conseguir vencer o lendário arqueiro britânico. Contra o Uruguai, nas semifinais, o camisa 10 recebeu lançamento em profundidade e driblou Mazurkiewicz sem encostar na bola. Desequilibrado, chutou rumo ao gol, mas os deuses do futebol voltaram a desapontar todos colocando a pelota rente à trave.
Na decisão, a maior atuação coletiva que o planeta já viu. A forte Itália, então bicampeã mundial, assim como o Brasil, não viu a cor da bola naquela partida. Mais que o impressionante gol de cabeça que abriu o placar, quando subiu mais de um metro de altura para testar firme, Pelé teve uma atuação que beirou à perfeição. Atônito, Tarcisio Burgnich o reverenciou. “Antes do jogo, disse a mim mesmo que ele era feito de carne e osso como qualquer um. Mas eu estava enganado”. O futebol chegava ao seu ápice, assim como seu Rei.
Foi a última vez que uma Copa do Mundo teve Pelé em suas páginas. O Rei é o único a conquistá-la por três vezes. Não se sabe se teria levantado em 1974, quando ainda tinha 33 anos e foi alvo de um intenso clamor popular. A única certeza é que nada mais foi como antes.