Moscou. Antes de a bola rolar na tarde deste domingo (1), no estádio Luzhniki, os russos ergueram um bandeirão para motivar seus atletas no duríssimo duelo com a Espanha. “Vocês nasceram para fazerem contos de fada virarem realidade”. E que frase bendita! Na terra onde Lev Yashin é rei, outro goleiro, Igor Akinfeev, galgou seu espaço na galeria de heróis nacionais.
O capitão, que de forma firme segurou a igualdade por 1 a 1 no tempo normal e na prorrogação, surgiu também no drama dos pênaltis. Um muro. Um verdadeiro Kremlin. A fortaleza que impediu a Espanha, a potência futebolística, de seguir adiante. Foram duas defesas, a última com a ponta da chuteira, um pézinho esquerdo salvador. O 4 a 3 nos pênaltis que faz a Rússia avançar às quartas de final. Os anfitriões seguem fazendo história. E a bola, não foge à regra, puniu o jogo estéril e pouco criativo da Espanha. Mais uma campeã mundial dá adeus.
Como sempre, a cadência de bola espanhola foi a dinâmica do primeiro tempo. Um jogo tedioso, convenhamos. A Espanha achou um gol aos 11 min. Um enrosco na área entre Sérgio Ramos e Ignashevich, e o gol contra vencendo Akinfeev. A Fúria entrou então no modo “marolinha”, controlando a posse de bola com quase 77% de domínio. Passe pra lá, passe pra cá, mas nada que realmente fosse efetivo e muito menos capaz de prender a atenção do torcedor. Nenhum mísero chute a gol.
Lance crucial. A Rússia esbarrava nas suas limitações habituais. Mas, aos poucos, foi gostando da partida. Golovin chutou colocado, assustando De Gea. Depois foi a vez de Piqué cometer o lance crucial. Na cabeçada de Dzyuba, o defensor ergueu o braço. O árbitro holandês Bjorn Kuipers, após alguns segundos de tensão, marcou a infração. Pênalti que o próprio Dzyuba converteu. O primeiro gol da Rússia em um mata-mata de Copa desde a ex-URSS.
Festa no estádio Luzhniki, e um banho de água fria nos espanhóis, que, na segunda etapa, buscaram ser mais incisivos, investindo principalmente nas bolas alçadas à área. A “chuveirada” a que estamos acostumados a ver no melhor estilo Campeonato Brasileiro. Tudo na espera que Sérgio Ramos, mestre no fundamento, ou então Piqué fizessem algo.
Muito pouco para uma campeã mundial. E olha que Iniesta ainda foi para o jogo. A Rússia foi a Rússia. Briosa, mas sem aquele poder finalizador e muito menos a ambição para tal. A partida encaminhou-se para a prorrogação.
Aí a Fúria viveu um drama. Lances que caprichosamente paravam nas mãos seguras de Akinfeev. Um paredão, honrando a posição que já foi simplesmente de Lev Yashin. Para aumentar a tensão, a chuva caiu em Moscou, e o VAR quase paralisou o coração russo. Mas a reclamação espanhola de nada valeu. Não foi pênalti. Os russos comemoravam cada chutão, cada interceptação e roubada de bola como se fosse um gol. Uma atmosfera que aprisionou o ímpeto espanhol e teve como regente Mário Fernandes. O lateral brasileiro foi o primeiro a puxar o torcedor. Uma partida que só seria decidida nos pênaltis. Que dia para se estar em Moscou!
Nos pênaltis, Iniesta abriu a contagem, mas Smolov também conferiu. Piqué colocou os espanhóis novamente à frente. Frio, Ignashevich, o mesmo que marcou contra, empatou. A bola pune, Espanha! Koke parou em Akinfeev, e Golovin fez a Rússia passar à frente. Ramos ainda marcaria, só que os donos da casa estavam implacáveis. Cheryshev, o artilheiro russo, recolocou o time à frente. E aí, o momento mágico aconteceu. Moscou veio abaixo no pé esquerdo de Akinfeev que segurou a cobrança de Aspas. O 4 a 3 e a consagração. A Rússia, que muitos davam como eliminada na primeira fase, segurou a Espanha e está nas quartas. Impossível? Não no futebol. Uma vitória arrebatadora.
O adeus de um craque e de uma geração que encantaram
Moscou. A desclassificação para a Rússia marcou mais um adeus de uma campeã mundial da Copa. Após Alemanha e Argentina saírem, a Espanha seguiu pelo mesmo caminho, em um jogo que não lembrou aquela inspiração que marcou a geração vitoriosa da última década, com a conquista de duas Eurocopas e de um Mundial.
E um dos retratos da eliminação precoce foi o meia Iniesta. Autor do gol que deu o título da Copa de 2010 para a Fúria, o craque se despediu da seleção na partida contra a Rússia, em que começou no banco de reservas. “É uma realidade que é meu último jogo com a seleção. É o fim de uma etapa maravilhosa, o dia mais triste da minha carreira. Os finais nem sempre são como se sonha. O técnico toma decisões independentemente de entendê-las ou não. A seleção continuará avançando porque os jogadores são de alto nível”, destacou o meia.
Outro que lamentou a eliminação foi o atacante Aspas. Ele assumiu a falha pelo último pênalti perdido, mesmo que seu companheiro Koke também tenha parado em Akinfeev. “Foi um erro meu errar o pênalti hoje e, claro, não foi o Mundial que queríamos. O futebol é assim, é decidido no detalhe, e hoje não foi o meu dia”, declarou o atacante.
Herói russo diz que tática era mesmo ir para as penalidades
Moscou. Após a vitória sobre a Espanha nos pênaltis, por 4 a 3, o goleiro russo Akinfeev admitiu que a estratégia traçada pelo técnico Stanislav Cherchesov era mesmo de levar a partida para os pênaltis. A Rússia sabia das suas limitações frente a uma das campeãs mundiais e tida como grande favorita à conquista deste ano. Por isso, o jogo seguro e consciente. No fim, a tática mostrou-se certeira. Akinfeev foi o herói ao defender duas cobranças de pênaltis. “Nós nos esforçamos muito, tentamos nos defender e conseguimos. Aguardamos os pênaltis e conseguimos o resultado”, declarou o camisa 1.
Em êxtase com o clima de festa que tomou conta do estádio Luzhniki, Akinfeev minimizou as críticas pesadas que a imprensa russa fez ao time antes de a Copa começar. Para o atleta, o momento era exclusivamente de festa. “Acho que essa pergunta não é adequada agora. Ganhamos e queremos agradecer pelo apoio, comentei antes do jogo para nós nos unirmos. Acredito que os russos e os estrangeiros viram que nós queremos e gostamos de jogar futebol”, completou.
Fugir do Brasil. Quem também se destacou na partida foi o lateral-direito Mário Fernandes. O jogador levantou a torcida ao demonstrar um espírito aguerrido e de muito brio. “Muita gente não acreditava que a gente sequer iria passar de fase, que seríamos eliminado. Todo mundo se dedicou muito. Esse grupo mereceu a classificação”, declarou.
Com a Rússia avançando, Mário Fernandes disse que vai ficar na torcida pelo Brasil, mas declarou também que não deseja enfrentar seu país na grande decisão da Copa. “Depois da Rússia, claro, que a gente torce pelo Brasil. É o país que nasci, falo a língua. Tomara que vença, mas que não chegue à final”, encerrou.
Sombra
Os recentes escândalos de doping no esporte olímpico russo refletem até mesmo nos questionamentos quanto ao desempenho da seleção no país na Copa do Mundo. Classificados até com certa tranquilidade às oitavas de final do torneio, os russos estão tendo que lidar com a desconfiança da imprensa internacional sobre a intensidade apresentada nos jogos. Situação que treinador e atletas refutam a todo tempo.
Federação espanhola não garante técnico
Responsável pela demissão de Juden Lopetegui na véspera da estreia da Espanha na Copa, Luis Manuel Rubiales Bejar, presidente da Real Federação Espanhola de futebol, não garantiu a continuidade de Fernando Hierro como técnico. “Esse é um debate que temos que esperar pelo menos uma semana. Acabamos de ser eliminados e precisamos ter calma, avaliar. Agora não é possível afirmar nada”, declarou Rubiales. “Uma pessoa como Fernando sempre vai encontrar lugar para desenvolver suas ideias. Foi um Mundial difícil para nós”, acrescentou.