Estudioso da bola

Cruzeiro: Rômulo já se prepara para ser técnico um dia com curso da Uefa

Meia da Raposa concedeu entrevista ao Super.FC e comentou sobre volta ao Brasil, a adaptação, diferenças, o trabalho de Conceição e o puxão de orelha de Roger

Por Josias Pereira
Publicado em 02 de junho de 2021 | 07:00
 
 
 
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A contratação de Rômulo pelo Cruzeiro pegou muitos de surpresa. A movimentação silenciosa na negociação com o atleta terminou com um vínculo firmado por três temporadas. Inicialmente, a idade, 34 anos, apontava para uma medida temerária. Mas bastou Rômulo entrar em campo para mostrar que o período longe do Brasil, mais de uma década, o fez ser um jogador diferenciado e com um senso tático explicado por seu envolvimento técnico e teórico com o jogo. 

A Itália moldou Rômulo. Passou de um lateral sem grandes lembranças para a torcida celeste em sua primeira passagem a um meia de muita qualidade técnica, podendo atuar tanto como um segundo volante quanto um homem de criação. A diferença do futebol italiano, como explica Rômulo, é a busca pelo coletivo, o que explica sua transformação. 

"Acho que tudo na nossa vida é um aprendizado quando a gente procura aprender em qualquer situação. Lógico que ficar 10 anos na Itália, a gente aprende muitas coisas e eu sou um cara que procuro falar o menos possível e ouvir bastante justamente para que eu possa aprender. Lá na Itália, eu aprendi muito o profissionalismo, a disciplina, a obediência técnica, tática, coletiva”, relatou Rômulo, em entrevista exclusiva ao Super.FC.

O jogador apontou as diferenças que ele observa entre os principais centros do futebol europeu e a experiência na Itália, onde chegou até mesmo a seleção local. 

“A Europa se divide entre o futebol espanhol, o futebol inglês e o futebol italiano, sem nos esquecermos do alemão, mas eu acho que esses três que mencionei são os mais fortes e são três países completamente diferentes. Na Espanha ainda o talento vale um pouco mais do que o coletivo. O Campeonato Inglês é muita força, onde os clubes sempre jogam para fazer o próximo gol, não importa se está 3 a 0, eles querem fazer o quarto, não importa se o time está perdendo de 2 a 0, ele vai para o ataque da mesma forma, então é um futebol muito dinâmico. E na Itália, onde foi meu aprendizado, o futebol já é um esporte coletivo e eles destacam isso ainda mais. Muitos jogadores que têm um talento individual acima da média acabam tendo um pouco de dificuldade na Itália porque lá o que vale é o coletivo, a disciplina tática, o grupo, onde todos têm que fazer os movimentos coordenados. Aprendi muito isso lá e é algo que vou levar, com certeza, até o fim da carreira”, analisou. 

Projetando a carreira de técnico 

A aposentadoria é algo que ainda está distante nos pensamentos de Rômulo. Vinculado à Raposa, ele sonha com o acesso celeste e o retorno do time ao topo do cenário nacional. Mas, como um estudioso da bola, Rômulo também vem se preparando para o futuro. O volante cruzeirense, durante o período que esteve na Itália, já fez o módulo Uefa B do curso que prepara técnicos de futebol pela Federação Italiana. Um passo a mais para um atleta que se prepara e pensa sempre à frente. 

"Eu sou um cara que estuda bastante. Tenho bastante livros sobre futebol, análise, parte tática, já fiz o curso para ser treinador lá na Itália, pela FIGC, a Federazione Italiana Giuoco Calcio, que hoje é a federação mais bem vista no cenário mundial, onde eles têm a melhor escola de treinador. Acabei já fazendo o primeiro estágio, que é o Uefa B, e tenho estudado muito para em um futuro distante, só quando eu parar, um futuro bem distante, poder permanecer no futebol. Por isso, estou estudando para ser treinador. A gente tem que dar o melhor hoje, nos preparar, mas na frente só Deus sabe o que Ele quer de nós", apontou o meia à reportagem. 

 A volta ao futebol brasileiro 

Após tanto tempo longe do Brasil, Rômulo tem se dedicado taticamente e fisicamente para se adaptar ao futebol nacional. Ele apontou diferenças evidentes entre a rotina que encontrava na Europa e a realidade do Brasil, dentre elas o velho problema do calendário. Um choque cultural instantâneo que reverbera ainda mais pelo fato dos resultados no país serem para ontem, muitas vezes com ajustes sendo feitos dentro dos jogos. 

"Eu diria assim, olhando os números - gosto bastante de olhá-los até para o meu melhoramento na parte física - , o futebol na Itália, tanto em volume quanto em intensidade, está acima do futebol brasileiro hoje. A parte tática na Itália está bem acima em relação ao Brasil, mas eu analiso este contexto geral de uma maneira bem fácil de entendimento”, avalia o jogador. 

“Na Europa, nós temos quase 60 dias de preparação do primeiro dia de treino até a estreia no Campeonato. São quase 60 dias onde a gente pode ter uma base para o ano inteiro, onde os jogadores podem se conhecer, onde o treinador consegue implementar a filosofia de trabalho dele, coisa que no Brasil não existe. Às vezes nós temos aqui 10, 15 dias, para trabalhar entre o primeiro dia que se apresenta até a estreia. Esse é um ponto Geralmente se joga de domingo a domingo, então você tem sempre uma semana cheia para poder corrigir, coisa que aqui no Brasil tu tem que corrigir durante o jogo, e isso muitas das vezes não é possível”, complementou Rômulo. 

Logo em sequência, o jogador ainda comentou sobre o tempo de recuperação pós-jogos no Brasil. Esta maratona se reflete nos números. “Por que os jogos na Itália têm mais volume e intensidade? Porque o atleta tem mais descanso. Ele joga a cada sete dias, então ele tem um tempo muito grande de recuperação. Coisa que no Brasil, automaticamente, quando se joga a cada três dias, o desgaste é muito maior, a recuperação é muito menor, os números tendem a baixar e eles não mentem, é só acompanhar que a gente percebe isso", salientou. 

Meia-esquerda, meia de criação, segundo volante: qual a posição de Rômulo? 

Durante participação nos canais SporTV, o comentarista Roger, ex-companheiro de Rômulo na Raposa, não aprovou a atuação do atleta com um meia pela esquerda, chegando até mesmo a dizer que aquilo acabaria com o futebol do jogador. Rômulo contemporizou a fala do amigo, ressaltando que pode exercer algumas funções no setor, tendo em vista a experiência adquirida. Inclusive, Rômulo lembrou que Roger não acompanhou muito suas atuações enquanto esteve na Itália por uma década. 

"O Roger falou que eu não posso atuar como um 10, seria mais uma meia bem armador. Aqui o Felipe tem me deixado muito à vontade para que eu seja um meia criador, aquele que constrói, que vem de baixo, onde realmente eu me sinto melhor, construindo, pegando a bola às vezes lá de trás, a levando até o ataque. Ele quis falar que eu não posso jogar de costas ou atrás dos dois atacantes como um meia clássico, um número 10 de um time, mas como um volante tendo essa liberdade de baixar, de subir, gosto de fazer e acho que podemos fazer. Até porque o Roger não me acompanhou muito nesses 10 anos. Quando saí do Brasil, eu saí como lateral e nesse período na Itália, eu fui para o meio-campo. Mas a gente vai encaixando para que as coisas aconteçam da melhor forma possível", ponderou o jogador cruzeirense. 

Um sonho interrompido 

Rômulo esteve muito perto de uma Copa do Mundo. E ela seria especial. Defenderia a Itália, país que lhe abriu as portas, dentro do Brasil, a sua nação. Quis o destino que este sonho não se realizasse. Rômulo ainda recorda com frustração o momento. Teve impedido o alvo de toda uma vida devido a uma lesão no músculo adutor da coxa. Rômulo foi sincero. Ele poderia ter escondido a dor, Já estava pré-convocado pelo então técnico Cesare Prandelli para o Mundial, mas preferiu ser honesto com seu corpo, com a comissão técnica e o povo italiano. 

Ao avaliar a decisão tomada, Rômulo encara como um aprendizado, algo que o ajudou ainda mais a crescer como pessoa e como um jogador. 

"Precisamos olhar tudo com bons olhos e nada é em vão, nada é por acaso, tudo é aprendizado. Claro que a frustração fica, mas a gente tem que tirar proveito de qualquer situação que a gente vivencia. O fato de jogar uma Copa do Mundo no país onde a gente nasceu, que toda a família estava se programando para acompanhar os jogos e por uma questão de lesão ficar fora, realmente é muito difícil. Mas junto com a dificuldade vem o amadurecimento e a valorização das coisas que realmente têm importância na nossa vida. A dor fica, mas eu acho que o crescimento e o amadurecimento são muito maiores”, pontuou o atleta. 

“Não pude conhecer em 2014 os estádios, mas estou tendo a oportunidade de conhecer agora por meio de um grande clube que é o Cruzeiro, que me abriu as portas lá no passado e me está reabrindo agora, no presente, depois de 10, 11 anos. Estou muito feliz aqui e esperamos que juntos possamos escrever a história deste clube que é um dos maiores do Brasil, sem dúvida alguma", reforçou o meio-campista. 

A Série B com o Cruzeiro 

Rômulo é um dos principais nomes do Cruzeiro para a disputa da Série B. Um campeonato nacional com suas peculiaridades, dificuldades, mas que precisa ser superado para que, ao fim do ano, o torcedor celeste volte a sorrir. Rômulo compreende o seu papel e também o que envolve o torneio para a Raposa. Um dever que ele assume ao lado de todo o elenco. 

"Sem dúvida alguma é uma competição muito difícil, como todo campeonato. A gente sabe da maratona de jogos, da logística aqui no Brasil, que talvez seja uma das logísticas mais difíceis do cenário mundial porque o país é muito grande. A gente joga no Sul, joga no Norte, Leste, Oeste, tem o desgaste das viagens também, dos jogos próximos uns aos outros, onde todos contra o Cruzeiro vão querer fazer o jogo da vida porque sabem que estão enfrentando uma das maiores equipes do Brasil e é sempre uma vitrine. A televisão sempre transmitindo os jogos, um público muito alto para este tipo de jogo. Temos que estar preparados porque todo o jogo será uma final e nós temos praticamente o dever de recolocar o Cruzeiro entre os 20 clubes da elite do futebol brasileiro", finalizou o meia.

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