Eu já escrevi nesta coluna sobre expectativa versus realidade, mas preciso voltar neste tema por um motivo importante. É que nos últimos anos, ao meu ver, faltou ao Atlético uma sabedoria maior para se comunicar com o torcedor no sentido de situá-lo sobre a realidade do clube, e isso acabou voltando contra o próprio Galo. Calma que eu explico.

O ano mágico de 2021 levou o atleticano às nuvens. Os que tinham pés no chão passaram a sonhar com as estrelas e, mais ou menos ao mesmo tempo, discursos como “seremos uma potência mundial”, entre outras empolgações, não ajudaram muito na humildade alvinegra. E o problema gerado a partir daí é o descolamento da realidade.

Os donos sabem a real situação do clube. Os dirigentes sabem o tamanho da dívida, das restrições de investimento, dos problemas, etc. O torcedor não. E ele, torcedor, ama se apegar às “verdades de ontem”, principalmente quando elas são mais agradáveis do que as verdades de agora. E é aí que mora o perigo.

Quer exemplos? Vamos lá: em 2010, uma pesquisa apontou a Cidade do Galo como o melhor centro de treinamento do Brasil. Se passaram 14 anos, e hoje eu garanto a vocês que nosso CT, apesar de ainda bom, não pega pódio neste quesito no Brasil.

Em 2021, depois dos grandes investimentos de 2020 e dos reforços pontuais que chegaram, o Atlético tinha, de fato, um dos três elencos mais caros/poderosos/fortes do país. Hoje, nossa folha salarial não pega top-5.

Em contato com jornalistas nesta semana, na Arena MRV, o chefe do CIGA (Centro de Informações do Galo), Rodrigo Weber, revelou que o Galo teve acesso a um estudo que aponta qual é a expectativa de resultado do Atlético no Brasileirão com base em investimento no elenco. Os critérios usados não foram esmiuçados, mas acreditem: o estudo aponta que o lugar natural do Galo (avaliando só investimento) é entre o sexto e o nono lugar.

É importante demais a gente deixar claro que isso não significa dizer que o clube pode (ou vai) se contentar com esse posicionamento. Eles garantem que a meta é sempre ser campeão, mas deixam claro que, pra isso, precisam ser bem mais eficientes do que aqueles que têm mais dinheiro. Outros largam na frente, e isso é fato.

O Palmeiras tem, hoje, melhor CT que o Atlético? Sim, e por muito. O Flamengo tem mais dinheiro que o Galo? Sim, e por muito. São só exemplos. Significa dizer que podemos simplesmente aceitar que o Atlético termine todas as competições atrás dos dois? Obviamente não. Se fosse assim, um simples torneio de Excel, Fortaleza e Vasco não poderiam estar na nossa frente na tabela da Série A. Mas estão.

O ponto é: entender onde estamos nos dá mais clareza e elementos pra cobrar. O discurso é de um clube profissional, que vai superar a desvantagem econômica com trabalho, com tecnologia, por aí vai. Então é isso que temos que cobrar. O Galo não pode gastar dinheiro errado, tem que melhorar sua base, tem que tomar decisões estratégicas e sensatas sobre seus treinadores, por aí vai.

Outro dia li na extinta rede social um torcedor que falava “cobro apenas o que foi prometido: que o Galo seja potência mundial. Menos que isso pra mim não serve”. É triste, mas esse vai viver frustrado. Quem espera que o Galo seja “no mínimo o que foi em 2021” vai viver frustrado. Aquilo ali foi um ponto fora da curva - que precisamos, sim, cobrar pra que seja mais frequente, mas entendendo que não é o padrão.

Esqueçamos as verdades de ontem, as declarações emocionadas. Elas vão nos prender num mundo ilusório e, nele, a frustração vai ser café, almoço e jantar. Vamos entender onde estamos pra, a partir daí, cobrar com inteligência. O vice-líder do Brasileiro (com um jogo a menos) é um time com a folha salarial bem menor que a nossa. Dá pra ser competitivo no campo sem ser favorito no Excel. Só não dá pra viver no mundo da lua.