Mestre Negoativo joga capoeira, encanta com música, faz cinema, pesquisa a cultura Bantu e, claro, é ativista cultural. Pausa para lembrarmos que o povo Bantu teve enorme impacto na formação cultural e na identidade do Brasil; principalmente na mesma música, nas práticas religiosas e na culinária.

 A maioria dos africanos escravizados trazidos para o Brasil, entre 1580 e 1850, tinha origem Bantu, (de Angola e Congo). Voltando a Mestre Negoativo, ele fundou o Bloco Afro Porto de Minas e a banda Berimbrown. É um caçador de si e “acendedor” de memórias ancestrais, logo, imortais. Dia 22 de junho, no Galpão Cine Horto, lançou o álbum “O Arco Ancestral e os Vissungos das Gerais”. Com produção do onipresente Sérgio Pererê, o álbum mergulha nas raízes afromineiras e revisita os Vissungos - cantos de trabalho, lamento e resistência dos antigos quilombos de Minas Gerais. Uma história pessoal e, ao mesmo tempo, coletiva do Cerrado Mineiro. O berimbau de afinação baixa, herança bendita de Mestre Waldemar da Liberdade, conduz as composições, em harmonia com os sons naturais do Cerrado. É o cerrado, é Minas, é Brasil, é mundo. Fala Mestre!

 

Por que Negoativo?

É um apelido recebido quando criança por ser esperto, com destreza e criatividade.

E o nome do teu recém lançado álbum, "O Arco Ancestral e os Vissungos das Gerais”? É um “ritual”?

Sim! Os “Vissungos” são um ritual linguístico do povo Bantu em Minas Gerais, a afromineiridade. A prática era encontrada na região de Diamantina e do Serro, em comunidades quilombolas. “O Arco Ancestral” é o nosso berimbau de barriga, símbolo da capoeira. São manifestações diaspóricas nas Minas Gerais.

Como foi o lançamento, dia 22 de junho, no Galpão Cine Horto?

Foi uma celebração para plateia com muita diversidade e pluralidade. Uma noite de domingo muito harmoniosa em uma conexão ancestral.

O que fez o incansável e incontornável Sérgio Pererê?

Pererê recebeu o chamado e topou a missão de produtor musical do álbum.

Qual a relação com a memória, Sankofa?

Este ano, 2025, comemoro 50 anos na arte e 60 anos de existência. Neste processo de amadurecimento tenho feito meu regresso, de acessar o que me pertence de fato e não reproduzir ações sistêmicas do mundo acelerado. Sankofa é um movimento, um encontro com você mesmo e com sua ancestralidade.

E com a terra e as vozes do passado que não passam?

Tenho me relacionado cada vez mais com o elemento terra, na rocinha, os plantios têm sido valioso aprendizado que nutre a alma.

Mudando um pouco de assunto, o projeto foi realizado com recursos da Lei Municipal de Incentivo à Cultura de Belo Horizonte. Sem as leis, sem cultura?

Sim! Essa realização foi por meio da Lei Municipal, o fundo. Uma contemplação necessária para realizarmos e compartilharmos sonhos. - Voltando ao álbum, ele é uma ode ao berimbau, aos cantos de trabalho, de lamento; às vozes das matriarcas e dos “nêgos véio”? - Sim o conceito do álbum, nasce do cerrado mineiro em confluência com a savana africana. Minhas vivências com as mais antigas, desde minhas avós e as matriarcas dos quilombos.

Quem é Mestre Waldemar da Liberdade?

Um grandioso Mestre da Capoeira, minha grande inspiração. Nos anos 1940, 1950 e 1960 atuou, preservou as rodas de mais tradição e manteve as afinações baixas dos berimbaus do início do século 20.

E o toque francês de “Il était une fois”?

Morei por alguns anos na Bélgica, em um bairro chamado “Matumguê”. Lá, convivi com eles e aprendi a língua. O Congo, antigo Zaire, foi colônia belga, muita perversidade ocorreu. Por isto nasceu essa música intitulada, “Era uma Vez”.

Algum novo projeto à vista?

Sim! Sou um artista em movimento constante, a arte é meu respiro! Agora, em agosto, vou para uma turnê nos Estados Unidos, onde compartilho vivências sonoras e terapêuticas. O mesmo farei em janeiro de 2026, retornando ao Senegal, África, para a mesma vivência de 10 dias em um centro de cultura agrícola, na fronteira com a Mauritânia. Neste momento estou rodando com o projeto do “Sesc Sonora Brasil”: 22 shows pelo Centro Oeste, Sudeste e Sul do país.