O corpo da publicitária brasileira Juliana Marins chegou a São Paulo no fim da tarde desta terça-feira (1º), seis dias após ser resgatado do monte Rinajni, na Indonésia. A urna funerária deve seguir para o Rio de Janeiro, com pouso previsto para às 18h30. Está prevista a realização de uma nova autópsia.

A Defensoria Pública da União (DPU) solicitou que o novo exame seja realizado até seis horas após a chegada, no Instituto Médico Legal Afrânio Peixoto, no Rio, com traslado em viatura oficial da Polícia Federal ou da Polícia Civil.

A nova perícia, solicitada pela família, poderá subsidiar uma apuração internacional sobre as circunstâncias da morte dela, segundo a defensora regional de direitos humanos no Rio de Janeiro Taísa Bittencourt.

A defensora afirma que, caso fique demonstrado que não houve investigação ou responsabilização pelas autoridades indonésias, o Brasil poderá abrir uma apuração própria, por meio da Polícia Federal, a partir do princípio da jurisdição extraterritorial.

"Já pedimos a instauração de um inquérito policial na Polícia Federal para apurar esse eventual cometimento de crime de omissão no abandono da vítima", disse.

Segundo Taísa, no entanto, ainda há incerteza sobre a capacidade técnica de a perícia revelar detalhes relevantes, devido ao estado do corpo.

"Os peritos têm dúvidas se vão conseguir efetivamente constatar algo, considerando a deterioração. Mas é desejo da família fazer uma nova perícia com base nas normas e nas leis brasileiras para entender, na nossa cultura, o que efetivamente aconteceu."

A decisão de refazer a autópsia foi confirmada nessa segunda-feira (30) pelo governo federal. A Advocacia-Geral da União (AGU) informou que vai cumprir voluntariamente o pedido da família. O órgão solicitou à Justiça Federal a realização de uma audiência urgente com a DPU e o estado do Rio para definir a forma mais adequada para o novo procedimento. Esse encontro estava marcado para a tarde desta terça.

Relembre os acontecimentos

No último dia 20, ela escorregou em uma trilha que leva ao cume do monte, uma das atrações turísticas mais populares do país asiático, com 3.726 metros de altitude. Ela só foi localizada na segunda-feira (23), com ajuda de um drone térmico. No dia seguinte, quando as equipes de resgate conseguiram chegar ao local, encontraram Juliana morta.

Na quarta-feira (25), o corpo foi resgatado. Havia múltiplas fraturas e grave hemorragia interna, o que explicaria a morte, disse o médico legista responsável pela autópsia.

O local em que ela caiu era de difícil acesso, e as buscas precisaram ser paralisadas diversas vezes devido às más condições climáticas.

É possível que a brasileira tenha sofrido uma segunda queda. Ainda no sábado (21), vídeo feito por drone captou Juliana, sentada e em movimento, em um local íngreme. Na terça, quando foi encontrado o corpo, outra gravação mostrou que ela estava em um local diferente, mais plano. A segunda queda pode tê-la levado mais para o fundo do penhasco.

Pela estimativa do médico responsável pela autópsia, Juliana pode ter sobrevivido por quatro dias após a primeira queda. Em publicação nas redes sociais, a família afirmou que a equipe de resgate foi negligente e que vai lutar por justiça. 

Enquanto isso, na Indonésia, a polícia da ilha de Lombok, onde fica o vulcão, anunciou nesta segunda-feira que já ouviu testemunhas e inspecionou o local onde Juliana caiu para tentar identificar se houve qualquer tipo de irregularidade na morte dela.

As quatro testemunhas incluem um guia local identificado com as iniciais AM, um organizador de trekking (com iniciais JU), um carregador de Bayan (com iniciais SP), Lombok do Norte, e um policial florestal (com iniciais MD) de Ampenan, Mataram, que era o responsável pela segurança e proteção na área do Parque Nacional do Monte Rinjani.

Não foram citados os nomes completos das testemunhas, mas o nome do guia de Juliana Marins é Ali Musthofa, cujas iniciais batem com as divulgadas pela polícia.

O coordenador também informou que os investigadores inspecionaram o local do acidente, em conjunto com o escritório do Parque Nacional Rinjani e também com funcionários da Embaixada do Brasil no país, para manter o contato com a família.

Confira as principais dúvidas sobre o caso:

Como foi a primeira queda?

O que se sabe é que Juliana Marins caiu após ter sido deixada para trás pelo guia, para descansar. A primeira imagem dela, feita por um drone de turistas espanhóis, no sábado (21), mostrou que ela estava a cerca de 200 metros da trilha, em uma área com muitas pedras soltas e pouca vegetação.

Quantas vezes Juliana caiu?

Após a primeira imagem, ela foi avistada novamente apenas no dia seguinte, por um drone com imagem térmica da equipe de socorristas. Naquele momento ela estava presa a uma encosta rochosa a cerca de 500 metros da trilha, imóvel.

Já no momento do resgate, na quarta-feira, ela estava a cerca de 650 metros da borda, em uma área rochosa, o que sugere que ela pode ter caído mais de uma vez.

Por que há diferença entre os horários de morte divulgados? 

A Basarnas, agência responsável pelas buscas na Indonésia, disse à família que Juliana havia sido encontrada já sem vida na noite de terça (24) no horário local, por volta das 11h de Brasília. Já o legista estimou a morte entre 14h de terça e 2h de quarta no horário de Brasília.

Especialistas ouvidos pela reportagem avaliam que é muito difícil precisar o horário da morte porque uma série de elementos importantes comumente usados em autópsia para determinar o horário de morte não pôde ser analisada pelas condições em que o corpo da jovem foi encontrado.

Além disso, a autópsia foi realizada apenas na noite de quinta (26), após o corpo ser transportado em um freezer por horas até Bali. Esse período de mais de 24 horas também influencia na definição da hora da morte, segundo o legista.

Por que ela não usava casaco?

A imagem feita pelo drone dos espanhóis mostrou que Juliana usava apenas calça, uma camiseta de manga curta, luvas e botas. Não se sabe se ela carregava mochila e outros equipamentos.

Montanhistas e turistas que já fizeram a trilha afirmam que, à noite, a temperatura pode chegar a 4°C. Por isso, o casaco é necessário para evitar hipotermia.

Por que o resgate demorou?

Um dos pontos mais criticados pela família e pelos brasileiros que acompanharam o caso foi a demora no resgate. Autoridades locais disseram que enfrentaram dificuldades como terreno íngreme, altitude e mau tempo.

Em depoimento nas redes sociais, o geógrafo e montanhista Pedro Hauck afirmou que a Indonésia é um país pobre e não possui um serviço de resgate igual ao do Brasil, onde equipes ficam de prontidão e atendem 24 horas por dia.

O Parque Nacional Monte Rinjani, onde fica o vulcão, não possui uma equipe especializada de plantão. Assim, quando ocorre um acidente como o de Juliana, é preciso reunir socorristas e voluntários e levar equipamentos até o local para iniciar as buscas. Não há infraestrutura ou equipamentos de resgate disponíveis na montanha.