O atendimento a questões de saúde mental e consumo de álcool, na medicina, precisa considerar abordagens específicas de gênero. A conclusão é de um estudo publicado recentemente no American Journal of Health Promotion por pesquisadores da Escola de Enfermagem da UFMG, da Universidade do Estado do Rio de Janeiro, da Universidade Federal de Pelotas e do Ministério da Saúde. A pesquisa encontrou diferenças nos padrões de comportamento de consumo de álcool associado à depressão entre homens e mulheres.
De acordo com o estudo, o consumo excessivo de álcool em uma única ocasião (5 doses ou mais para homens e 4 doses ou mais para mulheres), associado à depressão, foi relatado por cerca de 40% da população, em especial mulheres. Conforme o estudo, a prevalência de depressão foi de 10,8% na população total, sendo mais presente entre as mulheres (15%) quando comparadas aos homens (6,1%).
Os resultados apontaram também uma associação entre a depressão e situações em que o uso de álcool trouxe algum tipo de comprometimento (como problemas em casa ou deixar de ir ao trabalho ou escola), relatados por 4,6% da população. Esse comprometimento relacionado ao consumo de álcool foi mais significativo entre os homens (5,5%) e adultos com depressão (8,7%).
“Os homens apresentam menor tendência a buscar tratamento psicológico e psiquiátrico, pois podem ter dificuldade em reconhecer e comunicar sintomas de depressão. Além disso, as normas masculinas/padrões de masculinidade podem inibir a busca por ajuda e reforçar estilos de enfrentamento desadaptativos, como o consumo de álcool”, explica a primeira autora do estudo, Thaís Cristina Marquezine Caldeira, pós-doutoranda no Programa de Pós-graduação em Nutrição e Saúde da Escola de Enfermagem da UFMG.
Ela lembra que o álcool é frequentemente usado como um mecanismo de enfrentamento da depressão, mas o comportamento é diferente entre homens e mulheres. “É crucial compreender a associação entre depressão e comportamentos de consumo de álcool e elucidar as diferenças entre os sexos nessa associação nessa população”, diz.
“Historicamente, as campanhas preventivas têm como alvo principal a população masculina, visto que o consumo de álcool era mais prevalente entre eles. No entanto, com o aumento do consumo de álcool entre as mulheres, é essencial adotar estratégias que abordem os impactos específicos do álcool em sua saúde. Esses resultados enfatizam a necessidade de abordagens específicas de gênero para lidar com questões de saúde mental e consumo de álcool”, enfatiza Thaís.
A pesquisa também mostra que quase 10% das pessoas relataram já ter perdido a consciência devido ao consumo de álcool em excesso, episódio relacionado à presença de depressão tanto em homens quanto em mulheres.
A pesquisa
A pesquisa foi realizada com uma subamostra de dados da Pesquisa Nacional de Saúde (PNS), composta por mais de 88 mil pessoas com 18 anos ou mais que forneceram informações sobre depressão e consumo de álcool. A maioria era do sexo feminino (53,2%), com idade entre 25 e 54 anos (56,1%), até 8 anos de estudo (49,2%), com renda per capita inferior a 1 salário mínimo (47,5%), a maior parcela da população residia na região mais desenvolvida do país (Sudeste, 43,4%) e com presença de companheiro(a)/cônjuge (61,4%).
A presença de depressão foi avaliada por meio do Patient Health Questionnaire-9 (PHQ9), um questionário com nove perguntas que rastreiam a presença de sintomas depressivos nas últimas duas semanas. “O questionário identifica a depressão maior ou Transtorno depressivo maior com base nos sintomas: humor deprimido, anedonia, distúrbios do sono, fadiga, alterações no apetite ou no peso, sentimento de culpa ou inutilidade, dificuldades de concentração, alterações psicomotoras e pensamentos de automutilação”, diz Thaís.
Os indicadores de consumo de álcool compreenderam o consumo excessivo de álcool em uma única ocasião, situações em que o uso de álcool trouxe algum tipo de comprometimento e desmaios, calculados com base na população que relatou seu consumo, independentemente da frequência e da quantidade.
Na análise também foram incluídas características sociodemográficas como sexo, faixa etária, escolaridade, renda e presença de companheiro, companheira ou cônjuge.
O estudo foi coordenado pela professora Taciana Maia, da Universidade do Estado do Rio de Janeiro e egressa da EEUFMG, e contou com a participação do professor Rafael Moreira Claro, do Departamento de Nutrição da Escola de Enfermagem da UFMG e das nutricionistas egressas da EEUFMG: Thaís Cristina Marquezine Caldeira e Luiza Eunice Sá da Silva.