Pacientes que procuram atendimento no Estado do Amazonas, um dos mais afetados pela Covid-19, já relatam falta de leitos de Unidade de Terapia Intensiva (UTI) e equipamentos. Em uma semana, os casos confirmados da doença no Estado aumentaram 192%, e os registros de óbitos subiram 360%. Esses dados colocam o Amazonas na fase de "aceleração descontrolada" do novo coronavírus, segundo o Ministério da Saúde.
Em uma unidade de Manaus, o marido de uma enfermeira morreu sem conseguir atendimento em UTI, segundo Patrícia Sicchar, vice-presidente do Sindicato dos Médicos. "A falta de estrutura e de medicamentos e salários atrasados já era um problema que vínhamos denunciando desde o ano passado". Segundo Patrícia, o homem procurou o Serviço de Pronto-Atendimento (SPA) em Manaus.
"Não tinha nem oxímetro para ver a saturação do oxigênio. Ela (a mulher da vítima, que é enfermeira) teve de trazer de casa o equipamento para mostrar que o marido precisava de oxigênio, porque o SPA não tinha", disse. "Sem respiradores. Sem vagas. Crítico para pacientes que precisam de entubação". Segundo a médica, unidades de saúde de Manaus se tornaram foco de contágio para pacientes com outras doenças e profissionais.
"Minha mãe estava aqui, no sofá da minha casa, e saiu para morrer no hospital", disse a dona de casa Ana Paula Moraes, de 42 anos. Ida Moraes, de 72, morava no município de Manacapuru, a 68 km da capital. Ela sempre ia à cidade para visitar as filhas. Seis dias antes de morrer, teve um mal-estar e foi atendida em um SPA de Manaus. Mesmo medicada, não conseguia se levantar nem se alimentar. As filhas decidiram levá-la ao Hospital 28 de Agosto, unidade da rede pública de Manaus.
Ida entrou em uma terça-feira, sem sintomas de gripe, e na sexta-feira foi transferida para a unidade de referência. Poucas horas depois, a família foi informada de que a idosa havia morrido. "Só soube que ela estava com essa Covid-19 quando me disseram que ela faleceu. Não foi entubada. Não nos informaram nada. Ela passou mal, foi ao hospital, e acho que lá pegou essa Covid-19". Ana Paula disse que não foi procurada para receber orientação.
Os cerca de 500 respiradores do Amazonas estão em Manaus. Na segunda, o governo do Estado informou que o Hospital Delphina Aziz, unidade de referência para Covid-19, contava com 75 leitos de UTI. No fim de semana, houve incremento de 15 respiradores, após a notícia de que a unidade havia entrado em colapso.
Distância
O Estado ainda enfrenta dificuldades de acesso à saúde em cidades do interior, distantes de Manaus. Não houve registros de casos dentro de aldeias, mas há relatos de indígenas contaminados – dos sete que testaram positivo para a doença, dois acabaram morrendo. Segundo o governo do Amazonas, 18 dos 61 municípios do interior têm casos da doença.
O governador do Amazonas, Wilson Lima (PSC), vem criticando a população pela baixa adesão ao isolamento em Manaus e trocou o secretário de Saúde, Rodrigo Tobias, após ele anunciar que a rede estadual estava a 5% do colapso. Já o prefeito de Manaus, Arthur Virgílio Neto (PSDB), disse que a culpa pela não adesão ao isolamento é do presidente Jair Bolsonaro.
Os dois gestores anunciaram novos leitos em hospitais de campanha em ações com empresas particulares. A prefeitura lidera a montagem de um hospital na periferia de Manaus com 114 leitos clínicos e 32 de UTI. Já o Estado anunciou que contrataria, por R$ 866 mil por mês, o prédio e materiais de um hospital particular desativado.
O Ministério da Saúde deve enviar ao Amazonas recursos humanos e verbas para serem investidas na ampliação do atendimento. Outra medida de socorro é o hospital de campanha para a população indígena.