Nessa sexta-feira (19), Dia dos Povos Indígenas do Brasil, entidades do movimento indígena promoveram um protesto no centro de Manaus (AM). Uma das motivações do ato, realizado em frente ao Teatro Amazonas, é a licença concedida neste mês pelo governo estadual para a exploração de potássio na amazônia, na região onde vive o povo mura.
O Executivo concedeu a autorização para que a empresa canadense Brazil Potash construa a maior mina de fertilizantes da América Latina na floresta amazônica. Entretanto, procuradores federais disseram, um dia após a autorização, que isso não é legalmente aceitável.
Para Izabel Munduruku, coordenadora do Movimento dos Estudantes Indígenas do Amazonas e uma das mobilizadoras do protesto, o governo estadual passou por cima da autonomia do povo mura.
Segundo Izabel, as decisões sobre a exploração de potássio não respeitaram o direito de consulta livre e prévia, garantido na Convenção n° 169 da OIT (Organização Internacional do Trabalho) sobre Povos Indígenas e Tribais.
O ato foi convocado como parte das programações locais do ATL (Acampamento Terra Livre), maior mobilização indígena do país, que será realizado a partir de segunda-feira (22) em Brasília. Neste ano, o evento completa 20 anos e reunirá povos originários dos seis biomas brasileiros.
"O licenciamento permite que a empresa adentre o território dos indígenas muras, que sofrem violências através da exploração de potássio e com o próprio agronegócio na produção do leite e na criação de gado. Os muras e outros povos têm sofrido com o avanço da perspectiva neoliberal com relação aos territórios indígenas", afirmou Izabel Munduruku.
A reportagem procurou o governo do Amazonas, que não se posicionou até a última atualização desta reportagem.
Licença questionada
O potássio é base para fertilizantes utilizados na agricultura em larga escala. O empreendimento em uma região preservada da amazônia tem apoio no governo Lula (PT). O vice-presidente e ministro do Desenvolvimento, Indústria, Comércio e Serviços, Geraldo Alckmin (PSB), já deu declarações favoráveis ao projeto.
No dia do aval da mineração, o governador Wilson Lima (União Brasil) anunciou que a licença de instalação foi emitida pelo Ipaam (Instituto de Proteção Ambiental do Amazonas), vinculado a gestão estadual, e que a empresa planeja investir R$ 13 bilhões para construir a mina em Autazes, a 120 km a sudeste de Manaus.
O projeto promete reduzir a dependência de 90% da agricultura brasileira em relação ao potássio importado, e está parado há anos devido à oposição do povo mura, que afirma não ter sido consultado sobre o uso de suas terras ancestrais.
As autoridades federais dizem que a licença deve vir do Ibama (Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis), não do órgão ambiental do estado --cujo governo apoia o projeto, por defender que trará investimentos e criará milhares de empregos.
O MPF (Ministério Público Federal) em Manaus afirmou em um comunicado que considera a licença concedida pelo Ipaam "irregular e adotará as medidas cabíveis". "A licença viola os direitos constitucionais, as normas internacionais e também os direitos dos povos indígenas", diz o texto.
Em setembro, uma juíza federal de Manaus reiterou sua decisão de 2016 de suspender o projeto até que os muras fossem devidamente consultados. Ela também determinou que a licença deve vir do órgão ambiental federal, não estadual.
Posteriormente, a Justiça federal anulou liminar que suspendia a licença estadual da Brazil Potash, argumentando que o Ipaam poderia emitir a licença porque não há território indígena oficialmente reconhecido na área planejada para a extração.
Os líderes muras dizem que a área em questão se sobrepõe às terras ocupadas pelos indígenas e buscam a demarcação do território. Mas o processo está pendente na Funai (Fundação Nacional dos Povos Indígenas). (Jorge Abreu/FolhaPress)