Uma hepatite severa e aguda, que já levou 26 crianças a necessitar de transplante de fígado ao redor do mundo, mas que não é causada por nenhum dos agentes infecciosos mais comuns, ainda é um mistério para a ciência. Segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS), 21 países investigam 348 casos prováveis da doença e, no Brasil, de acordo com o Ministério da Saúde, são 16 suspeitas, duas delas em Minas.
Por enquanto, há menos respostas do que dúvidas sobre a hepatite misteriosa, mas também não existe motivo para pânico, pontua o infectologista pediátrico Marcelo Otsuka. O médico explica que uma das linhas de investigação sobre ela é a relação entre a doença e a Covid-19 e alerta que o principal cuidado para se prevenir é o mesmo para as hepatites A e E, mais habituais em crianças: a higiene.
Entenda, abaixo, o que se sabe e o que ainda precisa ser descoberto sobre a hepatite misteriosa:
O que causa a hepatite misteriosa?
Esse é o principal mistério em torno da doença. Durante os exames realizados nas crianças doentes, não foram detectados os agentes mais comuns causadores da hepatite. Parte delas — mas não todas — tiveram contato com o adenovírus 41, que é comum entre crianças e causa bronquiolite.
“Ele não é relacionado a quadros graves de hepatite e, mais do que isso, não sofreu nenhuma mutação que justificasse causá-los. O adenovírus é comum, mas a transmissão tinha sido reduzida por causa do uso de máscara e de medidas de higiene, o que talvez tenha influenciado que, agora, apareçam mais casos”, explica o infectologista Marcelo Otsuka. O vírus foi detectado em pequenas quantidades nas crianças e não estavam em amostras do tecido do fígado, de acordo com a OMS, o que pode significar que a presença dele no organismo delas seja apenas uma coincidência.
Uma das suspeitas é que o adenovírus sirva como gatilho para os efeitos de outro agente infeccioso, e é aí que entra o coronavírus.
A hepatite é causada pelo coronavírus?
Parte das crianças diagnosticadas com a hepatite misteriosa tinham sido infectadas pelo coronavírus. Como a Covid-19 continua a circular com intensidade ao redor do mundo, ela se tornou um dos focos das investigações. Como a Síndrome Inflamatória Multissistêmica Pediátrica (SIM-P), que pode ocorrer em crianças após a Covid-19, a hepatite também causa inflamação no fígado.
Nesse contexto, o coronavírus poderia ter relação com o desencadeamento dos casos, mas isso ainda não foi provado. “O que causa estranheza sobre a Covid-19 é o porquê de só agora estarmos vendo os casos de hepatite. Seria por causa da variante ômicron? Mas há relatos de casos no Alabama, nos EUA, antes de ela ser identificada”, diz Otsuka.
A vacina contra a Covid-19 tem relação com a hepatite misteriosa?
A OMS esclarece que não. “Com base nas informações atuais, a maioria das crianças afetadas não recebeu a vacina contra a Covid-19 e, no momento, a relação de casos com a vacinação está descartada”, atesta, em seu site oficial. A maior parte das crianças com a hepatite misteriosa sequer tem idade para ser vacinada.
Quais são os sintomas da hepatite misteriosa?
A hepatite misteriosa é aguda e súbita. Os principais sintomas são gastrointestinais, como dor abdominal, diarreia e vômito. Outro sintoma comum é a icterícia — coloração amarelada da pele e dos olhos. “Se tiver sintomas, procure um médico. Nos hospitais, a rotina tem sido investigar a função hepática com exames”, orienta o infectologista Marcelo Otsuka.
O tratamento, até a causa da hepatite ser identificada, tenta aliviar os sintomas. Poucas mortes foram relatadas devido à hepatite misteriosa, mas ela é aguda e grave e, como demais quadros hepáticos, pode levar à morte.
Como é a transmissão da hepatite misteriosa?
As hepatites A e E são transmitidas por via oral-fecal, ou seja, quando a pessoa tem contato com alimentos contaminados com o vírus, por exemplo. As hepatites B, C e D podem ser transmitidas por via sexual e compartilhamento de materiais cortantes, como agulhas e lâminas de barbear.
Não se sabe, até agora, como é a transmissão da hepatite misteriosa, mas o adenovírus, por exemplo, é transmitido de forma oral-fecal e pelas vias respiratórias, enquanto a principal forma de transmissão da Covid-19 é respiratória.
Como se prevenir da hepatite?
A higiene é a principal forma de prevenção das hepatites em geral e, mesmo que não se saiba as causas específicas que resultam na nova variação da doença, lavar as mãos, cobrir boca e nariz ao tossir ou espirrar são alguns dos cuidados para prevenir a infecção, inclusive, pelo adenovírus.