O óleo que emporcalha o Nordeste, do Ceará à Bahia, é só uma amostra do pesadelo de centenas de milhares de baianos que vivem da pesca, caso não se altere o leilão da Agência Nacional do Petróleo nesta quinta-feira. Além de baleias, corais-cérebro, atobás, caranguejos.

Com ajuda do Ministério Público Federal, pescadores lutam para excluir da oferta de 36 blocos as quatro áreas que trazem perigo para o arquipélago de Abrolhos e dois extensos manguezais.

O quarteto na bacia de Camumu-Almada arrecadaria meros R$ 10,8 milhões (0,34%) do total de R$ 3,2 bilhões esperados em bônus de assinatura.

Os blocos só permaneceram na 16ª rodada da ANP por intervenção direta do novo presidente do Ibama, Eduardo Bim. No início do governo Bolsonaro, em 1º de abril, Bim atropelou parecer contrário de técnicos subordinados e determinou que as áreas seguissem na oferta pública.

Os quatro blocos ficam a 310 km do Parque Nacional Marinho dos Abrolhos, o primeiro do gênero no país, criado em 1983. A apenas 130 km, porém, está o limite norte do banco de corais mais rico em espécies do Atlântico Sul, que vai de Ilhéus (BA) à fronteira com o Espírito Santo.

Na eventualidade de um acidente com derramamento, simulações indicam que o petróleo chegaria à costa e ao arquipélago em questão de horas ou dias, se ocorresse no verão. No inverno, isso dependeria de inversões de correntes e ventos, mas ainda haveria risco.

“Um derramamento de dez dias pode pegar o litoral todo da Bahia” (da região), explica o biólogo Guilherme Dutra.

No segundo caso, no inverno, a mancha engolfaria uma população de 17 mil baleias-jubarte com seus filhotes, nascidos ali após longa viagem desde a Antártida.

Esses mamíferos podem alcançar 18 m de comprimento e nadam cerca de 5.000 km sem se alimentar. Viajam para acasalar e procriar nas tépidas águas baianas, depois de se empanturrar no oceano Austral com krill, o pequeno crustáceo de águas geladas.

O arquipélago

  • No canal de Abrolhos, reina o coral-cérebro Mussismilia braziliensis, espécie que só se encontra por ali e existe há 16 mil anos, quando o nível do mar era 140 m mais baixo. 
  • São colunas de até 25 m de altura que abrem chapéus com até 50 m de diâmetro. Um derramamento de óleo daria o golpe de misericórdia nos corais, já castigados pelo aquecimento global e o branqueamento (morte dos organismos que lhes dão o colorido).
  • O arquipélago de Abrolhos tem cinco ilhas de origem vulcânica, entre as quais tartarugas nadam nas águas azuis transparentes.