A reposição do quadro de profissionais nos postos de saúde de Minas Gerais não acontece na mesma velocidade das inscrições, que já bateram 97% das vagas em todo o país. Na prática, apenas 7% das 292 cidades mineiras que tinham médicos cubanos já contam com o reforço de brasileiros, segundo o Ministério da Saúde.
No Estado, 42 profissionais se apresentaram aos postos de 22 cidades. Além da demora para ocupar as 603 vagas ociosas, os municípios precisam lidar agora com o abandono das unidades de saúde por parte dos médicos. Animados com a possibilidade de receber R$ 11 mil para trabalhar 32 horas semanais no Mais Médicos, os profissionais estão saindo das equipes do Programa Saúde da Família (PSF), onde ganham a partir de R$ 5.000 e trabalham 40 horas.
O Conselho das Secretarias Municipais de Saúde de Minas Gerais (Cosems MG) ainda não sabe quantos médicos lotados nas PSF do Estado se colocaram à disposição para ocupar as vagas dos cubanos, mas o presidente do conselho, Eduardo Luiz da Silva, admite que a transferência tem ocorrido e preocupa.
“O Mais Médicos era para ser um programa para complementar o PSF, levando médicos para locais mais distantes. Mas a possibilidade de ganhar mais do que em muitos postos tem atraído os médicos brasileiros”, diz.
Em Açucena, no Leste de Minas, o quadro está bastante crítico. Dos cinco médicos que atendem no município, um é cubano e teve que sair, e outros três já anunciaram que se inscreveram no Mais Médicos e devem deixar seus cargos em breve. “Nós vamos ficar descobertos até o ano que vem, quando saberemos o orçamento. Já sabemos que, neste fim de ano, a situação vai ser complicada”, afirma a secretária de Saúde da cidade, Josilene Aparecida Amaral.
Em Ipatinga, na mesma região, também teve desfalque da equipe do PSF, com a perda de um médico. Ele deverá ser reposto até o fim do ano, mas, por ser polo regional, a cidade sente o impacto da falta de médicos em toda a microrregião, segundo a secretária municipal de Saúde, Érica Dias de Souza Lopes. “Muitas pessoas estão vindo de municípios vizinhos e sobrecarregando nossa UPA, que teve aumento de 35% nos atendimentos”, conta.
Procurado, o Ministério da Saúde não se pronunciou sobre a demora na reposição do quadro de médicos nem sobre a saída deles do PSF.
Situação já era crítica no interior
A falta de profissionais agravou um quadro que já era crítico nos postos de saúde mineiros. Com os atrasos de repasses de recursos por parte do governo do Estado, já estava difícil manter as unidades de saúde em várias cidades.
Em São João do Oriente, no Leste de Minas, a soma da falta de dinheiro com a saída das duas médicas cubanas foi suficiente para levar ao fechamento de um dos três postos de saúde da cidade na segunda-feira. “O Estado nos deve R$ 1,3 milhão. Para nós, isso é muito dinheiro. Decretamos até estado de calamidade financeira”, afirma a secretária de Saúde da cidade, Mírian Rodrigues.
Em nota, a Secretaria de Estado de Saúde admitiu ter uma dívida de R$ 2,8 bilhões com os municípios em função de insuficiência de receita. A pasta garantiu que “o governo está se esforçando para honrar os compromissos pactuados”.
Secretário relata desistências
Brasília. Às margens do rio Tocantins, Cametá, no Pará, com 120 mil habitantes, viu na última semana cinco de 20 médicos deixarem o atendimento nas unidades de saúde.
A saída ocorreu após o fim da participação de Cuba no Mais Médicos. Poucos dias depois, recebeu cinco inscrições de profissionais dispostos a ocupar as vagas. O alívio, porém, durou pouco. Segundo o secretário municipal de Saúde, Charles Tocantins, dois dos médicos inscritos que fizeram contato com a prefeitura disseram que não devem ocupar as vagas.
“Um disse que era difícil de cumprir o horário e de se deslocar. O outro deve sair para fazer residência no ano que vem”, relata. Para ele, a situação mostra um outro lado da ampla adesão ao edital lançado pelo Ministério da Saúde.