Estar dentro da própria casa e ter receio até mesmo de ir à cozinha para beber um copo d'água. Há cerca de dois anos, a dona de casa Márcia Salles, de 57 anos, vive neste drama. Moradora do bairro Colégio Batista, região Nordeste de Belo Horizonte, ela denuncia uma onda de invasões às casas do bairro, que deixa os moradores acuados e com medo.
A mulher denuncia que, desde quando se mudou para o bairro, no fim de 2022, tem sofrido com o problema. Ela já teve itens furtados cinco vezes, sendo que, em três, os criminosos invadiram a residência onde ela vive com o filho.
"Eles são muito discretos, a gente só vai perceber depois que a gente está mexendo em alguma coisa. Eles pulam a qualquer hora do dia ou da noite, de madrugada, de manhã. Eles passam, olham, depois voltam. Se não tem ninguém por fora da casa, eles entram", descreve.
Uma das invasões aconteceu no exato momento em que o filho de Márcia, que pediu anonimato, estava em casa. Foi tão silencioso que ele nem percebeu o perigo que correu. "Ele teve a audácia de pular enquanto eu estava na sala tomando café, não vi no momento. Fomos ver depois nas câmeras e com essas imagens podíamos ver que enquanto ele pulava o muro e roubava o que ele queria roubar, eu estava aqui tomando café. Se ele estivesse armado, poderia me fazer de refém, poderia entrar na casa", comenta.
De frente para a casa de Márcia e do filho, há um prédio que também sofre com invasões de criminosos. O problema atormenta os condôminos desde 2014 e, após um longo período de calmaria, voltou à tona.
"Aqui, infelizmente, é um prédio muito antigo, que não tem vaga de garagem para todo mundo, então normalmente alguns carros têm que ficar na rua. Então na hora que estamos dormindo, aí eles aproveitam, arrombam, entram dentro de casa. Aqui no prédio, por exemplo, some mangueira que fica no jardim, coisas que ficam no jardim costumam sumir", relata.
Falta de policiamento no bairro
Segundo Márcia Salles, o policiamento ostensivo no local é insuficiente. A moradora afirma que já solicitou melhorias às autoridades públicas, mas não teve o retorno esperado.
"Quando me mudei para cá, participei de uma reunião que estava discutindo isso. Foram prometidas motos, viaturas. Nos primeiros dias, aconteceu, motos passando, circulando, mas depois de um mês, um mês e meio, sumiram", afirma.
Para piorar, outra questão impede que Márcia tome medidas para inibir as invasões à própria casa. O imóvel, assim como outros da rua, está em processo de tombamento como patrimônio histórico e cultural pela prefeitura de Belo Horizonte. Dessa forma, a mulher fica com medo de construir, por exemplo, um muro mais alto, o que alteraria a fachada e a aparência da casa.
"A gente fica inseguro de até mesmo mexer nessa fachada para ter uma segurança maior e vir um fiscal e me dar uma multa altíssima. Isso também me impede até mesmo de colocar um muro alto de dois metros, três metros", lamenta a empresária.
Márcia fica com tanto medo de ser vítima de algo mais grave que teve que instalar câmeras de segurança dentro da própria sala. A mulher afirma que, mesmo dentro da própria residência - que deveria ser um local de segurança para ela e a família - se sente aprisionada. Uma simples caminhada do quarto até a cozinha se torna um momento de tensão.
"A casa é de dois andares e quando eu desço para tomar uma água, a minha preocupação já é acender todas as luzes para não me deparar com alguém. Estou sempre achando que vou ter alguém aqui, porque a casa é grande, pela acústica dela o som não passa. Eu tenho sempre medo de alguém entrar dentro da minha casa e me fazer mal, me roubar. Me sinto invadida", desabafa.
Questionada por O TEMPO sobre o tombamento do imóvel, a prefeitura de Belo Horizonte afirmou que a lei municipal dá ao Conselho Deliberativo do Patrimônio Cultural da cidade autonomia para determinar quais imóveis serão ou não tombados, e que lei permite o início do processo sem anuência do proprietário. A PBH ressalta que, em fases posteriores dos procedimentos, o proprietário é incluído e pode fazer suas considerações e, também, pedir permissão para alterar aspectos estruturais na edificação.
"Há a possibilidade de o proprietário solicitar autorização especial ao órgão de patrimônio, caso possa comprovar que a intervenção é necessária para garantir a segurança pública ou a integridade física dos moradores. Nesse sentido, o pedido será analisado, e o órgão poderá autorizar adaptações que atendam às necessidades de segurança, desde que as intervenções sejam compatíveis com a preservação do valor cultural do imóvel", explica a PBH, em nota.
Também procurada, para falar sobre a segurança na região, Polícia Militar de Minas Gerais disse em nota que vem intensificando os patrulhamentos ostensivos no bairro, por meio da Rádio Patrulha (RP), Patrulha de Operações (POP) e Moto Patrulhas (MP), além do apoio das viaturas do Tático Móvel (TM) da Base de Segurança Comunitária (BSC). A PMMG também disse que vai redirecionar ações para os locais alvos de reclamação dos moradores.
"Em decorrência dos recentes relatos de insegurança, o policiamento será direcionado de maneira estratégica e contínua, priorizando as áreas afetadas, com o objetivo de coibir práticas criminosas e proporcionar um ambiente mais seguro para todos os moradores", disse a corporação.