MEIO AMBIENTE

Projeto Apolo, da Vale, é debatido em meio a indefinições sobre reflorestamento e impactos climáticos

Empresa busca permissão para minerar às margens do Parque da Serra do Gandarela, entre as cidades de Caeté e Santa Bárbara

Por Rayllan Oliveira
Publicado em 22 de maio de 2024 | 16:49
 
 
 

Travado há 15 anos, o projeto Apolo, que permitirá a Vale minerar às margens do Parque da Serra do Gandarela, entre as cidades de Caeté e Santa Bárbara, avança para mais uma fase: a de debate do plano para o governo liberar a licença prévia. O empreendimento ainda tem pontos a serem definidos, como a compensação ambiental pela supressão da vegetação em uma planta de 13 quilômetros quadrados, área maior do que a região central de Belo Horizonte. A promessa da empresa é de compensar até três vezes a cobertura suprimida, porém, a indefinição quanto ao local preocupa ambientalistas. Eles temem uma maior exposição da região aos eventos climáticos extremos, como a chuva intensa e o forte calor. 

O Estudo e Relatório de Impacto Ambiental (EIA/Rima), protocolado na Secretaria de Estado de Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável (Semad) em setembro do ano passado, prevê que o espaço de biodiversidade seja substituído por áreas lavradas, com pilhas de estéril, prédios industriais e diques. Esse é um dos pontos discutidos nas audiências públicas, que estão em andamento nesta quarta-feira (22 de maio) e amanhã (23), nas cidades de Santa Bárbara e Caeté. 

O diretor de licenciamento ambiental da Vale, Lauro Amorim, explica que esse diálogo deverá ser mantido com a comunidade em todas as etapas e que há previsão de reflorestamento. “Teremos uma compensação, a revegetação progressiva, a aplicação de um produto para evitar a emissão de particulados. No fim do período de exploração (cerca de três décadas) teremos o fechamento da cava que foi aberta”, garante.  

A definição do local de compensação, segundo ela, será feita junto aos órgãos públicos. O Código Florestal Ambiental Brasileiro determina que a compensação seja feita em uma área próxima à bacia hidrográfica da região onde houve o desmatamento. Ou seja, pode acontecer em outras cidades e regiões do Estado, o que preocupa ambientalistas. "O ideal seria que fizessem a compensação ambiental nas áreas de entorno da intervenção do empreendimento, com espécies nativas do bioma, proporcionando a restauração florestal", afirma a bióloga, engenheira ambiental e doutora em recursos hídricos Fernanda Raggi. 

Segundo ela, o desequilíbrio causado na área com a vegetação retirada pode impactar no clima da região. "O desmatamento provoca um desequilíbrio no ciclo ecológico. As árvores que lá estão têm uma idade avançada, já estão fornecendo alguns serviços importantes como a umidade relativa do ar, abrigo para a fauna, desenvolvimento da flora, entre outros. Com a redução desses corredores ecológicos, reduz a qualidade do solo, compromete o processo de evaporação, podendo desencadear períodos de secas extremas e prolongadas", alerta.  

Vulnerabilidade das cidades

Minas Gerais já tem mais da metade das cidades vulneráveis aos eventos climáticos e sob risco de desastres naturais, como publicado por O TEMPO. São 437 municípios que convivem com risco elevado de tragédias ambientais, seja pelo calor ou pela chuva. O levantamento da Fundação Estadual do Meio Ambiente (Feam) mostrou que 82 cidades estão com vulnerabilidade extrema, 115 com muito alta e 240 com alta. Outros 320 municípios foram avaliados com risco moderado e 94 com relativamente baixo. 

O indicador serve como referência para ações de enfrentamento aos efeitos das mudanças climáticas para o governo do Estado. Conforme o estudo, as cidades de Caeté e Santa Bárbara, que devem ser impactadas pelo projeto da Vale, apresentam vulnerabilidade baixa. Barão de Cocais e Rio Acima, que são municípios próximos, apresentam vulnerabilidade moderada. A cidade de Raposos, também localizada nas proximidades, é a que apresenta vulnerabilidade muito alta.  

"É uma situação que preocupa, ainda mais neste momento em que o Rio Grande do Sul sofre com as enchentes. O relatório de impactos do Projeto Apolo mostra questões importantes em relação ao abastecimento, além dos riscos para a Serra", destaca a ambientalista Maria Teresa Corujo. Possíveis danos que, segundo a diretora de Políticas Públicas da SOS Mata Atlântica, Malu Ribeiro, alerta toda a sociedade. "A Serra da Gandarela está em uma região com um importante manancial. Portanto, precisa ser protegido para a segurança hídrica e do clima. Minas já sofreu muito com as atividades minerárias. A hora, agora, é de mudar", pontua.  

Área de preservação

O empreendimento será instalado na Zona de Amortecimento (ZA) do Parque da Serra da Gandarela, também chamada de “Zona Tampão”, que são áreas localizadas no entorno de uma Unidade de Conservação (UC). Nestes espaços, conforme previsto em lei, as atividades estão sujeitas a normas e restrições específicas, com o propósito de minimizar os impactos negativos sobre a Unidade de Conservação.

Segundo o Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio), do Governo Federal, o instituto ainda não recebeu o pedido de autorização para licenciamento ambiental do projeto e, por isso, irá participar das audiências públicas. "O licenciamento ambiental é de competência estadual, mas no âmbito do processo é necessário que o ICMBio autorize ou emita anuência para o avanço do projeto em função dos impactos ambientais no parque. Conforme previsto na Resolução Conama 428 de 2010", destaca, em nota.  

De acordo com o executivo da Vale, o órgão será procurado durante o processo de licenciamento. Amorim também afirma que o projeto atende parâmetros de sustentabilidade, com tecnologias para mitigar os impactos dos eventos climáticos. "Vamos fazer a redução de gás carbônico com o transporte em correias transportadoras e com veículos que consomem menos combustível. O minério que será extraído na região tem um teor de ferro interessante, que vai beneficiar a siderurgia, reduzindo também a emissão de gás carbônico", justifica. 

O executivo afirma que a empresa irá monitorar o material empilhado, que não é viável comercialmente, a fim de evitar impactos na natureza e fenômenos como erosão e contaminação do solo. "Será um monitoramento diário, com uma engenharia muito específica a ser implantada", finaliza. 

Audiências públicas 

O projeto Apolo é tema de audiências públicas nos dias 22 e 23 de maio (quarta e quinta). Essa é mais uma etapa de discussão do projeto que começou a ser elaborado em 2009 e precisou ser remodelado por causa da previsão de impactos socioambientais. Caso seja aprovado, a expectativa é de que a licença prévia saia ainda neste ano. Em seguida, a mineradora deverá protocolar o pedido da Licença de Instalação (LI), que autoriza o início das obras de implantação. 

O objetivo da empresa é investir mais de R$ 4 bilhões na área de 1.367 hectares, ou 13 quilômetros quadrados. O perímetro é superior ao tamanho da região central de Belo Horizonte, que tem 10 quilômetros quadrados. A mina terá capacidade de produzir 14 milhões de toneladas anuais de minério de ferro durante 29 anos.

+ Saiba mais sobre as audiências públicas e o projeto

Por meio de nota, a Secretaria de Estado de Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável (Semad-MG) informou que a mineradora possui dois processos de licenciamento relativos ao projeto Apolo em tramitação no Sistema de Licenciamento Ambiental – SLA.

Notícias exclusivas e ilimitadas

O TEMPO reforça o compromisso com o jornalismo profissional e de qualidade.

Nossa redação produz diariamente informação responsável e que você pode confiar. Fique bem informado!