Há mais de duas décadas, não são os corpos de “indigentes” – aqueles que não foram identificados nem reclamados no IML – que são usados para o estudo da medicina. O primeiro programa brasileiro de doação voluntária de corpos, o ‘Vida Após a Vida’, da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), está completando 25 anos de história com mais doadores cadastrados: o número triplicou desde 2017 – de cerca de mil para acima de 3 mil. A equipe, no entanto, reforça a importância de mais adesões, já que cada corpo é único para a ciência, com variações anatômicas, por exemplo. Saiba abaixo como se tornar um doador.
“Esse tipo de doação permite o desenvolvimento e a melhoria da sociedade como um todo. É essencial ter isso em mente, tanto na área da Medicina quanto na vida. No lugar do paciente, eu gostaria de ser operado por uma equipe treinada da melhor forma possível”, afirma o professor Daniel Bonomi, do Departamento de Cirurgia (CIR) da Medicina da UFMG. Os corpos doados são utilizados na formação dos estudantes e em pesquisas que procuram melhorar o cuidado médico no futuro.
Além das aulas de graduação, a faculdade também tem apoiado treinamentos para médicos residentes e especialistas em áreas como restauração da coluna lombar e cirurgia pélvica e vaginal reconstrutiva. Já foram 12 projetos realizados em parcerias que ocorrem junto a sociedades de especialistas, como a Sociedade Brasileira de Cirurgia de Cabeça e Pescoço (SBCCP) e a Associação Brasileira de Uroginecologia e Assoalho Pélvico (UROGINAP).
O professor Arthur Nicolato, do Departamento de Anatomia e Imagem (IMA), explica que o “Vida Após a Vida” resolveu uma demanda reprimida por corpos para atividades de ensino, pesquisa e extensão na Universidade. “Esses treinamentos de alta qualidade trazem recursos e equipamentos para o laboratório, subsidiando outras atividades, como as de graduação. Não conseguiríamos alcançar tanta excelência de outra forma”, explica.
A doação é totalmente voluntária e manifestada pelo doador ainda em vida. Após a morte do paciente, no entanto, depende da família acionar a Faculdade de Medicina da UFMG. A instituição, inclusive, cobre os custos de traslado dos corpos.
Nova tecnologia
A UFMG é a única instituição de ensino pública no Brasil a utilizar a tecnologia de “fresh frozen cadaver”, que mantém a conservação dos corpos em câmaras de baixas temperaturas. Diferente da conservação em formol, método mais comum, os corpos recebidos pela UFMG são rapidamente congelados após o óbito, garantindo maior integridade dos aspectos biológicos para pesquisas e aulas.
Segundo o professor Kennedy Martinez, do Departamento de Anatomia e Imagem (IMA) e coordenador do 'Vida Após a Vida', a preservação com cadáveres frescos é inestimável para a ciência e o ensino, pois permite o desenvolvimento de técnicas que não podem ser praticadas em manequins ou animais. “O ganho é imensurável para a ciência e o ensino”, comenta.
Iniciativa já começou de forma voluntária
A história do Programa começou em 1999, quando a Faculdade de Medicina foi procurada por uma senhora cuja tia, em fase terminal de uma doença grave, desejava doar seu corpo para fins de ensino. Na época, a Universidade havia recebido apenas um corpo dez anos antes, em circunstâncias semelhantes. Com o aval do Conselho Universitário e da Procuradoria da UFMG, a Faculdade aceitou a doação e iniciou uma campanha para cadastrar mais interessados, tornando-se o primeiro programa de doação voluntária estruturado no país.
Com a doação, famílias podem se despedir dos parentes?
Desde 2019, os familiares dos doadores podem prestar homenagens aos entes queridos no Cemitério da Saudade, em Belo Horizonte, em um espaço doado pela Prefeitura. A lápide no local celebra o ato nobre dos doadores com a inscrição: “Agradecimentos e homenagens jamais estarão à altura de seu altruísmo”.
Como ser um doador?
Não há pré-requisitos ou contraindicações para a doação. Qualquer pessoa maior de 18 anos pode doar o corpo, preenchendo e assinando o Termo de Doação na Faculdade de Medicina da UFMG, ainda em vida, com a assinatura de duas testemunhas. Menores de 18 anos podem doar com o consentimento da família.
É realizada uma entrevista com o doador para informá-lo sobre todos os procedimentos. O Programa aceita doadores de Belo Horizonte e outras cidades de Minas Gerais. Se o óbito ocorrer em outro estado, um programa de doação ligado à universidade mais próxima pode ser acionado para efetuar a doação. Tire suas dúvidas no site da universidade (clique AQUI).
(Com assessoria da Medicina UFMG)