O atendimento pediátrico nos plantões noturnos das Unidades de Pronto Atendimento (Upas) Pampulha, Nordeste e Leste, em Belo Horizonte, sofreu uma redução de profissionais especializados neste mês de agosto. A prefeitura da capital demitiu três pediatras contratados para reforçar o enfrentamento às doenças respiratórias nas Upas. O trabalho dos médicos reduziu o tempo de espera nas filas do Sistema Único de Saúde (SUS) por cerca de quatro meses, entre abril e julho. Se, de um lado, o Executivo argumenta que a demanda baixou, de outro, a categoria denuncia sobrecarga de serviço e aumento da espera pelos pacientes.

Em Belo Horizonte, as doenças respiratórias demandaram 450.801 atendimentos na rede SUS de janeiro até julho deste ano. Ou seja, foram ao menos 15 mil por semana, o mesmo que 87 consultas por hora na capital. Os números, disponibilizados pela Secretaria de Saúde, são referentes à população como um todo. As crianças, no entanto, são mais vulneráveis a desenvolverem complicações, como a pneumonia: de janeiro à última quarta-feira (21 de agosto), 983 crianças e adolescentes – de 0 a 14 anos – foram internados por causa da doença em BH, o mesmo que cinco hospitalizações por dia.

O argumento do Sindicato dos Médicos de Minas Gerais (Sinmed-MG) é que o serviço pediátrico, quando funciona com dois médicos especialistas por plantão, já está sobrecarregado. Segundo o diretor jurídico do Sinmed, Marconi Soares de Moura, a retirada do terceiro profissional agrava um sistema que atua a partir da instabilidade. “Mesmo que tenha ocorrido queda de atendimentos, não houve redução viral, não saímos do período ruim. Estamos, ao contrário, enfrentando tempo seco prolongado e má qualidade do ar por fumaças de incêndio junto com as infecções virais. O que indigna é essa necessidade que o sistema tem de trabalhar sobrecarregado, quando há outra opção”, denuncia.

Na avaliação de Soares Moura, falta coesão na gestão de saúde. Ele defende que há oferta de pediatras para resolver um problema de demora de atendimento histórico das Upas, mas reduzir o quadro de profissionais é tomar o caminho contrário. “Dois pediatras por plantão é déficit. O resultado é falta de disponibilidade de atendimento às crianças nos postos, um pediatra tendo que cobrir duas unidades de saúde, médicos sem especialização fazendo serviço de pediatria, uma fila de pacientes que cresce junto com a insatisfação”, diz.

O receio da categoria é que o empenho de contratação, que foi temporário, tenha efeito contrário. “O profissional que foi desligado agora vai procurar outra oportunidade. O profissional que ficou vai querer sair, porque ele tem trabalho acumulado e perde a esperança de melhoria”, continua Marconi.

Conforme a Prefeitura de Belo Horizonte (PBH), o habitual em todas as Upas da cidade são dois pediatras por plantão. A contratação do terceiro profissional nas unidades Leste, Nordeste e Pampulha ocorreu de forma temporária devido ao “período de sazonalidade das doenças respiratórias”. “O reforço no número de profissionais buscou garantir assistência em tempo oportuno às crianças. Com a redução na demanda por atendimento pediátrico nas UPAs, especialmente no período noturno, o município retornou com a estratégia de manter dois pediatras por plantão”, afirma o Executivo.

A pasta de Saúde reforçou que, mesmo com as demissões, monitora continuamente os dados assistenciais da pediatria e, havendo aumento na demanda, “o município implementará as medidas necessárias para garantir atendimento de forma ágil”. Para o Sinmed, a justificativa não se mantém. “A diminuição da demanda é tão temporária quanto o pico da demanda. Não dá pra esperar acumular fila, impor sofrimento à população, para contratar de novo”, diz o diretor jurídico do sindicato.

Sobrecarga nas Upas reflete no sistema SUS-BH

O especialista em Políticas Públicas e Gestão Governamental, pesquisador da Fiocruz Minas, Fausto Pereira dos Santos, analisa que o excesso de demanda, quando não é suprido na Atenção Primária à Saúde, isto é, nas Upas e Centros de Saúde, é empurrado para outros equipamentos do SUS, gerando um efeito cumulativo.

“A falta de profissionais sempre tem efeitos. O primeiro é obrigar a população a se deslocar mais, de uma Upa até outra, ou até um hospital, na tentativa de conseguir atendimento. Assim, essa demanda reprimida vai gerar sobrecargas em outras unidades de saúde. Isso alonga o tempo de espera e causa queda na qualidade da assistência”, pondera.

De acordo com Pereira, no caso da pediatria, o atendimento a bebês e crianças precisa funcionar de forma ágil. “A criança pode ter um agravamento de quadro muito mais rápido comparado a um adulto. Ela não pode perder a oportunidade de atendimento”, diz. “Estamos em um período de atenção pelas bruscas mudanças de temperatura que a capital tem passado. O período de aulas também é propício para a transmissão de infecções”, acrescenta.