Prescreveram na Justiça parte dos crimes pelos quais foram denunciados Marcelo Simões Dayrell e Francielle Fernanda Quirino dos Santos. O casal de veterinários - que chegou a ser preso pela Polícia Civil - era dono da clínica Animed, localizada em Nova Lima, na região metropolitana de Belo Horizonte. Em 2019, eles foram acusados de congelar animais mortos para continuar cobrando diárias na clínica e, até mesmo, de retirar sangue dos pets clandestinamente para comércio.
Em decisão proferida no último dia 14 de março, a juíza Anna Paula Vianna Franco, da 1ª Vara Criminal e da Infância e Juventude de Nova Lima, julgou extinta a "punibilidade dos réus" - que incluem os dois veterinários e outras oito pessoas, além da própria clínica. Como previsto no código penal, crimes com pena máxima inferior a 2 anos deixam de valer após quatro anos. Com isso, prescreveram 11 crimes de maus tratos; quatro crimes de infração de medida sanitária preventiva e 13 de exercício ilegal da arte farmacêutica.
"Lamentavelmente, operou-se o instituto da prescrição, eis que, entre a data de todos os fatos acima mencionados e o efetivo recebimento da denúncia, transcorreu, conforme dito alhures, o prazo de quatro anos", escreveu a magistrada em sua decisão.
Segundo a advogada Renata Alves Passos, que representa os tutores de parte dos animais vitimados na clínica, a extinção da punição só ocorreu porque os crimes aconteceram antes da criação da Lei Sansão, criada pelo deputado federal Fred Costa (PRD) em 2020 e que elevou para 2 a 5 anos de prisão a pena para o crime de maus-tratos.
"Se os crimes de maus-tratos tivessem ocorrido já no vigor da lei Sansão, ou seja, após setembro de 2020, essa prescrição só aconteceria após 12 anos. Mas, como a lei penal não retroage, eles só podem responder pela lei vigente na época dos crimes", lamenta a representante de algumas vítimas.
Procurado, o deputado federal Fred Costa destacou que acompanhou o caso na época, auxiliando inclusive na coleta de provas para o caso. "É lamentável que profissionais que têm por função zelar, cuidar e salvar a vida dos animais, tenham sido protagonistas em um caso de maus-tratos. Quando você leva seu pet a um centro médico veterinário, espera que ali tenha um cuidado máximo com o seu animal. Praticar maus-tratos em um local desses é ainda mais grave do que o abominável crime praticado por qualquer cidadão. E eles passarem impunes por este crime é revoltante, além de um risco ainda maior para a sociedade", criticou.
O parlamentar também destacou a importância da lei Sansão para evitar que isso volte a acontecer no futuro. "Essa é a demonstração inequívoca da importância da lei Sansão, uma vez que, se os crimes tivessem ocorrido após ela, eles certamente não teriam a prescrição do crime e a chance deles serem presos na sentença era enorme", completou Fred Costa.
Veterinários ainda serão julgados por outros crimes
Entretanto, conforme a advogada Renata Alves, os réus ainda responderão por outros crimes mais graves. "Eles também foram denunciados por crimes como estelionato e organização criminosa, que têm penas grandes, portanto, uma série de crimes que não estão prescritos", completou a advogada.
Procurado, o advogado Frederico Thadeu Torres, que representa os veterinários, informou por nota que a decisão que reconheceu a prescrição de parte dos crimes era "esperada". "(A decisão) não implica em qualquer privilégio, mas trata-se de mera aplicação da lei. Afinal, a acusação trazia à tona fatos antigos, que sequer configurariam maus-tratos ou qualquer outro crime", escreveu.
A defesa de Marcelo e Francielle também disse ter "firme convicção" de que será comprovado que os dois foram "vítimas de uma série de denúncias infundadas que ganharam desmedida desproporção em função de um grande sensacionalismo criado em torno dos fatos".
"Estamos desolados com isso", diz uma das vítimas
Ouvido nessa quinta-feira (27 de março) pela reportagem de O TEMPO, o policial civil Bruno Monteiro Vasconcelos, de 43 anos, que é tutor de um dos animais afetados pela clínica, disse que as vítimas receberam a notícia da prescrição de parte dos crimes dos suspeitos "com muita tristeza".
"É um caso que a gente brigou bastante para que tivesse uma investigação muito grande. Era, inclusive, a maior apuração da Delegacia de Meio Ambiente, com um inquérito com muitas provas. Então, a gente fica desolado, pois a gente recorre à Justiça e ela não anda. Nós, vítimas, ficamos em cima várias vezes para não deixar prescrever, peticionamos diversas vezes. Fizemos até uma petição à corregedoria, pois a juíza estava demorando a receber a denúncia. Fomos na promotora para informar que o processo estava devagar e, aí, acontece isso", reclama o policial.
Por outro lado, Bruno lembra que existem outros crimes graves que ainda serão julgados. "Além do estelionato e outros crimes, temos também as infrações ambientais. Ele colocava lixo hospitalar no meio do lixo comum, durante anos. Com isso, ia pata de animal, corpo de bicho, sangue, seringa contaminada, tudo para o lixão de Nova Lima. Isso contamina os lençóis freáticos e prejudica toda a população da cidade. São crimes gravíssimos que, se a juíza não se atentar, também vão prescrever", alerta o tutor de um dos cães.
Veterinários atendem em BH com nome "diferente"
Apesar de terem sido presos na época da investigação e, até mesmo, terem sido condenados pelo Conselho Regional de Medicina Veterinária (CRMV), em 2021, atualmente, segundo o tutor Bruno Monteiro, o casal Marcelo Dayrell e Francielle Quirino seguem atuando em uma clínica veterinária localizada no bairro São Bento, na região Centro-Sul de Belo Horizonte.
Segundo a advogada Renata Alves Passos, que representa algumas vítimas, eles não estariam cometendo nenhum crime por atenderem no local, uma vez que recuperaram os seus registros como veterinários. "Porém, a população tem o direito de saber a quem eles vão confiar os seus animais de estimação. Digo isso pois eles estão atendendo com nomes diferentes dos que usavam na época dos crimes", argumenta.
Os veterinários, que eram conhecidos como Marcelo Dayrell e Francielle Quirino, agora estariam atendendo no local sob os nomes de Marcelo Simões e Fernanda Quirino. Por nota, o advogado Frederico Thadeu Torres, que representa os veterinários, afirmou que, recentemente, o CRMV analisou parte das denúncias e entendeu que não havia qualquer empecilho para atuação deles. "O Conselho Regional de Medicina Veterinária analisou algumas dessas denúncias (...) e entendeu que não há qualquer empecilho para que Marcelo e Francielle continuem a ter o direito de trabalhar e exercer com orgulho a honrosa profissão de médicos veterinários", argumentou.
Leia a nota da defesa dos suspeitos na íntegra:
"A defesa de Marcelo Dayrell e Francielle Quirino informa que os veterinários são
vítimas de uma série de denúncias falsas, disseminadas com intuitos escusos. A Animed Hospital Veterinário sempre seguiu rigorosamente todos os preceitos éticos e pauta sua atuação pelo bem-estar animal.
Para demonstrar isso, relatamos os fatos a seguir:
1 – Como comprovação de que os veterinários respeitam os preceitos éticos de
sua profissão, poucos dias antes da ação da Polícia, em 18/11/2019, o próprio Ministério Público, em reconhecimento à excelência e credibilidade da Animed, havia formalizado pedido para que o Hospital Veterinário atendesse gratuitamente cães vítimas de maus tratos e que tinham sido apreendidos em locais de rinha. O pedido foi atendido e os animais foram tratados gratuitamente, tendo sido certificado por servidor do Ministério Público que foram devolvidos em excelente estado de saúde.
2 - O animal que o Ministério Público alega ter sido vítima de maus tratos,
conforme relatado pela própria perita da acusação, era um animal de rua, que havia sido abrigado pelo Hospital, tratado, alimentado, castrado, vacinado, vermifugado e, posteriormente, acolhido por uma família que o adotou. Ressalte-se que a própria perita afirma em seu laudo que ele estava bem nutrido, mas alega que havia maus tratos por não haver grama e brinquedos no local em que ele encontrava. Tal perita, porém, nunca havia feito trabalho semelhante antes, conforme ela própria afirmou em seu depoimento, sendo assim, inexperiente nesse serviço. Outra perita analisou o laudo e detectou inúmeras falhas, sendo certo que o animal em questão não estava em situação de maus tratos, antes pelo contrário, encontrava-se muito bem cuidado.
3 - Em relação ao cachorro Rambo, ao contrário do informado em algumas
matérias, o cão não tinha um problema simples, mas sim uma ruptura do ligamento cruzado cranial do joelho, associada a displasia coxo femural; além de doenças transmitidas por carrapato, tais como Anaplasmose e Erlichiose. Logo, as patologias do animal eram graves, exigindo complexo tratamento cirúrgico para correção da ruptura do ligamento, além do tratamento medicamentoso para as demais patologias.
4 - Em que pese a cirurgia ter sido feita de forma exitosa, seguindo todos os
critérios técnicos, o cachorro foi retirado da clínica – pelo seu tutor - antes mesmo de sua alta. Além disso, na casa de seu tutor, as recomendações imprescindíveis ao sucesso do pós-operatório não foram seguidas. Não foi feita a higienização correta da ferida, nem o repouso recomendado. Ademais, o colar elisabetano (que serve para impedir lambeduras na ferida cirúrgica) foi utilizado de maneira inadequada. Assim, após a falta de cuidado adequado pelo dono e o excesso de lambedura do cão na ferida, houve ruptura dos pontos e infecção no local, o que comprometeu todo o trabalho cirúrgico desenvolvido.
5 - Insatisfeito, o sr. Bruno Monteiro iniciou uma verdadeira campanha de
difamação contra o Hospital Veterinário, que, para se defender, processou tal pessoa. A Justiça, então, chegou a deferir liminar para impedir que ele continuasse com sua campanha de fake news, sob pena de multa. Lamentavelmente, a decisão judicial não foi respeitada, pois Bruno passou a se valer de terceiros para disseminar as notícias falsas. Há, inclusive, dentro do inquérito policial em curso, depoimentos de testemunhas que afirmam que Bruno tentou convencê-las a depor contra Marcelo.
6 - Ressalta-se, ainda, que Bruno Monteiro move ação em que requer em torno
de R$ 75.000,00 de danos morais/materiais do Hospital Veterinário, bem como tentou se eleger vereador com discursos afetos à nobre causa animal. Portanto, as ações do principal denunciante são pautadas, sobretudo, em interesse pessoal, financeiro e político.
7 - Não bastasse isso tudo, Marcelo e Francielle, pouco depois das sucessivas
vitórias que obtiveram no TJMG em decisões que lhes permitiram continuar a exercer a profissão, passaram a ser vítimas de maneira ainda mais intensa de uma desenfreada perseguição, pois diversos folders com imagens pejorativas de suas pessoas e dizeres sensacionalistas começaram a ser espalhados pela cidade. O que mais impressionou foi o fato de tais imagens conterem fotografias e registros exclusivos dos Sistemas de Segurança pública, ou seja, não seriam acessíveis por quaisquer pessoas. Diante disso, foi apresentada representação criminal contra o Bruno Monteiro pelo crime de stalking e o próprio Ministério Público determinou a instauração de Inquérito Policial para apuração do fato. Esse inquérito avançou (0229611-36.2022.8.13.0024) e nele ficou constatado diversos acessos de Bruno Monteiro ao sistema de segurança pública que
continha as imagens divulgadas indevidamente e de forma pejorativa contra Marcelo.
8 - Marcelo e Francielle reafirmam nunca terem praticado qualquer ato de maus
tratos contra os animais. Pelo contrário, sempre foram reconhecidos por abrigar cães de ruas, fazer feiras de doações etc.
9 - Em relação à cadela Malu, a defesa informa que ela chegou na Animed
Hospital Veterinário com politraumatismo e 9 fraturas, após ter sido gravemente
atropelada na cidade de Lagoa da Prata. Ressalta-se que, antes de chegar na Animed, a cadela havia percorrido mais de 200 Km até BH e, ainda, teve seu atendimento recusado em outras clínicas, pois elas disseram que o caso era de alta complexidade e que não teriam estrutura para atendê-la. Depois de tudo isso, a cadela foi levada até a Animed, onde foi submetida ao tratamento inicial. Antes, porém, que o hospital concluísse todos os procedimentos necessários, o tutor foi persuadido por terceiros a retirá-la da clínica e levá-la para tratamento em outro local, sendo que nesse outro local ela veio a óbito.
Além disso, o tutor da referida cadela veio a ser condenado pela Justiça a pagar a pagar danos morais de R$ 2.500,00 em favor da Animed e de R$ 5.000,00 em favor de Marcelo Simões Dayrell pelos excessos em suas postagens e publicações (Processo n.º 5001707-65.2019.8.13.0372).
10 - No que diz respeito ao congelamento de animais, a defesa informa que esse
é o procedimento padrão exigido pela vigilância sanitária e utilizado para evitar a
decomposição do cadáver do animal, até que seja dada a devida destinação final que o tutor deseja. Tal prática é corriqueira em todos os hospitais veterinários e até mesmo humanos. Ademais, conforme nota emitida pelo Conselho de Medicina Veterinária, não existe qualquer substância que injetada no cadáver pudesse retorná-lo a um estado de morte mais recente, pois nele sequer há circulação sanguínea.
Enfim, a defesa reafirma que as denúncias contra os acusados são fruto de sensacionalismo e não possuem embasamento. Por isso mesmo, desde novembro de 2020, o Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais, ao analisar recurso defensivo, autorizou que os veterinários voltassem a exercer a profissão. A decisão foi tomada pelo experiente Desembargador Eduardo Brum e seguida à unanimidade pelo seus pares.
Em síntese, a turma julgadora ressaltou que, mesmo após um ano de intensas
investigações, nem mesmo o Ministério Público foi capaz de apresentar, de forma
segura, provas da existência dos crimes alegados e, por essa razão, permitiu-se que Marcelo continuasse a exercer sua profissão.
Importante frisar, por fim, que todos os laudos periciais feitos pela polícia civil
nos equipamentos apreendidos na clínica, até o momento, foram categóricos em
afirmar que não foi encontrado qualquer indício dos delitos investigados. Tudo isso somente reforça a tese defensiva de que todas as denúncias formuladas contra os envolvidos são infundadas, sendo certo que será comprovada a inocência de ambos.
As mesmas denúncias também foram analisadas, em sede de ação civil pública,
por outra turma julgadora, no âmbito do TJMG, tendo sido, igualmente, assentado não haver provas mínimas de maus-tratos, dano ambiental ou qualquer outro ilícito que justificasse bloqueio de bens dos investigados. Até o momento, portanto, as falsas denúncias já foram analisadas por 6 expedientes Desembargadores do TJMG, sendo certo que nenhum deles detectou provas mínimas das falsas acusações levantadas contra Marcelo e Francielle.
Recentemente, o Conselho Regional de Medicina Veterinária analisou algumas
dessas denúncias e, ainda assim, do mesmo modo que o Tribunal de Justiça, entendeu que não há qualquer empecilho para que Marcelo e Francielle continuem a ter o direito de trabalhar e exercer com orgulho a honrosa profissão de médicos veterinários.
A decisão recentemente tomada no processo criminal que reconheceu a prescrição de alguns delitos que eram atribuídos à Marcelo era esperada e não implica em qualquer privilégio, mas trata-se de mera aplicação da lei. Afinal, a acusação trazia à tona fatos antigos, que sequer configurariam maus-tratos ou qualquer outro crime.
Além disso, nesta nova etapa processual serão ouvidas as testemunhas e
produzidas as provas solicitadas pela defesa . Assim, os advogados de Marcelo e
Francielle têm a firme convicção de que será comprovado cabalmente que ambos foram sim vítimas de uma série de denúncias infundadas que ganharam desmedida desproporção em função de um grande sensacionalismo criado em torno dos fatos."