20 de outubro de 2022. Uma comitiva oficial de 31 bispos de Minas Gerais e do Espírito Santo chegava ao ponto alto da tradicional visita quinquenal ao Vaticano — a Ad Limina Apostolorum. Após celebrarem missas nos túmulos dos apóstolos Pedro e Paulo, era o momento do encontro com o papa. Francisco recebeu os religiosos com cordialidade e cumprimentou todos os que lhe foram apresentados, dirigindo um olhar acolhedor à única mulher presente no local. Com bom humor, brincou: se os outros eram bispos, “ella es la bispa”, disse.
O bom humor direcionado à jornalista mineira Janaina Santos, responsável por reportar o evento, foi a deixa para que ela aproveitasse os minutos de tête-à-tête com o papa Francisco. A profissional entregou ao pontífice uma revista sobre pessoas migrantes e refugiadas — um trabalho seu que recebeu o Prêmio de Comunicação da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB). “Eu estava apenas acompanhando os religiosos, mas Francisco me tornou parte do grupo, me chamou de ‘La Bispa’, me escutou. Eu, a única mulher, uma mulher preta, entre mais de 30 bispos e 20 convidados homens”, lembra Janaina.
A jornalista Janaina Santos entre os bispos e religiosos convidados da visita Ad Limina Apostolorum em 2022 / Foto: Vatican Media
A essa altura, a profissional já se sentia agradecida pela troca com o papa, mas Francisco fez ainda mais e quebrou um protocolo. Como o encontro era destinado aos bispos, Janaina recolheu-se ao fundo da sala para acompanhar a bênção final. Cercado por dezenas de religiosos, o pontífice, no entanto, a procurou com o olhar e perguntou: “Onde está a ‘Bispa’?”.
“Foi muito significativo. Demorou a cair a ficha. Eu, no fundo da sala, e ele estendendo a mão para que eu me aproximasse. O papa me chamou para o centro e realizou a bênção final comigo entre os bispos. Eu me senti vista, acolhida”, lembra Janaina.
Papa Francisco estende a mão para chamar por Janaina Santos (22/10/22). Foto: Vatican Media
Para a profissional, a experiência única que teve com o pontífice Francisco reforça a imagem de “Papa dos excluídos”. “Para mim, o papa Francisco reformou a estrutura da Igreja. Ele foi incansável em acolher os pobres, os migrantes e as minorias sociais. No nosso encontro, ele percebeu uma mulher preta em um grupo majoritariamente de homens e a colocou no centro. Ele tinha um olhar diferenciado, costumava dizer que a Igreja era uma mãe. Só temos a agradecer pela movimentação que causou na Igreja”, diz.
Antes do falecimento de Francisco, Janaina ainda se encontrou com ele uma última vez, em junho do ano passado, como diretora de comunicação da Conferência Eclesial da Amazônia. Na ocasião, presenteou o papa com o livro "Vozes de Esperança na Amazônia – Perspectivas e Desafios Cinco Anos Depois do Sínodo", outro fruto de seu trabalho, e saiu com terços abençoados por ele. “O papa já estava mais debilitado, mas muito consciente sobre a situação da Amazônia. Ficar próxima a ele por uma reunião inteira, escutando-o falar, foi uma experiência muito rica. É triste a perda, mas Francisco deixou um legado para a humanidade”, opina.
Papa Francisco é velado
Aos 88 anos, o papa morreu por AVC e insuficiência cardíaca na última segunda-feira (21). Neste ano, o pontífice lutou contra uma infecção que resultou em um quadro respiratório grave.
O velório foi aberto ao público às 6h (no horário de Brasília). Cerca de 20 mil pessoas esperavam a chegada do corpo do papa na Praça de São Pedro para se despedir, segundo o Vaticano.
O caixão será fechado às 15h desta sexta-feira (25). O rito de fechamento será presidido pelo cardeal Kevin Joseph Farrell. No sábado (26), o cardeal italiano Giovanni Battista celebrará a missa de corpo presente, uma cerimônia de despedida. Após o sepultamento de Francisco, haverá nove dias de luto e orações. (Com AFP)