No ano em que se completam 10 anos do rompimento da barragem de Fundão, em Mariana, na região Central de Minas Gerais, o Conselho de Política Ambiental (COPAM) do governo de Minas aprovou, nesta sexta-feira (27 de junho), a licença ambiental para o Projeto de Longo Prazo da Samarco, empresa responsável pelo crime ambiental. O plano prevê a ampliação do Complexo Germano da mineradora, com a instalação de duas novas pilhas de estéril e rejeito com mais de 200 metros de altura e a construção de estruturas para uma transportadora de correia de longa distância, estruturas que poderão afetar diversas comunidades, entre elas o Novo Bento Rodrigues, construído após o antigo distrito ser completamente engolido pela lama em 2015. 

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Além das duas pilhas e da correia transportadora de minério, a mineradora ainda pretende ampliar a pilha de rejeitos já existente no empreendimento e, ainda, depositar rejeitos em uma cava confinada. Em Mariana, a ampliação do complexo ocorrerá nas proximidades das comunidades de Camargos, Santa Rita Durão, Bento Rodrigues (território de origem, atingido pelo rompimento) e o reassentamento da população do distrito, conhecida como Novo Bento Rodrigues. 

Entretanto, segundo o Instituto Cordilheiras, os impactos não se restringem ao município, já que Antônio Pereira, distrito de Ouro Preto, e Morro D'Água Quente, em Catas Altas, também poderão ser afetados. 

"A Samarco ceifou vidas, destruiu nosso lugar, nossos sonhos e ninguém pagou por isso. Agora querem terminar de destruir o pouco que nos sobrou? Cadê os órgãos ambientais para fazer o que precisa ser feito? Cadê a Justiça para impedir esse projeto que quer nos tirar o pouco que nos sobrou? O Bento mesmo destruído continua sendo o melhor lugar do mundo. Não ao Projeto Longo Prazo da forma que está sendo proposto”, disse Mônica Santos, moradora de Bento Rodrigues e assessora técnica.

Aprovação por unanimidade

Após mais de uma hora de deliberação, com falas de diversos conselheiros e de inscritos, o projeto da Samarco foi aprovado com unanimidade, com 12 votos favoráveis, inclusive das entidades da sociedade civil ambientalistas que integram o Copam: o Instituto Heleno Maia de Proteção à Biodiversidade (IHMBio) e o instituto Zeladoria do Planeta. 

A professora de Arquitetura e Urbanismo da Universidade Federal de Ouro Preto (UFOP), Flora Passos, que vem acompanhando as comunidades atingidas em Mariana desde o rompimento, foi uma das pessoas que se inscreveram para falar durante a reunião. Em sua participação, ela denunciou os impactos principalmente das pilhas de rejeitos e da correia transportadora nas comunidades mais próximas, de Camargos e Bento Rodrigues. 

"A Pilha de estéril PDR-M é muito próxima ao território de origem de Bento Rodrigues, que é um território que tem deliberação de tombamento do núcleo e já tem o tombamento da igreja das Mercês em nível estadual. É um território que vem sendo apropriado pela comunidade desde o rompimento, com sepultamentos, festividades religiosas, celebrações, encontros que acontecem e vão continuar acontecendo sempre. Essas pessoas (moradores de Bento) têm uma relação de pertencimento com aquele território, e essa pilha está muito próxima do acesso principal ao território de origem e da estrada que leva ao reassentamento coletivo", denunciou durante a audiência. 

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Violação ao direito de não-repetição

Em sua fala, a professora também citou um argumento reafirmado pelo Instituto Cordilheira, de que a aprovação do projeto viola a legislação internacional da Corte Interamericana de Direitos Humanos, que prevê o direito e garantia à não-repetição de danos às comunidades e territórios atingidos.

"As comunidades não foram devidamente informadas, o que fere o princípio do direito à informação, no direito ambiental. A comunidade de Bento Rodrigues, que é a proprietária dos terrenos no território atingido e está sendo reassentada nas proximidades, não foi considerada como comunidade atingida nos estudos que compõem o processo de licenciamento. As estruturas ameaçam, ainda, diferentes bens culturais do território, acautelados em diferentes instâncias", afirmou o Instituto Cordilheira em nota divulgada nesta sexta. 

O TEMPO procurou a mineradora Samarco e a Secretaria de Estado de Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável (Semad), mas, até a publicação da reportagem, nenhum posicionamento tinha sido recebido. As manifestações serão incluídas assim que foram recebidas.