Minas Gerais tem a maior fila do país por vaga em creches para crianças de 0 a 3 anos. De acordo com um estudo divulgado pela Todos Pela Educação, organização independente que atua em favor da educação no Brasil, 247 mil meninos e meninas nessa faixa etária aguardavam acesso a instituições de ensino no ano passado. Na Bahia e em São Paulo, que ficam em segundo e terceiro lugar entre os piores índices, as filas tinham, respectivamente, 220,5 mil crianças e 210,9 mil em 2024. Os dados também revelam que em todo o território nacional, apenas 41,2% dos pequenos estão em creches, número ainda aquém da meta prevista pelo Plano Nacional de Educação (PNE), de 50%. Minas Gerais está abaixo da média nacional, com uma taxa de 40%.

A pesquisa ainda escancara o aumento da desigualdade entre ricos e pobres. Se, em 2016, a diferença de acesso entre os 20% mais ricos e mais pobres era de 22 pontos percentuais (p.p), o número saltou para 29,4 p.p. Atualmente, somente 30,6% das crianças de 0 a 3 anos que estão entre as mais pobres são atendidas pela educação infantil, enquanto entre as mais ricas a taxa é de 60%.

Gerente de políticas educacionais do Todos Pela Educação, Manoela Miranda destaca que essa desigualdade é um fator muito preocupante. De acordo com ela, um dos motivos que levam as crianças mais pobres a não terem acesso às creches, além da própria falta de vagas, é a dificuldade de acessar as instituições de ensino nos territórios onde esses meninos e meninas estão inseridos. “A educação infantil é uma etapa fundamental para o desenvolvimento cognitivo, social e emocional das crianças. O acesso a uma educação infantil de qualidade é fundamental para o desenvolvimento pleno desde a primeira infância e é a porta de entrada da educação básica no Brasil”, destaca ela.

Essa dificuldade de acessar creches em seu território é realidade em diversos municípios de Minas Gerais. Ao todo, 55 municípios sequer têm creche pública para crianças de 0 a 3 anos, segundo dados do último Censo Escolar da Educação Básica, de 2024, divulgado pelo Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep). Além disso, um estudo do Gabinete de Articulação para a Efetividade da Política da Educação no Brasil (Gaepe-Brasil) revelou que 54% dos municípios mineiros não adotam critérios de prioridade no acesso às vagas. Ou seja, na maioria das cidades, crianças em situação de risco, com deficiência, filhas de mães solo ou adolescentes, cujos pais têm baixa renda, não têm preferência assegurada no atendimento. 

Essa falta de acesso a creches, segundo Manoela Miranda, pode ter efeitos negativos inclusive na fase adulta. Conforme ela ressalta, a educação infantil tem resultados positivos no desempenho no ensino fundamental, médio e na conclusão dos estudos. No entanto, diz a especialista, há impactos negativos quando não há um bom desenvolvimento e estímulos na primeira infância, podendo ter efeitos danosos para toda a vida.

“Sem investir em educação infantil de qualidade, com atenção especial para as crianças mais vulneráveis, que mais precisam desse serviço no Brasil, nós continuaremos privando muitas crianças e gerações inteiras de brasileiros do seu direito ao pleno desenvolvimento. Isso é inaceitável. Portanto, é fundamental que o avanço da educação infantil seja priorizado no Brasil”, diz ela.

Para Manoela, é essencial ter ações coordenadas, com financiamento adequado e um plano claro de expansão da educação infantil no Brasil, com qualidade e equidade. “Isso exige fortalecimento do regime de colaboração entre União, estados e municípios para fortalecer a capacidade de entender essa demanda”, afirma. 

Belo Horizonte

O estudo do Todos Pela Educação também mostra os dados relacionados às capitais brasileiras. Nesse cenário, São Paulo e Belo Horizonte têm o menor percentual de crianças de 0 a 3 anos com dificuldade de acesso a creches, com taxas de 2,5% e 4,2%, respectivamente. Atualmente, 61,5% dos meninos e meninas da capital mineira são atendidos, atrás apenas de Vitória (72,2%) e São Paulo (69,6%).

A reportagem entrou em contato com o Ministério da Educação e aguarda retorno.

Posicionamento

Em nota, a Secretaria de Estado de Educação de Minas Gerais (SEE/MG) destacou que, conforme o que determina a Constituição Federal, a gestão da educação infantil é de responsabilidade prioritária dos municípios. No entanto, destacou que a pasta mantém uma atuação cooperativa, que inclui repasse de recursos. Leia o posicionamento na íntegra abaixo.

A Secretaria de Estado de Educação de Minas Gerais (SEE/MG) informa que, de acordo com o que determina a Constituição Federal, a gestão da educação infantil é de responsabilidade prioritária dos municípios. No entanto, a atual gestão do Governo de Minas mantém uma atuação cooperativa com as administrações municipais, incluindo repasse de recursos, com o objetivo de fortalecer a rede pública de ensino e ampliar o acesso à educação de qualidade para crianças em todo o estado.

Em parceria com a Secretaria de Estado de Governo (Segov), a SEE/MG mantém o “Programa de Fortalecimento das Escolas Municipais”, que auxilia as cidades a melhorarem a infraestrutura das unidades de ensino dos municípios, fornecendo recursos por meio de convênios celebrados com as prefeituras. Desde 2021, o Governo de Minas repassou R$ 1,7 bilhão para 820 municípios mineiros por meio dessa iniciativa.

Já no “Projeto Mãos Dadas”, o Executivo destina investimentos significativos em infraestrutura e apoio pedagógico aos municípios. O objetivo é oferecer condições adequadas para que possam atender demandas de estudantes dos anos iniciais do ensino fundamental, conforme previsto na Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB).

Em todo o estado, o Mãos Dadas já destinou mais de R$ 1,2 bilhão à 163 municípios, beneficiando milhares de estudantes. Os resultados incluem a construção de 194 escolas e creches, 424 reformas e ampliações, a entrega de mobiliários e equipamentos a 345 escolas e a aquisição de 93 veículos para o transporte escolar. O projeto também prevê a cessão de imóveis e a adjunção de professores estaduais aos municípios.

Outra ação fundamental para promover o fortalecimento da educação infantil é a adesão do estado de Minas Gerais e 100% dos municípios mineiros ao Compromisso Nacional Criança Alfabetizada, realizada em Regime de Colaboração da SEE/MG com União Nacional dos Dirigentes Municipais de Educação de Minas Gerais (Undime). Esse compromisso envolve um pacto entre os entes federativos (municípios, estados, Distrito Federal e União) para garantir o direito à alfabetização, um elemento essencial para o sucesso das trajetórias escolares.

Com essas ações, o Governo de Minas reafirma seu compromisso com a valorização da educação básica e com o fortalecimento das redes municipais de ensino, especialmente na fase da alfabetização e nos primeiros anos da vida escolar.