Meio ambiente

BH cortou 7.326 árvores em 2023; número é o maior dos últimos 4 anos

Dados obtidos via LAI indicam que a capital cortou 24,1% mais árvores no ano passado do que em 2022; capital fez o plantio de 24.830 mudas em 2023

Por Rayllan Oliveira
Publicado em 10 de abril de 2024 | 06:00
 
 
 
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Belo Horizonte teve 7.326 árvores suprimidas em 2023 - um recorde nos últimos quatro anos. A média, conforme levantamento obtido pela reportagem via Lei de Acesso à Informação (LAI), foi de 20 árvores cortadas por dia no último ano, ou seja, uma a cada 1 hora e 20 minutos. A quantidade representa um aumento de 24,1% quando comparado ao número de árvores suprimidas em 2022, com 5.903. 

De acordo com o secretário municipal de obras e infraestrutura, Leandro César Pereira, o aumento no último ano ocorreu por causa da demanda reprimida no período de pandemia. "As equipes que fazem as vistorias estavam como toda a população, em casa (seguindo as medidas de isolamento). Ou seja, tivemos uma fiscalização menor, e isso reflete nos números", justificou. 

Segundo ele, o aumento era algo previsto, conforme a retomada das atividades após os anos pandêmicos. "A gente não tem uma meta de árvores que devem ser cortadas, nós seguimos aquilo que é demandado. Antes da pandemia, em 2018 e 2019, por exemplo, a média era de dez mil", acrescentou. 

Os dados disponibilizados via LAI revelam que a capital realizou a supressão de 10.503 árvores em 2019. O montante foi 3% maior que a quantidade cortada em 2018, com 10.122 unidades, e 243% superior que a quantia de 2017 (o triplo), com 3.057. 

Gráfico com a quantidade de árvores cortadas em Belo Horizonte nos últimos anos

"Foi um ano atípico (2017). Quando a gestão Kalil assumiu, encontrou a prefeitura com várias restrições no orçamento, inclusive para a manutenção dessas áreas verdes. Vários serviços foram comprometidos naquele ano. Esse crescimento na quantidade de cortes nos anos seguintes foi por causa da retomada dos nossos investimentos", argumentou. 

O secretário explica que a supressão das árvores segue a uma série de determinações técnicas. São consideradas, segundo ele, questões como o risco de queda, a vida útil de cada árvore, e o estado de saúde delas. "As decisões são sempre técnicas. Nós temos uma demanda enorme da população, mas não quer dizer que vamos cortar só porque a pessoa pediu. Tudo é feito de uma forma muito criteriosa, considerando esses fundamentos que são primordiais", afirmou. 

Questionada pela reportagem de O TEMPO sobre os motivos para a supressão das 7.326 árvores no ano passado, e quantas teriam sido cortadas por cada um deles, a prefeitura não se manifestou. 

População em alerta

O número de árvores cortadas é um motivo de preocupação para o médico César Pedrosa, de 50 anos, morador da rua Ouro Fino, no bairro Cruzeiro, na região Centro-Sul da capital. Em 2022, uma monguba - espécie de porte médio, de 6 a 14 metros de altura - foi retirada da via onde ele mora após ser atacada por um inseto conhecido como besouro metálico, o Euchroma gigante. As larvas desse inseto são capazes de perfurar a madeira e enfraquecem a base das árvores, que chegam a perder galhos ou cair por completo. 

"Neste caso foi fundamental. Só que a quantidade de árvores cortadas no ano passado foi muito alta, é um número muito significativo para uma cidade só", avaliou César Pedrosa. O médico considera que é fundamental o poder público monitorar as condições de cada árvore da cidade, evitando quedas e possíveis acidentes. 

 No entanto, segundo ele, com o número elevado de supressões e a falta de informações sobre os motivos dos cortes, a impressão é de uma possível "falta de compromisso" da prefeitura da capital com questões ambientais. "A gente não fica sabendo a razão dos cortes. Isso precisa ser explicado, ter alguma forma de tornar esses documentos públicos, e com fácil acesso", sugeriu. 

A preocupação é a mesma para o paisagista Antônio Lages Rodrigues, de 48 anos, morador do bairro Caiçara, na região Noroeste. Segundo ele, em 2021, a prefeitura estava com uma ordem de serviço para a supressão de uma árvore da espécie gameleira na praça José Américo. A solicitação, segundo ele, foi feita por uma moradora da região, que afirmou estar incomodada com as folhas que caíam da árvore. Ela teria pedido o corte da árvore para evitar que a sua calçada ficasse suja com as folhas. 

"Iria cortar uma árvore por um motivo banal. Uma poda ajudaria a resolver o problema dessa moradora", lembrou o paisagista. Segundo Antônio, na época, houve uma mobilização de vizinhos para impedir o corte. "Nos organizamos para não deixar que isso pudesse acontecer. Gravamos vídeos, divulgamos e muita gente se mobilizou. A prefeitura fez a poda, e a questão melhorou. Não é certo cortar árvores de 30, 40 anos, e no lugar colocar galhos, que muitas das vezes não são acompanhados e acabam sendo destruídos", relatou. 

Capital fez o plantio de 24.830 no ano passado

Plantio de árvores

A Deliberação Normativa 67, do Conselho Municipal de Meio Ambiente (COMAM) determina que para cada árvore com até três metros de altura suprimidas, outras duas mudas devem ser plantadas. No entanto, para o corte de árvores de mais de três metros, o plantio tem que variar entre quatro e 15 mudas.  

A Prefeitura de Belo Horizonte não informou o porte das árvores suprimidas no último ano, mas garantiu que a norma foi cumprida. Em 2023, segundo a prefeitura, 24.830 árvores foram plantadas na cidade. Os plantios foram feitos pela Secretaria Municipal de Meio Ambiente (20.310), a Fundação de Parques Municipais e Zoobotânica (2.410) e pela Superintendência de Zeladoria Urbana (2.110). "É uma intenção nossa manter a cidade mais arborizada. O estoque de árvores que a gente suprime é sempre muito inferior ao que é plantado", garantiu o secretário. 

Para o pesquisador Luciano Goulart, coordenador do projeto de Extensão Mata Urbana da escola de arquitetura da UFMG, a compensação da supressão quase sempre é um problema. "É feita com mudas com o sistema radicular mal desenvolvido (torrão danificado), o plantio é feito nos meses de abril, entre outros. Esse é um período seco, com a chegada do inverno. Esse contexto favorece a má formação delas, o que vai oferecer risco de queda dessas árvores quando elas estiverem adultas. O ideal é que essa compensação fosse feita no período chuvoso", alertou. 

Especialista alerta para a necessidade da instalação de áreas verdes na cidade

Condições climáticas e alternativas

O pesquisador entende que a quantidade de árvores cortadas nos últimos anos também pode ser consequência de um plantio mal feito ou planejado de forma errônea no passado. "Muitas das árvores que estão nas ruas precisam, de fato, ser cortadas. É melhor retirar do que deixar elas caírem", apontou.  No entanto, segundo Goulart, a capital precisa desenvolver programas voltados a questões ambientais, principalmente por causa das mudanças climáticas.

"É necessário construir áreas verdes para melhorar a permeabilidade do solo, principalmente com boa diversidade e árvores nativas", orientou. Ainda de acordo com o pesquisador, neste contexto de mudanças climáticas, é importante tentar recuperar a saúde de cada árvore adoecida. "Precisamos preservar cada árvores, e por isso é necessário um investimento em soluções novas".

A Prefeitura de Belo Horizonte afirma que desenvolve essas iniciativas, com base no que é previsto no atual Plano Diretor. O Executivo municipal garante que as áreas verdes foram ampliadas, e consequentemente a permeabilidade da cidade. "A PBH trabalha pela melhoria da qualidade ambiental dessas áreas sobretudo em regiões de conexão verde e conexões de fundo de vale com plantios, recuperação de nascentes, plantio de miniflorestas, agroflorestas e reforço da arborização urbana", destacou.

Conforme a prefeitura, quando uma árvore é vítima de alguma lesão, doença ou praga, a Secretaria de Meio Ambiente acompanha o caso para avaliar os riscos. O processo é feito com a aplicação de agrotóxicos e também com dendrocirurgia - eliminação de tecidos destruídos por fungos ou parasitas. 

"No entanto, há limitações de uso de produtos sintéticos em ambientes urbanos e baixa eficiência de mitigação de danos. Dessa forma, a manutenção da arborização prioriza a redução de qualquer risco à população, de acordo com critérios observados na DN 92 de 2019", finalizou.

 

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